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Titãs atinge raro equilíbrio entre real e distopia em '12 Flores Amarelas'

Combate Rock

22/10/2018 07h00

Marcelo Moreira

Com calma e tranquilidade, e sempre andando com fé, e fé no trabalho, na banda e em si mesmo. Foi neste astral que Branco Mello, um dos titãs originais, está encarando aquele que pode ser descrito como o mais ambicioso projeto de sua banda em muito tempo – ou desde sempre.

"Doze Flores Amarelas" é uma ópera-rock que reúne os principais elementos que o subgênero oferece. Está sendo trabalhada há um ano nos palcos e chega agora ao CD, DVD e, em breve, no vinil triplo.

Difícil saber quem é o músico da banda que está mais entusiasmado com o projeto. Só que Branco Mello encara a missão de divulgar o empreendimento da banda como uma parte integrantes do espetáculo. "Foram três anos de trabalho intenso envolvendo muita gente e muita contribuição. E o mais legal é que o trabalho não para."

Em descontraída conversa com o Combate Rock, Mello faz questão de exaltar o trabalho coletivo para que o resultado final agradasse a todos e tivesse boa receptividade.

Titãs e parte do elenco de '12 Flores Amarelas' (FOTO: DIVULGAÇÃO)

"Ópera-rock não é uma coisa comum no Brasil, por mais que os grandes musicais tenham tido sua época. Quisemos mostrar uma nova cara do nosso trabalho, algo diferente, que pudesse agregar valor para os fãs mais antigos e atrair os mais jovens. E, para mim, deu muito certo", diz Mello.

A ópera-rock é subgênero perigoso, escorregadio e costuma ser incompreendido, ainda mais um país onde os musicais não estão mais na moda, e a ópera-rock nunca foi muito apreciada.

"Doze Flores Amarelas" não só é uma ópera-rock como também virou instantaneamente um musical ao estilo Broadway. E ficou bem legal, com um roteiro azeitado que incorpora a modernidade da vida atual com elementos da música e do cotidiano do Brasil

Abordando questões atuais e emergenciais como assédio, abuso, violência contra a mulher, aborto e tecnologia tóxica do mundo digital, a produção, que fez sua pré-estreia durante o Festival de Teatro de Curitiba.

"Tudo para nós era uma novidade, desde o processo de composição das músicas, após as reuniões de criação com os roteiristas e colaboradores, até os ensaios com dançarinos e com as cantoras que fazem os personagens e os atores que participam da montagem. É indescritível como foi importante participar de todo esse processo", afirma empolgado.

O trabalho é uma parceria entre os Titãs, o ator, dramaturgo e diretor do grupo de teatro Parlapatões Hugo Possolo, e o escritor, dramaturgo e jornalista Marcelo Rubens Paiva, hoje colunista de O Estado de S. Paulo.

No espetáculo de palco, Rita Lee faz a narração da maioria das cenas, enquanto as 25 canções inéditas, escritas especialmente para o espetáculo, contam a história de três jovens estudantes, Marias, A, B, e C, vividas por Corina Sabbas, Cyntia Mendes e Yas Werneck, que assim como a maioria dos colegas de sua idade, são adeptas da tecnologia, em especial de um aplicativo chamado "Facilitador".

Esse mecanismo acaba por colocá-las em risco durante uma festa, ao serem violentadas por cinco colegas. Elas então recorrem ao mesmo aplicativo em busca de vingança e conhecem o feitiço das 12 flores amarelas, que dá nome ao espetáculo e desencadeia uma série de acontecimentos entre todos os envolvidos.

Não é um tema original e nem o formato é algo que inédito nos palcos brasileiros. Ainda assim, é um sopro de criatividade em um mercado bastante engessado e sem movimento.

O texto de apresentação de "Doze Flores Amarelas" toca em ponto importante a respeito da conexão entre os 36 anos de carreira do grupo e o atual momento em que o agora quinteto vive: os Titãs sempre funcionaram com dois ingredientes bem estabelecidos, movimento e força.

Entretanto, agora a dinâmica pede uma narrativa diferenciada, arranjos que contemplam as três Marias protagonistas do espetáculo, a movimentação em cena, a sutileza das respirações musicais em peças de piano, interlúdios e o texto em letras musicais que configure storytelling teatral.

"Realmente, isso é fundamental para que o espetáculo funcione de maneira orgânica e integrada. Houve uma coesão grande entre todas as partes envolvidas. E ainda experimenta  novos elementos, apontando para o futuro. Como artista e autor, fico extasiado quando vejo que o resultado final foi muito positivo", comemora Mello.

Críticos musicais e teatrais destacaram negativamente a pobreza do texto, muito pueril e que, de certa forma, foge de uma certa complexidade. Ok, até podemos aceitar que alguns exageros tenham ocorrido, mas não é para tanto.

Também muitos apontaram o dedo para o que consideraram mera repetição de uma fórmula consagrada há 45 anos, pelo menos, desde "Tommy", da banda inglesa The Who, lançado oficialmente em 1969, estreou nos palcos de Londres como um musical, em 1972 – viraria filme em 1975 dirigido por Ken Russell.

Branco Mello se incomoda com isso? "Claro que não, embora imaginasse que as pessoas fariam a conexão com 'Tommy', com 'The Wall' (Pink Floyd) e 'American Idiot' (Green Day). A questão é que não foi um disco conceitual que se tornou peça teatral ou musical, mas um impulso criativo que gerou tudo isso."

Na opinião dele, foi por isso que o espetáculo "Doze Flores Amarelas" incorporou projeções em vídeo e fez com que a encenação crie um ambiente de integração com atores e músicos no palco.

O espetáculo foi criado na medida para ser um show atual para um público mais atual, ou seja, espectadores mais jovens e sem tanta conexão com os cinquentões que ainda anseiam por um novo CD como "Cabeça Dinossauro" ou pérolas pop como "Televisão".

Os Titãs não cometeram uma obra-prima, mas acertaram no novo projeto. O musical é bem feito e certamente atingiu o alvo. O conteúdo lírico é pobre e abaixo da média da própria banda?

Não é, mas, ainda que fosse, não invalida a audácia de uma banda que ainda respira rock e que busca inovar. Isso não é pouco.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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