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Bruce Dickinson, 60 anos, celebra a arte de viver bem dentro do metal

Combate Rock

08/08/2018 06h50

Marcelo Moreira

Nascido em um meio onde os mineiros das áreas de carvão eram o esteio da economia e que ensinaram que nada é mais nobre do que a luta pela liberdade e pela justiça – ainda que possam ser compradas.

"Born in '58" é a canção biográfica mais contundente do cantor inglês Bruce Dickinson, integrante do Iron Maiden e um dos artistas mais cultos, sarcásticos e briguentos do rock.

Após superar um câncer na língua, o cantor chega os 60 anos, completados nesta terça-feira (7) renovado e de bem com a vida. O Iron Maiden continua muito bem e seu mais recente lançamento solo, "Scream for Me, Sarajevo", surpreendeu pela boa receptividade, embora as vendas digitais estejam apenas mornas.

Segundo escreveu em sua autobiografia, lançada no Brasil no ano passado, Dickinson acertou várias contas com o passado e sua relação com Steve Harris, baixista do Iron Maiden e líder do grupo, nunca esteve melhor. Até mesmo as tretas estão em baixa neste 2018.

O que falta então para que um músico bem-sucedido e reconhecido como um dos gênios do rock se sinta realizado?

"Pilotar os aviões da minha própria companhia", disse de forma meio irônica aos repórteres que o acompanharam a uma recente viagem à cidade de São Carlos, no interior de São Paulo, onde esteve em um museu aeronáutico.

Na mesma autobiografia, que deixou um pouco a desejar, a paixão por aviões supera as informações sobre a música, em especial na segunda parte do livro. Ainda hoje faz "bico" como piloto de aviação comercial, empresas europeias.

Ao completar seis décadas de vida, ele pode ser dar ao luxo em dividir as atenções entre o heavy metal e a aviação civil. Afinal, o Iron Maiden ressuscitou com o seu retorno, em 1999, após seis anos afastado. Harris, que duvidava da motivação da volta, hoje agradece ao colega pela decisão e compreende que o inquieto músico precisa expandir os horizontes.

E só sobrou a aviação, já que não há mais tempo para os seus estimados programas de rádio, os treinos e as competições europeias de esgrima (a idade não permite mais ) e as pausas para a literatura – seus dois livros que misturam humor e romance juvenil fizeram bastante sucesso nos anos 2000.

Tido como irascível e sarcástico, costuma ser muito educado nas entrevistas que concede de forma exclusiva. A este jornalista, em 1998, em São Paulo, fez vários comentários sobre a esgrima, sobre a falta de tempo para se dedicar mais à aviação comercial e sobre o recente interesse pela produção de cerveja.

Pouco antes de retornar ao Iron Maiden, no final de 1999, já tinha acrescentado mais uma atividade ao seu exaustivo currículo e dia a dia: o de mestre cervejeiro. Foi esta experiência que o levou a criar, anos depois, a sua própria marca de cerveja e a coordenar os lançamentos das marcas "The Trooper", sob a chancela do Iron Maiden.

Bruce Dickinson, do Iron Maiden, lançando a cerveja da banda na Inglaterra em 2012 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

"Estou em um momento raro na carreira de um músico veterano", disse pouco depois de completar 40 anos de idade. "Há respeito, há trabalho, há um clima excelente para fazer arte. Como não celebrar?"

Bom contador de histórias, conseguiu, na autobiografia, tornar leve um assunto muito pesado, que foi a participação de sua banda solo em concerto beneficente e para soldados na cidade de Sarajevo, na Bósnia, em 1995.

Se pudesse escolher qual Bruce Dickinson é o melhor representante de sua personalidade, seria este: o homem culto que sabe saborear cada segundo da vida e que aproveita ao máximo para aprender sempre.

No grave conflito da Guerra dos Bálcãs, que durou de 1991 a 1996, as forças sérvias e sérvio-bósnias transformaram a república da Bósnia em um grande campo de batalha, tendo como inimigos os croata-bósnios e os muçulmanos, que eram maioria no país e se consideravam os verdadeiros bósnios.

Na arriscada iniciativa de tocar na capital do país sitiada pelos sérvios, Dickinson conta diversas passagens engraçadas e relata o sofrimento que presenciou em relação à população que carecia de alimentos e energia elétrica – e ri de ter quase morrido ao sair do caminhão da ONU (Organização das Nações Unidas) para fazer uma "selfie" (com câmera fotográfica portátil) em um tanque de guerra sérvio destruído. Por muito pouco não esteve na mira de um atirador de elite inimigo.

Os 60 anos de Bruce Dickinson são uma celebração ao heavy metal e à arte de viver bem e de forma intensa dentro de uma área em que normalmente músicos estão se arrastando rumo à decadência ou ainda correndo atrás do lucro para sustentar estruturas corroídas pela falência das gravadoras e pelas possibilidades, no momento desconhecidas, da modernidade.

A voz do Iron Maiden continua relevante como músico e como cabeça pensante dentro do rock. Cada vez mais lúcido e bem informado, deixa claro que tem muito a dizer neste século XXI.

 

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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