Censura no rock nacional: polícia impede festival punk em Belém
Marcerlo Moreira
Três fatos aparenmtemehte sem nenhuma conexão, mas que estão conectados de tal forma que explicam bem o período desagradável e de trevas em que estamos mergulhados:
1 – O presidente da República abre a boca para falar mais uma bobagem, agora sobre a questão do trabalho infantil e de como ele apoia, "não vendo nada de errado nisso, até porque eu mesmo [mentira] trabalhei quanto tinha dez anos". Em seguida, uma legião de imbecis que o apoia vomita lixo comparando "fazer docinhos para o negócio da família quando tinha 12 anos de idade" com o serviço que crianças de oito anos fazem no corte de cana e nas carvoarias – para não falar no trabalho escravo nas fazendas gigantescaso do agronegócio brasileiro, nas quais os proprietários muitas vezes são deputados federais e senadores.
2 – Internacional abre as portas do ginásio Gigantinho para abrigar moradores de rua contra o frio. A ação motivou a união de torcedores de Grêmio e Internacional para buscar agasalhos e resgatar pessoas em situação de rua em Porto Alegre. E não é que teve gente criticando o que chamaram de "suposto assistencialismo" – incluindo três jornalistas de São Paulo (ou supostos jornalistas). Curiosamente, todos os dejetos humanos que criticaram fizeram em algum momento propaganda de Bolsonaro, são religiosos e apoiaram as medidas da Prefeitura de São Paulo, na gestão João Doria Jr (PSDB), entre elas tomar os cobertores de pessoas em situação de rua nos anos de 2017 e 2018.
3 – A Polícia Civil de Belém (PA) impediu a realização do Facada Fest III, no mercado São Brás. Sem explicação aos organizadores e músicos do evento, dedicado ao hardcore e ao punk rock, os policiais e "agentes da lei" ocuparam o espaço e, segundo espectadores, ameaçaram e intimidaram quem se arriscou a confrontar as "autoridades". Segundo um músico, que não quis se identificar, o evento foi cancelado porque as "autoridades" receberam denúncias de que haveria críticas e movimentos contra o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Justiça, Sergio Moro. Ou seja, teria havido pura e simples censura estatal – lembrando que o governo paraense é do PSDB.
Os três fatos se interligam porque representam a escalada fascista na vida brasileira e em todos os níveis da sociedade. A democracia está em vertigem, como bem retratou o documentário que mostra o impeachment de Dilma Rousseff (PT), ocorrido em 2016.
Parte expressiva da sociedade despreza os pobres, o assistencialismo obrigatório dos governos, a manutenção de políticas de direitos humanos e a própria democracia.
Os mesmos "cidadãos de bem" que apoiam o conservadorismo e as políticas fascistas são os primeiros a defender ações e medidas que erodem a democracia e os crimes cometidos contra as minorias – para não falar do completo desprezo de políticas de preservação do meio ambiente. É gente que trata sem-teto como lixo e que brada a favor da morte sumária de bandidos, da censura e da intervenção militar autoritária e totalitária.
No que nos diz respeito, em relação à musica e à cultura, a censura é só mais um caso horrendo e horripilante de atentado à liberdade de expressão, opinião e de imprensa semelhante a casos que ocorreram em São Paulo e em Brasília neste ano.
O modo de operação das "autoridades" é o mesmo: na iminência da realização do evento de rock, a polícia e os "agentes de fiscalização" aparecem alegando alguma irregularidade estapafúrdia – quando se dão ao trabalho de falar algum coisa – e arbitrariamente cancelam o evento.
Os roqueiros de Belém não aceitaram a intervenção policial e houe protesto com o bloqueio de uma avenida importante do bairro.
A Secretaria de Segurança do Pará, a Polívcia Militar e a Polícia Civil daquele estado não responderam às solicitações de explicações feitas por e-mail pelo Combate Rock.
De acordo com reportagem realizada pelo site Diário Online, a Polícia Civil informou que o estabelecimento onde aconteceria o evento está com as atividades suspensas por falta de licença da Semma (Secretaria Municipal de Meio Ambiente), falta de credenciamento dos Bombeiros e falta de alvará da Divisão de Polícia Administrativa, tendo inclusive sido penalizado anteriormente em dois salários mínimos.
A polícia informou ainda que os organizadores não comunicaram as autoridades sobre a realização do evento, e que pelos motivos apresentados, e não por censura, optou por não permitir o Facada Fest.
No oficio que está publicado nesta reportagem, há solicitação de informações à Polícia Militar paraense a respeito do festival e "avaliação sobre questão".
O ofício é datado de 3 de julho, mas com um carimbo de protocolo do dia anterior. Não há menção a qualquer lei que impediria o evento e nem determinação para o cancelamento.
No texto, fica mais do que evidente que a motivação para a "averiguação" e posterior cancelamento/impedimento teve motivações políticas, em flagrante colisão com os preceitos constitucionais.
O ofício tem como anexos "cópias" de declarações do deputado federal paraense Éder Mauro e do vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente da República. Será que restam dúvidas sobre as motivações?
