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Heavy metal Brasil: Maestrick decola, e o Imago Mortis ressurge

Combate Rock

01/08/2018 07h00

Marcelo Moreira

Já é uma tradição em São José do Rio Preto, interior de São Paulo e uma das capitais nacionais da música sertaneja: ao menos uma vez por ano, o Sesc da cidade abre as portas para várias bandas de rock tocarem em sua quadra de esportes, sendo que, invariavelmente, o encerramento fica por conta do Maestrick, o maior nome do gênero na cidade.

A banda não economiza na eloquência. Seja no Sesc ou no palco acanhado do Villa Dionísio, a principal casa noturna de Rio Preto, a apresentação tem uma pitada de opulência e grandiosidade. Foi assim desde que o grupo lançou o ótimo "Unpuzzle", em 2013.

Esgotadas as possibilidades e oportunidades para divulgar o álbum, o então trio pensou grande: elevar conceitualmente o metal progressivo da banda para aquela que poderia ser a obra definitiva da banda.

"Soa meio pomposo, mas queríamos fazer algo marcante, mas nada de definitivo, já que ainda somos jovens. A ideia é avançar em termos de composição e de temas. Acho que estamos conseguindo", afirmou o vocalista Fábio Caldeira no lançamento de "Espresso della Vita: Solare", na Central Panelaço, em São Paulo, no mês de junho.

É conceitual o novo trabalho, queiram ou não queiram. Dividido em duas partes, o trabalho agora aborda as primeiras 12 horas de um dia de ima pessoa, a luminosidade e a vontade de viver, mesclando com as afazeres dia a dia. A segunda parte, "Espresso della Vitta: Lunare", que vai narrar as outras 12 horas do dia, ou seja, a parte noturna, não tem data para ser lançado.

"Tivemos muito trabalho para compor e gravar este álbum, que teve as guitarras do nosso produtor, Adair Daufembach. E eu ainda estou começando minha participação na banda internacional Holy Tide, baseada na Itália. É prematuro falar sobre 'Lunare"', diz Caldeira.

A qualidade de "Solare" não surpreende, mas sim o nível de maturidade alcançado pelo Maestrick. O que já era bom no álbum de estreia, "Unpuzzle", ficou ainda melhor. Os arranjos orquestrais e os teclados foram elaborados com precisão cirúrgica, e as guitarras estão bem equilibradas entre o heavy e o prog.

Assim como "Pescador", do álbum anterior, tem a pegada de música regional brasileira cantada em português, o novo trabalho traz "Penitência", que se encaixa bem no conceito do álbum por tratar de temas pesados do cotidiano brasileiro, com arranjos pontuados de ritmos regionais – e dá-lhe viola caipira e pandeiro, em um resultado ótimo.

Melhor ainda é o caso de "Hijos de la Tierra", canção em espanhol onde a banda louva os povos latino-americanos e faz com que a irmandade continental seja possível e desejável.

"Water Birds" é o momento Yes do álbum, com seus violões delicados e uma letra de cunho ecológico, tudo embalado por vocais enérgicos.

"Rooster Race" é a grande canção do disco, com influências diretas de Rush e Queen, onde os solos de guitarra embelezam um tema denso e difícil. Também merecem destaque a longa "The Seed" e a pesada e épica "Transition", que fecha o álbum e prepara o terreno para a chegada da segunda parte, "Espresso della Vita: Lunare".

Desde que "Unpuzzle" chamou a atenção e causou forte impressão o próximo trabalho era bastante aguardado. A banda paulista supriu as expectativas e lançou um dos grandes álbuns do ano.

E dá para falar o mesmo da banca carioca Imago Mortis, um dos grandes nomes do metal do Rio de Janeiro. Doze anos de silêncio foram quebrados com o recém-lançado "LSD".

Mais do que o ótimo trabalho em si, "LSD" precisa ser louvado por conta das dificuldades de mercado que as bandas de metal encontram hoje e pela série de infortúnios e problemas que o líder, o vocalista Alex Vorhees, enfrentou para retomar a carreira.

Evocando temas de inspiração mística, mas também com influências bem palpáveis do cotidiano, o Imago Mortis esbanjou talento na mistura de heavy metal tradicional, doom metal, metal progressivo e symphonic metal, com resultados muito bons.

As guitarras estão muito presentes, como tem de ser neste estio musical, mas nem sempre são os fios condutores. Os arranjos de teclado e orquestrais criam uma cama densa e que reforçam o tom dramático dos temas abordados. Isso fica claro já na longa e impressionante "The LSD Theorem", que abre o álbum.

Intencionalmente ou não, "LSD", à primeira vista, remete à droga lisérgica que surgiu nos anos 60, mas na verdade é a sigla de "Love, Sex, Death", que inclusive é o nome da música que fecha o trabalho, um heavy metal tradicional intenso em que as guitarras em fúria criam um clima intenso de "gran finale". Aqui Vorhees mostra a sua categoria não só como bom vocalista, mas como ótimo intérprete. Não é à toa que ele é da mesma geração de grandes músicos, como o saudoso Mário Linhares (Dark Avenger).

Provavelmente não há conexão entre os dois trabalhos, mas a apresentação dos materiais é semelhante. Como o Maestrick em seu novo álbum, o Imago Mortis estabelece um conceito, mas sem se prender a ele. É conceitual, mas não é algo que fica estático e restrito a uma "história". Isso valoriza ainda mais as 12 músicas.

"Binary Viscerae" é uma paulada heavy que estabelece um duelo de guitarras primoroso, assim com "Incantation", que é um pouco mais cadenciada, embora mais pesada.

Duas músicas em sequência, com cantoras convidadas, estabelecem o respiro antes do clímax do álbum. Júlia Crystal dá um show de interpretação com  sua voz delicada em "The Promise", em perfeito dueto com Vorhees. Já Mariana Figueiredo também se sai muito bem com sua voz mais forte e incisiva na densa (e tensa) "Two Hearts Chimaera".

Tensão e melancolia dominam o fim do álbum, com a já citada "Love, Sex, Death", que é precedida por canção declamada, com letra em português. "Epitáfio de um Amor" exala tristeza, mas empurra a sua poesia para um final um pouco edificante, mostrando caminhos para um futuro dolorido, mas necessário, de superação.

A volta do Imago Mortis é uma grande notícia para a música pesada brasileira, que perdeu no ano passado o ótimo Dark Avenger por conta da morte do vocalista e mentor Mário Linhares.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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