A criminalização do funk e o efeito bumerangue contra o rock
Marcelo Moreira
Em meio à avalanche de lixos vomitados pelo presidente da República e por ministros, um tema que foi abordado superficialmente após as nove mortes no baile funk de Paraisópolis merece uma reflexão mais atenta: a criminalização das manifestações populares, que certamente vai esbarrar no rock.
Enquanto as pessoas ficam indignadas com as bobagens sobre a qualificação do educador Paulo Freire, sobre a demência de vomitar que universidades federais plantam maconha e de imagens de nazistas se vestindo de nazistas em bares de Minas Gerais, avançam tentativas sorrateiras de intimidar manifestações culturais de "oposição" e de "esquerda".
Parte da imprensa e dos críticos de redes sociais preferiram atacar o baile funk em si, em Paraisópolis, em vez da ação criminosa da Polícia Militar, que deliberadamente atacou o jovens.
O governo estadual e a PM seguiram por esse caminho no princípio, com elogios aos policiais que atuaram lá. diante da repercussão negativa, o governador recuou, mas logo voltou à mesma linha de raciocínio ao parabenizar a ação, que considerou correta. Em seguida, autoridades estaduais atacaram a realização de tais eventos.
A criminalização e a intimidação dos participantes dos pancadões é o primeiro passo para acuar a juventude da periferia e os movimentos sociais que promovem esse tipo de evento, principalmente de rap e funk.
Como toda periferia de cidades grandes e médias brasileiras, Paraisópolis é uma comunidade esquecida pela elite e pelos políticos que são servis à elite.
O Estado não existe e não aparece, o que explica, em parte, o amplo domínio do tráfico de drogas e das milícias criminosas em favelas do Rio de Janeiro e da Grande Vitória, por exemplo.
Há diferenças gritantes entre os pancadões cariocas e paulistanos. Se no Rio o crime organizado autoriza e organiza tais reuniões e festas, na periferia a imensa maioria teve surgimento espontâneo e com apoio da comunidade.
O crime organizado, até por um questão de estratégia, prefere ficar na marginalidade de tais eventos, sem chamar a atenção para poder atuar e vender, até porque os pancadões paulistas são mais visados pela Polícia Militar, que tem mais liberdade de ação – o que explica o ataque absurdo em Paraisópolis. No Rio ataque semelhante seria altamente improvável.
Diante da falta de regras e do exagero no som alto, os bailes funk da periferia acabaram pagando por todo o preconceiro contra a cultura negra, da periferia e dos pobres.
Os exageros, evidenemente, precisam ser coibidos, até para a preservação dos próprios eventos. Não são poucos os políticos ultraconservadores de viés religioso que pretendem "regulamentar", em lei, tais bailes e pancadões. Regulamentar, aqui, trata-se de um infame eufemismo para proibição, restrições e enquadramentos.
Todas as teorizações a respeito da falta de opção de lzer para uma parcela da população jovem da periferia estão corretas. Com crise econômica, falta de empregos, de dinheiro, de oportunidades e de lazer, as comunidades da periferia, com sua maioria de população negra e migrantes de outros locais ainda mais pobres, torna-se celeiro para todo tipo de abuso, corrupção, violência e apelo aop crime organizado.
Só gente esdruxula e estúpida rejeita tal explicação e ignora que a desigualdade econômica crescente provoca grave tensão social. Só esse tipo de gente ignorante e mau caráter acredita que o autoritarismo e a repressão vai conter tamanho descontentamento e raiva. Se não bastasse tudo isso, a elite político-econômico-social ainda se "incomoda" com as festas que são realizadas bem longe, na própria periferia.
Quando os governos e suas elites que os sustentam bradam contra os bailes funk alegando que são suportes da criminalidade explicitam o seu fracasso. Expõem claramente que não conseguem "controlar" essas comunidades e esses eventos.
Não conseguem contê-los e são incapazes de coibir "práticas novcivas e imorais". Não conseguem impor seus padrões de comportamento e de (falta de) educação. Não conseguem impor o seu padrão moral e seus costumes e restringir a movimentação desse "povo".
Não basta apenas confiná-lo em suas localidades, bem longe dos shoppings mais caros e mais elitizados. Não basta apenas oferecer algumas poderes migalhas de eventos culturais descolados das realidades das comunidades. É preciso atacar as manifestações originais e legítimas para mostrar quem é que manda – ou supostamente manda.
Atacar e criminalizar movimentos de funk e rap com o argumento de perturbação da ordem pública é uma covardia imensa das autoridades estaduais, das polícias e dos fiscais municipais que supostamente zelam pelo "bem-estar" das população. Mais do que uma manifestação de preconceito total, é um aviso claro de que o retrocesso, o autoritarismo e a cnsura estao chegando para ficar.
E o rock na mira, como cansamos de mostrar aqui durante este ano de 2019, seja no cancelmento do Facada Fest em Belém (PA) ou na prisão arbitrária de um cantor punk por conta de um adesivo "Fora, Bolsonaro".
Por medo ou por burrice (ou ambos), organizadores de eventos e policiais militares estão depredando a Constituição ao exigir a retirada de faixas de protesto ou teor político de eventos esportivos.
Isso ocorreu no Rio de Janeiro, em um jogo do Botafogo, no Engenhão, quando uma faixa da torcida Botafoguenses Antifascistas foi arrancada por PMs, em flagrante desrespeito à liberdade de expressão.
O mesmo ocorreu recentemente em um campeonato paralímpico de tênis de mesa, em São Palo, quando o coletivo Raquetadas Antifascistas tebe uma bandeira arbitrariamente recolhida por conta da reclamação de UMA bolsonarista imbecil, que se sentiu "incomodada". Ou seja, o dejeton humano assumiu que é fascista e que fascistas têm apreço pelo governo de Jair Bolsonaro.
São tempos difíceis e extremos, em que qualquer manoifestação de resistência é bem-vinda e precisa ser amplificada e disseminada. O rock também é alvo e será uma vítima como estão sendo o funk e o rap nas periferias.
A criminalização não poupará metaleiros, punks ou simplesmenteb amantes do rock que pensem diferente, que valorizem a libderdade de expressão e opinião e que critiquem toda e qualqwuer forma autortitarismo, fascismo e censura.
Se o funk incomoda por causa do barulho alto e da algazarra, que então sejam denunciados os excessos e o crime que envolve lateralmente os eventos – e isso ocorre em Paraisópolis e no entrono de faculdades particulares em bairros nobres, como Mackenzie (Higienópolis), Fiam (Morumbi) e muitas na região do ABCD.
Criticar o funk como forma nefasta de evento cultural e de entrenimento não ajuda em nada o debate. Só favorece o discurso ultraconservador de censura e repressão que, fatalmente, se voltará contra os roqueiros em algum momento – se ér que isso já não acontece de fato e com frequência.
Sobre os Autores
Sobre o Blog
Contato: contato@combaterock.com.br
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.