Vendas de instrumentos desabam, e o futuro fica mais sombrio
Marcelo Moreira
Sintoma da crise econômica ou a face mais evidente de uma mudança comportamental profunda – com consequência direta no mundo das artes e do entretenimento?
Já faz algum tempo que a indústria de instrumentos musicais no mundo acusa quedas acentuadas nas vendas e na produção, a ponto de analistas de mercado temerem pelo futuro financeiro de outrora gigantes como a Fende e a Gibson, ícones da música ocidental.
Nos Estados Unidos, desde 2015 constata-se a queda de prestígio da guitarra e do baixo, com seguidas nas vendas, a ponto de instrumentistas famosos dizerem, horrorizados, que os dois instrumentos desapareceriam do mercado em breve.
No Brasil, a coisa é mais complicada ainda. A Expomusic, maior feira de instrumentos musicais da América Latina, vem diminuindo de tamanho desde 2012. No passado, um golpe pesado: diante da crise do setor e da queda do público, o evento que era anual passará a ocorrer a cada dois anos.
Agora outro dado preocupante em relação ao mercado nacional, segundo texto publicado no site da rádio CBN: Entre 2012 e 2017, as vendas de guitarras e baixos no Brasil, via importação ou não, caíram 80%; as de teclados, 55%.
O texto traz algumas hipóteses para tal descalabro, umas plausíveis, outras nem tanto. O que não dá para contestar é o fato de que há um sensível diminuição no interesse pelos instrumentos musicais em nosso tempo, algo que é muito preocupante e que revela um desprezo contínuo pelo conhecimento.
Diante das opiniões mencionadas, não dá para cravar que a molecada hoje é mais preguiçosa ou mais burra por se interessar cada vez menos por cultura ou entretenimento de qualidade. Afinal, nunca na história da humanidade o acesso à informação, de todos os tipos, foi tão fácil e corriqueiro.
Por outro lado, a sensação de que o interesse pela leitura e pelo conhecimento mais profundo despencou é evidente, e são fartas as fontes de informação que corroboram isso: o mundo é cada vez mais rápido, digital e instantâneo, com pouca ou nenhuma paciência para ler ou aprender de forma decente um instrumento musical.
São tempos difíceis em termos políticos e em termos culturais. As sucessivas crises, no caso brasileiro, aumentam o desalento e o desprezo pelas instituições, a ponto de uma massa de ignorantes, que hoje é a maioria (pelo menos é a sensação que temos) não ter vergonha de criminalizar a política, de desvalorizar o conhecimento, de satanizar a cultura e as políticas de direitos humanos.
O resultado é a ascensão de aventureiros conhecidos como "não políticos", mas que não passam de trogloditas eleitorais insanos ou despreparados.
O desabamento nas vendas de instrumentos musicais, de livros e de música (em qual formato for) ultrapassa a questão da crise econômica severa no Brasil. Aponta para uma preocupante mudança de comportamento em que o conhecimento, a informação de qualidade e a inteligência ficam em segundo plano.
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