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O cinema encontra o rock em um catálogo interessante

Combate Rock

07/10/2018 07h00

Marcelo Moreira

popcorn

Reapareceu nas livrarias neste mês um livro bem interessante relacionando o cinema e o rock. Ainda não sei se é uma reedição, já que o original foi publicado em português pela primeira vez no Brasil em 2012, mas é altamente recomendável.

É um catálogo interessante, mas esqueça as análises e as piadas. Assim pode ser descrito "Popcorn – O Almanaque dos Filmes de Rock", do jornalista inglês Garry Mulholland.

É uma obra que parte de uma boa ideia, mas que não entrega o que promete, seja por preconceitos diversos, seja por piadas sem a menor graça destiladas por alguém que militou nos tempos do punk rock e que acha que este gênero é o mais legal do mundo – e que o resto é resto. Ainda assim, é um trabalho recomendável por ser curioso.

Demorei bastante para ler este livro, lançado pela editora Seoman no Brasil. Havia uma expectativa grande em relação a ele, até porque um dos prefácios é escrito pelo radialista e cantor Kid Vinil, uma das pessoas que mais entende e tem informação sobre rock no Brasil – e música em geral.

O outro prefácio também é de uma pessoa importante no meio do entretenimento, Rubens Ewald Filho, ainda hoje um dos principais críticos de cinema do Brasil.

Como catálogo é interessante, pois Mulholland lista alguns filmes bacanas e outros desconhecidos, oferece informações pertinentes sobre cada fita, mas se perde nos comentários jocosos.

Não perdoa artistas ou diretores que nitidamente não o agradam, e não faz concessões ao classic rock ou a alguns grandes nomes do gênero – considera, por exemplo, "The Wall", de Alan Parker e Pink Floyd, como o pior filme de rock de todos os tempos.

O melhor, um filmeco desconhecido da Inglaterra, no ano de 1967, "Privilege" (Privilégio, de 1967), dirigido por Peter Watkins.

Para quem gosta de rock acaba sendo obrigatório por conta das informações contidas nas resenhas de cada filme e pela própria listagem, que demorou seis meses para ser pesquisado. Esse é o maior mérito do livro.

Vamos relembrar uma rápida entrevista de Kid Vinil, que morreu no ano passado, aos 62 anos, ao Combate Rock sobre o seu trabalho de ler, analisar e escrever um dos prefácios do livro, e conta o que achou da obra.

 

 

 

Kid Vinil (FOTO: REPRODUÇÃO DE INTERNET/FACEBOOK)

Kid Vinil (FOTO: REPRODUÇÃO DE INTERNET/FACEBOOK)

"Popcorn" é um trabalho árduo de pesquisa , sem entrar no mérito nas análises conceituais e opiniões. Trata-se de um documento importante para quem gosta de música e aprecia rock. Entretanto, em tempos de downloads e mil e uma facilidades de acesso aos mais variados filmes e obras músicas, qual a importância/relevância de uma obra como essa hoje em dia – além, é claro do aspecto de catalogação?
Hoje fazemos a mesma pergunta quando compramos um CD, LP ou mesmo livro. Hoje os filmes estao disponíveis na rede e o livro serve mais como um guia pra orientar o leitor. Ta certo que foi uma seleçao feita por um critico de musica ingles, mas mesmo assim vale a pena pelos titulos escolhidos.Pra muito sera uma descoberta de filmes da decada de 50 e 60 por exemplo que as novas geraçoes desconhecem completamente.
 
Para os jovens que buscam informação mais qualificada, e tendo como base o livro de Mulholland, qual seria a sua indicação para que esses mesmos jovens ingressassem na cultura roqueira? Qual seria o filme que melhor cumpriria o objetivo de mostrar um panorama mais abrangente para quem quisesse entender a essência do rock?
Tomarei por base os primeiros filmes que vi na minha vida, como os filmes dos Beatles tipo "Hard Days Night"e "Help", "Woodstock" (que abriu minha cabeça pro rock em 1970 quando foi exibido por aqui), "Gimmie Shelter", dos Rolling Stones, "Let It Be", dos Beatles (apesar da tristeza do fim da banda, ainda acho um bom filme), outro que me enlouqueceu na década de 70 foi "Easy Rider". Mais tarde "Jubillee" de Derek Jarman, e "Rude Boy", do The Clash e até mesmo "The Great Rock and roll swindle", dos Sex Pistols, dentre outros.
 
