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Solidariedade e paz em 2019 em belas mensagens do futebol e da música

Combate Rock

01/01/2019 06h35

Marcelo Moreira

A nostalgia bateu forte no último Natal na Inglaterra. Tentando resgatar as boas vibrações de um período do ano em que as pessoas ficam mais generosas e abertas à solidariedade, a FA, a federação inglesa de futebol, junto coma Premier League, que organiza o Campeonato Inglês, fizeram duas iniciativas bacanas para mostrar que o esporte, antes de tudo, é disseminador de respeito e amizade.

Em vídeos promocionais, promoveu encontros de surpresa entre torcedores de times rivais e astros de futebol, mostrando que a convivência entre os diferentes é necessária e sadia. O mais interessante foi o protagonizado por dois jogadores do Liverpool indo visitar uma escola e encontrando crianças torcedoras do rival Everton.

Também foi resgatado um vídeo em que o futebol é o protagonista, relembrando a trégua de Natal nos campos de batalha da França em 1914, durante a I Guerra Mundial.

Para comemorar a data, soldados inimigos – alemães de um lado, ingleses, escoceses e franceses do outro, torcaram presentes, cumprimentos e jogaram bola, explicitando a estupidez da guerra. Bastante inspirador para que desejemos um 2019 mais ameno e meno conflituoso.

E, com isso, as comemorações pelos 100 anos do fim do conflito foram esticadas também com a reedição de músicas que foram compostas recentemente para marcar a data.

11 de novembro é o dia em que a Alemanha imperial assinou a rendição incondicional em um vagão de trem na cidade francesa de Sévres. A data passou a simbolizar para os britânicos como o fim da maior das tragédias, e o mês todo é tomado por celebrações pelo fim do conflito e homenagem aos mais de 500 mil mortos britânicos.

Duas músicas são as mais emblemáticas. O mago da guitarra Jeff Beck e a diva do soul Joss Stone gravaram a bela "No Man's Land – Green Fields of France", triste balada folk do compositor escocês Eric Bogle e lançada originalmente em 1976. Já a banda de rock progressivo Magnum relançou com novos arranjos a música "On a Christmas Day".

"No Man's Land" foi o tema oficial do chamado Poppy Appeal, como é conhecida a celebração de novembro, em 2014 e voltou em algumas celebrações no ano passado.

O tema é uma reflexão sobre o túmulo de um jovem (Willie McBride), que morreu durante a 1ª sendo que seu refrão faz menção a outras duas peças famosas de música militar britânica, "The Last Post" e "The Flowers of the Forest".

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"A música é sobre um soldado, Willie McBride, mas quando comecei a olhar para quem era Willie, encontramos nada menos que três homens que poderiam ter sido – então percebemos que encontrá-lo não era realmente tão importante quanto o que ele e essa música representa – paz e do sacrifício feito por tantas pessoas", disse a cantora ao site da revista Rolling Stone em 2014.

 

Futebol e confraternização no Natal

No rock progressivo/classic rock, a veterana banda Magnum, ícone do subgênero nos anos 70, regravou um de seus clássicos dos anos 90, "On a Christmas Day", lançado originalmente no álbum "Rock Art".

Composta e produzida pelo guitarrista Tony Clarkin – autor de todas as músicas e produtor do álbum "Rock Art" – tem como tema uma das lendas mais fascinantes da história das guerras da humanidade – e que também foi narrada por Paul McCartney na música "Pipes of Peace", do álbum de mesmo nome, de 1983.

A principal de todas as lendas diz que a 1ª Guerra Mundial havia chegado a um impasse em dezembro de 1914, com a estabilização da frente de batalha cerca de 100 quilômetros a nordeste de Paris – impasse que praticamente duraria toda a guerra.

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Com pouca variação de avanço dos lados, a frente de batalha teve 800 quilômetros de extensão, indo do litoral do Mar do Norte, na fronteira entre França e Bélgica, até a fronteira entre a França e a Suíça.

No dia de Natal, 24 de dezembro de 1914, em um vilarejo perto de Sedan (norte da França, mas os historiadores nunca conseguiram precisar onde ocorreu), subitamente os canhões e os fuzis silenciaram à tarde, sem que ninguém houvesse proposto a trégua.

