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Renovado e inspirado, Torture Squad lança o melhor álbum de sua carreira

Combate Rock

14/07/2017 06h17

Marcelo Moreira

Torture Squad na audição do novo álbum no estúdio Orra Meu (FOTO: MARCELO MOREIRA)

Quando um artista respira aliviado e fala, com um enorme sorriso, que a banda reencontra um caminho depois de quase 25 anos de carreira, é para se desconfiar. Afinal, então para que serviu então esse um quarto de década?

Em uma interpretação apressada, alguém desavisado pode entender que apenas agora o quarteto Torture Squad parece trilhar um caminho seguro e definitivo, "entrando nos trilhos".

O articulado e falante Amílcar Christófaro mantém o sorriso e a serenidade sem se preocupar com variadas interpretações.

"É evidente que o orgulho é imenso após mais de 20 anos e oito CDs gravados, lançados e distribuídos no mundo inteiro. Mas é inegável que o momento atual é saboroso e,d e certa forma redentor, com um trabalho que considero muito forte e diferente em muitos sentidos", diz o baterista.

O Torture Squad ousou em todos os sentidos para apresentar às imprensa, em primeira mão, as 15 músicas que comporão as diversas versões de "Far Beyond Existence", CD que será lançado nesta semana.

Em pleno domingo de inverno, mas com sol, o agora quarteto reuniu jornalistas e amigos para ouvir em som potente, no estúdio Orra Meu, na zona sul de São Paulo, o trabalho novo.

Mestre de cerimônias, Christófaro, ainda sentido os efeitos da viagem de volta de um show insano realizado em Caraguatatuba (litoral norte de São Paulo) na noite anterior, fez questão de guiar os ouvintes para uma viagem pesada aos meandros de uma obra que, na visão do Combate Rock, muda tudo na carreira da banda paulistana.

Em alguns momentos da extensa carreira do Torture Squad, o grupo integrou o primeiro time do rock pesado brasileiro, ao lado de Sepultura, Krisiun, Angra, Korzus e Dr. Sin, tanto que chegou a ser um dos destaques das chamadas bandas novas do maravilhoso festival alemão Wacken, o principal do metal.

Com a saída do vocalista Vítor Rodrigues há seis anos, pareceu que a confiança foi abalada. O death metal violento e técnico deu lugar a um som mais cru, rústico e direto, transformando o então trio em um grupo de thrash de inspiração alemã – uma porrada sonora, com um som direto e mais cru, lembrando Destruction e Sodom.

"Esquadrão de Tortura" foi o grande legado dessa fase em trio, com André Evaristo cantando e tocando guitarra. O álbum era mais despojado, em que a mensagem tinha grande efeito em um CD visceral e conceitual.

Mas eis que vem a grande surpresa, com nova mudança de formação – e que mudança: em 2015 Evaristo deixa o grupo e é substituído pelo "monstrinho" René Simionato, enquanto a "bela que vira fera" Mayara Puertas, ex- Necromesis, assume os vocais.

Não é só a transformação em quarteto novamente que define o futuro o quarteto – é o som, o conceito musical e a própria filosofia de trabalho. Mudou tudo. É outra banda? É uma nova banda?

Havia indícios de que sim, a mudança era total, no EP "Return of Evil", de 2016, com quatro músicas. O Torture Squad ressurge mais encorpado, maios dinâmico e muito mais técnico, dando vazão a uma série de influências de seus integrantes, que incluem classic rock, rock progressivo e heavy metal tradicional.

"Far Beyond Existence" é resultado direto desse momento inspirador, reunindo uma série de informações então ausentes em trabalhos anteriores.

O que era extremo se tornou mais técnico e mais variado, ampliando uma série de possibilidades estéticas e sonoras. Alguém poderia imaginar o Torture Squad fazendo uma versão metal de um clássico do ZZ Top? Ou fazendo uma música instrumental baseada em uma longa jam que mistura a viagem de Grateful Dead com as passagens intrincadas e detalhistas de um Yes ou um King Crimson?

A saída de Vítor Rodrigues foi um choque e obrigou a banda a uma transformação musical e mental, que teve como resultado o melhor álbum da carreira da banda – fundada em 1990, mas que tem Christófaro e o baixista Castor no leme desde 1993.

Mayara gosta de mostrar que é má nas fotos, como convém a uma bada de death, mas é uma garota que não consegue – ainda bem – esconder o sorriso. Não só ri o tempo todo, mas gosta de zoar e atazanar.