O autor tem uma evidente predileção pelo rock inglês, o que faz sentido no caso. Tentando olhar para o outro lado, qual seria a fita que melhor retrataria a essência do rock norte-americano pós-anos 60, em sua opinião?
Como citei "Woodstock" de 1969, "Easy Rider", também de 1969, é outro que eu adoro, e "Great Balls of Fire", apesar da temática anos 50. Musicais como "Grease" e "Saturday Night Fever" são bem divertidos e retratam bem uma época, apesar de "Night Fever" retratar a época disco, tem muito a ver com os dias de hoje nessa mistura de disco, soul, funk etc, o rock agregou com o tempo todas essas tendências.
 
Senti a falta de um posfácio que fizesse remissão a alguns filmes brasileiros, até mesmo para contextualizar leitores pouco habituados com obras de ficção com o tema rock ou mesmo os chamados rockumentários. São poucas as obras brasileiras dedicadas ao tema, como "Bete Balanço" e a cinebiografia de Cazuza. Existe alguma outra fita nacional que mereça destaque, em sua opinião, e que eventualmente poderia estar no suposto posfácio de "Popcorn"?
O livro foi uma tradução do original, não podíamos nos prender a qualquer coisa que fugisse do tema. São condições impostas para uma versão,"não mudar a obra". Para os prefácios tivemos que pedir autorização do autor e eles exigiram que não fugíssemos do assunto em momento algum. Na verdade nunca me liguei em filmes brasileiros, não por preconceito, mas por desleixo da minha parte, assim como não sou um cinéfilo mais aprofundado. Me concentro mais no lado musical da história. Por essa razão escolhemos o Rubens Ewald Filho para o segundo prefácio, mais aprofundado na historia do cinema.Quando garoto adorava os filmes da Jovem Guarda tipo "Roberto Carlos em Ritmo de Aventura", "O Diamante Cor-de-Rosa". Esse documentario do Raul Seixas eu gostei muito e o colocaria como uma obra importante dessa serie brasileira de rockumentários.
 
Entre os filmes listados, qual é o seu preferido? E qual é o melhor, em termos musicais e cinematográficos?
O meu filme favorito "Easy Rider' e, nos musicais, "Tommy".
 
Existe alguma fita que ficou de fora da lista de Mulholland e que não poderia ter ficado de fora?
No meu prefacio eu citei "Blow Up", de Michelangelo Antonioni, e "Zabriske Point", também do Antonioni. Em "Blow Up" uma das estrelas é o guitarrista Jeff Beck, um cara de extrema importância para o rock inglês.
 
 São Paulo abriga as edições do festival In-Edit, de documentários musicais. "Botinada", de Gastão Moreira, foi bem recebido pelo público que, em sua maioria, ignorava a existência da obra – e estamos falando de um público bastante específico, que supostamente é bem informado. Em breve sairá também um documentário sobre o rock pesado paulistano dos anos 80, que ainda patina na montagem por falta de patrocínio, segundo eu soube. Quais são as dificuldades para que esse tipo de obra consiga ampliar seu público? É possível transbordar a guetificação nestes casos, ou seremos sempre reféns de grandes produções como "Dois Filhos de Francisco" e "Gonzaga"?
Eu acompanhei o processo todo de produção do "Botinada" e muita gente ainda nem descobriu esse maravilhoso documentário sobre o punk brasileiro. O fato é que cada vez mais existem menos pessoas por aqui interessadas em rock. Tudo bem, não somos o pais do rock and roll, mas o que vejo atualmente são jovens alienados ouvindo música de péssima categoria (sertanejo,funk carioca, pagode ruim, forro universitário). Isso complica mais ainda as coisas pra essas produções especificas sobre rock brasileiro. Nossa história foi pelo ralo e ficam somente esses medalhões (nada contra). Porém, o rock brasileiro de outras décadas acaba no esquecimento.
 

"Popcorn – O Almanaque dos Filmes do Rock"
Autor:
 Garry Mulholland
Tradução: Henrique Monteiro
Editora: Seoman
Páginas: 448 páginas
Preço sugerido: R$ 75

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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