Por volta de 20h, um soldado alemão, cantor lírico da cidade de Dortmund, subitamente quebrou o silêncio em sua trincheira ao entoar em seu idioma a canção "Silent Night" ("Noite Feliz", em português). Trinta segundos depois, pelo menos dez soldados franceses, 150 metros à frente, na trincheira frontal, acompanharam em coro.

Capa do DVD francês do filme

Capa do DVD francês do filme "Feliz Natal" ("Joyeux Noel")

Foi a deixa para que, em outra parte da trincheira aliada, os escoceses entrassem na celebração. A canção foi repetida duas vezes antes que que meia dúzia de alemães, empunhando uma bandeira branca, deixasse suas trincheiras para oferecer pedaços de carne de porco aos franceses, debaixo de neve e de um frio abaixo de zero.

Sem que ninguém soubesse precisar como e quando, logo foi montada uma enorme mesa com vinho, uísque e schnapps (destilado alemão) no centro do campo de batalha, sem dar bola para a política e as ordens militares. A bebedeira foi geral.

Na manhã seguinte, mais de 5 mil soldados das três nacionalidades se reuniram em frente à igreja local em uma missa rezada em latim que durou duas horas e meia, regada a cantorias religiosas.

A questão se tornou um grave incidente militar dos dois lados: a guerra havia acabado? Seria possível encerrar ali o conflito, diante da camaradagem e da alegria demonstrada em dois jogos de futebol no meio do campo devastado de batalha?

Os relatos mais consistentes dizem que os escoceses venceram os alemães por 2 a 0, enquanto que no jogo seguinte os alemães arrancaram um empate de 1 a 1 com os franceses.

Curiosamente, a fúria nos três comandos militares foi da mesma intensidade, com ameaças de corte marcial, pena de morte e bombardeio dos locais onde estava havendo a "confraternização". A insensibilidade e a insensatez prevaleceu, com a guerra provocando a morte de quase 20 milhões de pessoas nos quatro anos seguintes.

Um grande filme

Toda essa movimentação foi retratada no extraordinário filme de 2005, "Joyeux Nöel (que recebeu o título de "Feliz Natal" em português), uma produção franco-alemã dirigida pelo francês Christian Carion e estrelado pela ótima atriz alemã Diane Kruger (também atriz de destaque em "Bastardos Inglórios", de Quentin Tarantino).

Hoje os historiadores concordam que os principais relatos são fragmentos de histórias semelhantes ocorridas ao longo da linha de frente. Nos últimos 20 anos surgiram muitos indícios de que a "confraternização" entre os soldados naquele dia 24 de dezembro, na verdade, foram pelo menos dez reuniões, em locais distintos, a partir do início da noite.

Comprovadamente, há relatos sólidos de que houve várias partidas de futebol entre os inimigos em pelo menos oito pontos somente nas imediações da fonteira entre França e Bélgica.

O filme "Feliz Natal" e as músicas de Magnum e Joss Stone/Jeff Beck são sempre inspiradores e, queiram ou não, justificam reflexões a respeito de qualquer conflito. Que continuem sendo inspiradores.

Veja os vídeos e escute as canções "No Man's Land", com Joss Stone e a original de Eric Bogle, "On a Christmas Day", do Magnum, em sua versão de 1994, e de "Pipes of Peace", de Paul McCartney.

Sugiro também, a quem se interessar, outras canções pacifistas que considero interessantes, e que estarão logo abaixo: "After the War", cantada pela cantora canadense Sarah Slean, e que faz parte da trilha sonora do filme também canadense "Passchendaele", ambientado na localidade belga onde se travou uma das mais ferozes batalhas da 1ª Guerra, em 1917. O filme foi escrito, dirigido e estrelado por Paul Gross, que também compôs a música e a trilha sonora inteira.

A outra canção é "Home Again", do Queensryche, banda norte-americana de metal progressivo, que está no álbum "American Soldier", de 2009, que narra um diálogo fictício entre um soldado e sua filha, quando o homem está no meio da guerra e vê uma foto da menina.

Esqueça a patriotada da Guerra do Iraque – a música é tocante porque mostra o ponto de vista do soldado solitário e isolado, com a participação da filha do vocalista Geoff Tate, Emily, cantando as partes femininas, à época com 11 anos.

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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