Cazuza, 60 anos: louvemos a sua irreverência e inteligência
Marcelo Moreira
Mais poeta do que cantor e compositor. Esse é o erro mais comum quando alguns tentam analisar a obra de Cazuza. Não seira melhor se referir a ele como artista, mesmo que o temo seja muito amplo?
Caso estivesse vivo, teria 60 anos de idade – morreu aos 32 anos em 1990, em consequência da aids. Além da evidente qualidade de seus textos e letras, o faz dele o melhor cantor do nosso rock era a irreverência e a capacidade de ironizar a todos, inclusive a si próprio.
Era o oposto de Renato Russo, da Legião Urbana, que se levava a sério demais e que amava ver os resultados de sua postura messiânica.
Desde os tempos de vocalista do Barão Vermelho, Cazuza estava mais preocupado em vivenciar a experiência de ser artista do que em se esforçar em "deixar um legado".
Sua própria existência foi o maior legado que deixou, fazendo dele um símbolo daquele pulsante e necessário rock brasileiro dos anos 80.
De longe o melhor letrista daquela geração, usou o seu vasto conhecimento musical para colorir o rock de tal maneira que se tornou referência.
São inúmeros os exemplos de sua poesia bela e incisiva, mas o melhor de sua habilidade com o texto está nas músicas "Ideologia" e "Codinome Beija-Flor".
Culto e obsessivo, pescou de todos os lugares as referências para construir um repertório variado e intenso. Ele mergulhou no samba e resgatou muitas pérolas esquecidas, assim como teve a sensibilidade de "sugar" o que de melhor a MPB produziu desde os anos 60.
Aliás, sensibilidade é outra característica que o distingue de seus concorrentes, além da irreverência marcada pela habilidade com as palavras. Observador perspicaz do cotidiano, transitava com eficiência desconcertante entre o cronista social e o bardo folk que ambicionava (de leve) ser.
E quem diria que, por ironia do destino, a melhor definição de Cazuza viria do amigo, ex-parceiro e eterno rival Roberto Frejat, na pungente e maravilhosa homenagem contida na música "O Poeta Está Vivo" – uma parceria do ex-guitarrista do Barão Vermelho com Dulce Quental: "O poeta está vivo / Com seus moinhos de vento / A impulsionar
A grande roda da história". Mais Cazuza do que isso, impossível.
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