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Show do Pearl Jam funciona apenas com seus convertidos

Maurício Gaia

23/03/2018 07h23

Muita gente sabe que, das bandas do movimento grunge, a que mais mantenho distância é o Pearl Jam. Ao contrário de suas contemporâneas, sempre manteve seus pés no Classic Rock, sem apresentar nenhum tipo de sopro de renovação. Apesar disso, tem uma base fiel de fãs, que consideram o discurso misturando elevação espiritual com pitadas de zen-surfismo, ironia e rebeldia de Eddie Vedder algo próximo d'A Revelação.

Pois bem, eu pus todo meu cinismo de lado e rumei para o Rio de Janeiro, para ver uma apresentação do Pearl Jam que, garantiriam os fiéis, mudaria minha vida. Então, já adianto o spoiler: não mudou. Com o show começando com uns quinze minutos de atraso e uma sequência de três baladas, confesso que o combo calor + viagem fez com que eu desse umas cochiladas, apesar do entusiasmo de um Maracanã não-lotado.

A banda, frise-se, é competente e deve-se louvar o esforço de Eddie Vedder em se comunicar com a platéia em português, apesar de seu "português de merda", como o próprio fez questão de frisar. Ao longo de pouco mais de duas horas e meia e 29 canções, a banda apresentou várias canções de sua discografia, de forma competente, porém sem brilho.

Talvez o melhor momento tenha sido a citação de "3rd Stone From The Sun", de Jimi Hendrix, durante "Even Flow". Mas vamos combinar que essa citação é mais do que batida: até Right Said Fred faz isso, ora bolas.

Durante "Black", me distraí um pouco e comecei a observar o local, o novo Maracanã, reformado para a Copa do Mundo e hoje um estorvo para o futebol carioca. Antes um lugar onde gênios do futebol escreveram história, o estádio não deixa de ser um retrato do que é o Rio de Janeiro, símbolo de um país que poderia ter realizado todo seu potencial, mas que nunca chegou lá, dilapidado pela ganância e incompetência de gerações de governantes. Enquanto isso, a platéia cantava empolgada o corinho da música, indiferente ao fato de estar em lugar que hoje se tornou imprestável àquilo que era seu objetivo principal. (UPDATE: Descobri hoje, pela manhã, que a final da Taça Rio, entre Botafogo e Fluminense, será no Maracanã)

Maracanã, com Pearl Jam no palco

O show ainda contou com a participação de Chad Smith, baterista dos Red Hot Chilli Peppers, em "Can't Deny Me", single mais recente da banda. Smith não tocou bateria nesta música, tocou cowbell, algo que, sinceramente, até minha avó morta seria capaz de fazer com competência. A penúltima música do bis, com as luzes do estádio acesas, Smith voltou ao palco, desta vez acompanhado por seu companheiro de banda, o guitarrista Josh Kinghoffer, para uma versão animada de "Rockin' In The Free World", de Neil Young e música frequente no repertório do Pearl Jam.

Na saída, ouvi o testemunho de uma fã, Juliana Teixeira, que foi de São Paulo até o Rio para ver pela décima vez o Pearl Jam: "De dez shows que eu vi, este talvez tenha sido o que menos gostei", disse. Os motivos: um setlist que não havia prestigiado todos os álbuns da banda, longas passagens instrumentais "caberiam mais umas três musicas ali" e o atraso no início da apresentação "mais outras três musicas". Coisas de fã exigente, como se percebe.

O saldo final, de um show que poderia ser mais curto, é que Pearl Jam ao vivo funciona bem apenas para os convertidos.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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