E aí chegamos à infame constatação que corrobora o modo de operação nestes casos, especialmente em relação ao rock: se estava tudo irregular, como alegam as "autoridades", por que foi somente horas antes de começar o festival que houve a ordem de cancelamento?
Por que a "constatação" de que havia irrigularidades non local que receberia o evento só foi "constatada" pouco antes do início do evento? Não houve tempo para que houvesse a checagem dos documentos com uma semana de antecedência? Três dias de antecedência? Um dia? Ou será que a ação policial imediatamenter antes do show foi premeditada e deliberada? Seria mera "coincidência" que o modo de operação das polícias de São Paulo e Belém seja quase idêntico?
Diante das explicações pouco convincentes das autoridades registradas no texto do Diário Online, fica difícil afastar a hipótese de censura como motivação para o cancelamento do evento.
E não dá para achar que foi mera coincidência o fato de que o cartaz do evento, divulgado semanas antes, ter sido atacado violentamente nas redes sociais por partidários de Bolsonaro, de agremiações conservadoras e de extrema-direita.
O autor é o ilustrador paraense Paulo Victor Magno, que desenhou um palhaço com uma faixa presidencial, que morre empalado por um lápis.
Como o cartaz se espalhou rapidamente pela internet, os protestos dos conservadores foram ruidosos, Políticos locais que apoiam Bolsonaro criticaram o festival, ameaçando e intimidando os organizadores afirmando que colocariam a polícia para "monitorar" o evento.
Músicos e organizadores passaram a ser ameaçados de forma velada nas vésperas do festival, segundo pessoas ouvidas pelo Combate Rock.
Há alguma dúvida de que houve instigação e interferência de "autoridades" paraenses no cancelamento do Facada Fest III? O eufemismo "problemas com o alvará" pode ser coaracterizado como censura oficial a um evento de crítica aum presidente da República? É coincidência o fato de que a constatação de que o alvará tinha "problemas" tenha ocorrido pouco tempo antes do evento?
O que aconteceu em Belém foi vergonhoso e nefasto, com flagrantes violações constitucionais e atentados violentos à liberdade de expressão e opinião, caracterizando censura estatal – e ilegal.
A seguir, publicamos na íntegra a nota oficial sobre os incidentes em Belém divulgada pelos organizadores do Facada Fest III:
O Facada Fest III teve o nome de evento no cartaz e o seu local de programação modificados em virtude de dois fatores: perseguição política e censura. Nós poderíamos perfeitamente entrar em maiores detalhes acerca de todos os ocorridos, em especial dos fatos das últimas 24 horas, mas faremos tudo de maneira breve e direta.
Conforme o documento anexado nesta postagem, onde todos e todas podem ter a explícita constatação de tudo o que ocorreu, a programação foi impedida de acontecer no Mercado de São Brás pela Polícia Militar por meio de documento enviado para a Polícia Civil, requerendo o indeferimento do evento.
Não houve a citação de uma única lei que amparasse o pedido. O documento NÃO foi respaldado em nenhum artigo da Constituição Brasileira, nem nada do gênero. Tudo o que ocorreu foi um ordenamento de cunho PESSOAL dos envolvidos, uma ordem sem NENHUMA imparcialidade, tudo baseado em "argumentos" totalmente rasos e vagos, tal como "eu vi isso nas redes sociais do filho do presidente".
Foi com base em um mero ofício, que sequer tem caráter proibitivo, que a delegada de Polícia Civil se recusou a nos fornecer autorização para a realização do evento em São Brás, perante alguns dos organizadores, dizendo que eles (policiais) iriam coibir toda e qualquer programação no local, ameaçando a permanência dos trabalhadores comerciantes, além de frases de coação à equipe presente, bandas e público.
Além disso, houve inteira recusa deles em devolver as documentações entregues. Também houve recusa verbal à disponibilização de policiamento preventivo, necessário para garantir a integridade física aos participantes do evento, verdadeiro ultraje ao direito de reunião, livre expressão de pensamento e manifestação assegurados a qualquer pessoa, assim como negaram a emissão de documentação por escrito a respeito.
Tratamos o ocorrido da devida forma em que tudo precisa ser definido: o nome disso é CENSURA! Este é um nítido exemplo de cerceamento de direitos, de liberdade de expressão artística e/ou de quaisquer outras maneiras.
A polícia não tem competência para proibir nada, violando o princípio da legalidade administrativa, pelo qual "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei", violando também os direitos de livre manifestação e reunião expressos na CF/88.
Desta forma, por conta de todo o cenário de explícita coação aos envolvidos, bandas, públicos, trabalhadores e comerciantes, alteramos o nome do evento no cartaz e o local de programação para que tenhamos a necessária segurança humana e física de todos os envolvidos, como as bandas, organização, público e demais presentes.
Continuaremos atuando no respaldo LEGAL que nos ampara, não agiremos na mesma moeda de quem usa os seus posicionamentos PESSOAIS para impedir a liberdade alheia.
Nós não desistimos de continuar fazendo programações em praças, pois os espaços públicos necessitam ser devidamente ocupados e utilizados pela população. Em breve, os eventos voltam à normalidade habitual.
Atenciosamente,
Equipe FACADA FEST.
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