Uma carta a um pai, e André Matos muda a vida de um garoto
Marcelo Moreira
Um garoto louco por uma banda de rock nova. Um astro em ascensão em um grupo que sobe como um foguete. Um pai apreensivo e durão. Uma carta inesperada, inusitada, emotiva e endossada por muita gente. E eis que uma história singela mostra toda a grandeza de um músico que tem uma relação diferente e próxima dos fãs.
E foi assim que o fotógrafo Christian Nastari (conhecido como Chibbas entre os amigos) se tornou amigo de um dos artistas mais importantes do rock brasileiro e internacional.
Com pouco mais de 15 de anos de idade, Nastari tentou de todas as formas conseguir autorização do pai e ingresso para assistir a um show do Angra nos anos 90, então uma das sensações do metal brasileiro e, em pouco tempo, seria um grupo com fama mundial.
E então inusitado acontece: André Matos, o vocalista, fica sabendo da epopeia do fã e entra no circuito. Conhece o garoto e simplesmente escreve, a mão, uma carta ao pai de Nastari solicitando que deixe o menino ver o show de seus ídolos – texto que foi revisado por outros membros do grupo.

André Matos (esq.) escreve a carta enviada ao pai de Christian Nastari (Christian é o que está no centro) com Luís Mariutti, na época o baixista do Angra, ao fundo. À direita, o amigo Renato, dono do caderno (FOTO: ARQUIVO PESSOAL)
Que artista importante, mesmo que ainda em ascensão, faria algo parecido? A carta foi entregue com pompa e circunstância, mas não conseguiu dobrar o senhor Nastari – Christian não conseguiu a autorização, mas ganhou uma história e tanto e um grande amigo para a vida inteira.
"Algumas vezes, ao longo desses 25 anos, André Matos lembrava da carta que escreveu para mim quando nos encontrávamos, e ria quando as pessoas não entendiam o porquê de eu nunca pedir autógrafo dele. 'Ele já tem, e de uma forma muito especial', dizia André piscando para mim", conta o fotógrafo.
Matos, ex-vocalista do Angra e do Shaman, morreu no sábado, dia 8 de junho, aos 47 anos, em consequência de um ataque cardíaco. Sua morte causou comoção mundial, com celebridades do rock do Brasil e do exterior lamentando o ocorrido.
Nastari tem lembranças muito vivas daquele dia. "Era um sábado e um amigo me ligou dizendo que uma garota conhecida tinha descoberto onde o Angra estaria dando autógrafos em uma promoção de uma rádio. Era um sonho que se materializava."
Depois de perturbar a mãe para levar eles e os amigos até o local, na praça Panamericana, na zona oeste de São Paulo, a irmã de Nastari deu a carona decisiva para o grupinho de garotos.
"Era um posto de gasolina e chegamos primeiro. Era tipo uma promoção-relâmpago, daquelas que o locutor avisa na hora que a banda está em tal lugar dando autógrafos. Como descobrimos com antecedência, chegamos antes da banda. E tivemos uma tarde bem legal e toda a atenção dos cinco integrantes. Quando o André descobriu que todos da turma tinham ingressos, menos eu, ele teve a ideia de escrever a carta a mão, no caderno do meu amigo Renato. E foram vários minutos de discussão da banda sobre como deveria ser a carta a meu pai. Foi surreal", recordou Nastari.
José Carlos Nastari, o pai, reconheceu o esforço, mas não cedeu. A "vingança" de Christian era quase que previsível: o rock entrou na vida do garoto de forma definitiva a ponto de ser uma atividade profissional.
Aquele show do Angra não rolou para ele, mas muitos outros vieram, assim como várias conversas com o ídolo em outras oportunidades.
Ao longo dos dois dias seguintes ao do anúncio da morte de André Matos, choveram relatos de fãs, músicos e amigos a respeito de boas histórias de generosidade e atenção que o vocalista dispensava a todos que o procuravam.
Tiago Claro, músico e promotor de shows de Santo André, no ABC paulista, por exemplo, recordou do evento em que esteve com Matos uma semana antes da morte do artista, em Joinville (SC).
Exausto e de madrugada, Claro sabia para o quarto do hotel após uma maratona de shows quando foi alcançado por André Matos, uma das atrações do evento. Tinham tido pouco contato durante o trabalho e se falaram pouco, mas o cantor fez questão de abraçá-lo para parabenizar por mais uma etapa bem-sucedida.
Mais do que o sentimento de perda de um artista importante, fica o vazio em relação ao músico que fazia questão de mostrar gratidão a amigos e fãs, a ponto de escrever uma carta pedindo autorização para que um menino pudesse assistir ao Angra ao vivo. Isso não tem preço.
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