Folk Brasil: O Bardo e o Banjo e The Leprechaun apostam nos extremos
Marcelo Moreira
A brincadeira continua válida: músico brasileiro achando que é viking? Ou sonhando que vive nas pradarias e florestas encantadas da Irlanda vendo duendes? Se existe bana finlandesa que sonhou em viver no Rio de Janeiro para cantar punk rock, por que não?
O rock é tão plural, internacional e multinacional que permite que coisas assim funcionem, de certa forma, ou então não teríamos bandas mineiras como Tuatha de Dannan, Lothloryen e Cartoon mergulhando no universo folk dos britânicos e dos celtas. Ou dos caipiras norte-americanos.
As bandas paulistas O Bardo e o Banjo e The Leprechaun nunca tiveram medo de enfrentar tais questionamentos. Para eles, Dublin, Boston, Louisiana ou Missouri nunca estiveram tão perto.
O quarteto O Bardo e o Banjo está lançando seu novo trabalho, "O Tempo e a Memória". É folk encharcado de música country até a medula óssea, com direito a exageros e gritos à la cowboy.
A ideia é fazer uma versão tropicalizada daquele tipo de folk que se aproxima bastante do chamado bluegrass, usando banjo, rabeca, violino e aquele baixo de pau típico para ajudar na percussão.
O resultado pode até ficar caricato em algumas músicas, mas também fica muito interessante, especialmente no que se refere ao mergulho na história do sul dos Estados Unidos.
"O Tempo e a Memória" é o segundo álbum de músicas autorais do Bardo e o Banjo e pode ser considerado o primeiro álbum autoral de bluegrass cantado em português. É o que garantem os integrantes da banda.
Composto, pré-produzido e gravado em quatro anos, o disco tem o grande mérito de misturar influências da música brasileira, música clássica, novos timbres com pianos, guitar steel e sanfona.
Poderia ficar esquisito, mas as letras em português casaram bem com o instrumental alegre e para cima da banda. "Festa no Celeiro" é uma verdadeira celebração da música caipira norte-americana em terras brasileiras, enquanto que "Moda de Banjo" e "Alvorecer" explicitam a mistura com ritmos locais.
"De Dentro Para Fora" e "Vida" apostam em temas um pouco mais melancólicos, enquanto que o inglês ressurge nas músicas "The Owl" e "Summer Rain" para lembrar a todos que o quarteto está com os dois pés atolados no mais profundo e lamacento pântano do folk norte-americano – o que é muito bom, diga-se de passagem.
Já The Leperechaun abraçou o mundo celta – o nome já denuncia -, mas teve personalidade suficiente para admitir que foi um ponto de partida. O negócio agora é ampliar os horizontes e agregar novos elementos.
"Isosceles" é o terceiro álbum da banda, que é mais eclético e dinâmico que o anterior, "Long Road", ainda com forte acento do celtic folk. a música servia como um carimbo para o estilo da banda, mas já é assim.
Com uma articulação interessante entre mundos distintos, The Leprechaun mantém os dois pés no mundo irlandês, mas arriscou bastante ao procurar mais elementos do country norte-americano. É como se Boston se mesclasse com Nashville e com Barretos e Jaú, no interior de São Paulo. O resultado é muito interessante.
"Good Times" abre as portas do novo álbum com um clima de pub, com emulações de instrumentos típicos como whistle e bodhran. O clima é de Bostom, mas bem que poderia ser de Dublin, capital da Irlanda, ou Cork.
Alguns desavisados poderiam achar que a colônia irlandesa ou escocesa no Brasil é bastante representativa, a julgar pelo fascínio que a cultura gaélica/celta desperta em alguns músicos brasileiros.
É inegável a influência importante de grupos irlandeses como The Pogues e dos trabalhos solo de seu líder, Shane MacGowan, além dos norte-americanos do Dropkick MUrphys.
Os arranjos são muito interessantes, com a recriação de um ambiente celta em estúdio com muita competência, mesmo em composições originais. O folk irlandês predomina, mas há elementos de country, bluegrass, blues e algum tempero brasileiro.
"Isosceles" é um trabalho bastante agradável e o grupo acertou em cheio ao escalar uma cantora, a surpreendente Fabiana Santos, que manda muito bem nas canções mais rápidas e, principalmente, nas que tem maior acento folclórico.
O trabalho de guitarras,violões e cordas em geral é primoroso, em um belo esforço de garimpagem de sons e timbres característicos. Os apreciadores do rock mais pesado são contemplados aqui e ali com guitarras mais fortes e vigorosas
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