Quando Christófaro se empolga nas divagações sobre as músicas e filosofa sobre tudo, cabe a ela uma tirada que arranca gargalhadas de todos e deixa o baterista meio sem jeito, ainda que consiga manter o raciocínio.

O vocal é extremo e demoníaco, mas dá certo em cima de uma base musical que se afastou da música extrema e que freou a velocidade para valorizar mais o peso e as melodias?

Não deveria dar certo, mas Mayara deu um jeito. Encontrou uma zona de conforto e consegue transitar com eficiência entre as levadas mais técnicas e progressivas que a banda adotou.

Contribuíram para isso as escolas inteligentes de Simionato e a decisão acertada de explicitar mais o baixo de Castor, agora mais na cara e transitando com mais segurança entre a linha de baixo e a "base" de guitarra. O som da banda ganhou demais com essas decisões.

E é assim que a "Lady Evil" Mayara Puertas destila ódio e agressividade em cima de um instrumental que privilegia melodias mais complexas que remetem ao um heavy tradicional e um classic rock de extremo bom gosto.

Enfim, o que vemos é uma banda muito mais leve e descontraída, onde cada integrante teve uma liberdade bem maior do que o normal para ousar e criar e aproveitando para romper certas amarras que os normalmente os rótulos costumam impor.

"No Fate" e "Hate" talvez sejam os melhores exemplos da nova fase do Torture Squad – solos de guitarra precisos e cortantes, instrumental encorpado e baixo veloz e gordo, ainda que esta não tenha sido a intenção inicial de Castor.

"Blood Sacrifice" é soturna e pesada, com arranjos e levada que remetem um pouco a "Powerslave", do Iron Maiden, e um trabalho soberbo de Mayara nos vocais.

Castor mostra extrema técnica "Hero of the Age", conduzindo a música com eficiência, enquanto que Christófaro despeja fúria e ousadia em levadas mais progressivas. Os dois quebram tudo de novo em "You Must Proclaim", construindo uma música a base de de riffs e grooves pesados.

Se o grupo ainda tateava em busca de uma nova identidade sonora em "Return of Evil", com certeza a encontrou em "Far Beyond Existence", que teve a produção segura e eficiente de Wagner Meirinho e Tiago Assolini, que pilotaram as gravações nos estúdios Loud Factory e Orra Meu, em São Paulo, entre os meses de abril e junho de 2017.

O álbum contou participações especiais, como as de Dave Ingram (Haill of Bullets, ex-Benediction, Bolt Thrower), em "Hate"; Edu Lane (Nervochaos), na narração em "Cursed by Disease"; Luiz Louzada (Vulcano, Chemichal Desaster), em "You Must Proclaim"; Alex Camargo (Krisiun), na versão de "Just Got Paid", dos texanos do ZZ Top; Marcello Schevano (Carro Bomba, Golpe de Estado, Casa das Máquinas), tocando órgão Hammond na inédita instrumental "Torture in Progress", e Fernanda Lira (Nervosa), na versão de "Divine Step", da banda suíça Coroner.

Nas letras, a banda manteve a tradição de abordar diferentes tópicos, como as questões da vida que estão além da compreensão humana ("Far Beyond Existence"), passando por inspiradoras mensagens de atitude ("Steady Hands"), palavras ¨amorosas¨ para os políticos brasileiros (Don't Cross my Path), até filosofias de vida do Bruce Lee ("Hero for the Ages").

Com um suporte da gravadora inglesa Secret Service para distribuir o álbum na Europa, o Torture Squad praticamente renasce e redesenha o seu futuro dentro do heavy metal brasileiro, mesmo que, como disse Christófaro ao abrir a audição do álbum, que a ambição da banda "não seja atingir o sucesso como todos sabiam como era no passado. Hoje o objetivo é fazer música boa e instigante em momento em que cada vez mais o 'fazer sucesso' se torna algo totalmente relativo.'

Torture Squad (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Lista de músicas:

01 DON'T CROSS MY PATH
Musica: Amilcar Christófaro e Castor
letra: Amilcar Christófaro

02 NO FATE
Musica: Amilcar Christófaro e Castor
letra: May Undead

03 BLOOD SACRIFICE
Musica: Amilcar Christófaro, Castor, May Undead e Rene Simionato
letra: May Undead

04 STEADY HANDS
Musica: Amilcar Christófaro, Castor e André Evaristo
letra: Amilcar Christófaro

05 HATE
Musica: Amilcar Christófaro e Castor
letra: Amilcar Christófaro

06 HERO FOR THE AGES
Musica: Amilcar Christófaro e Castor
letra: Montada por Amilcar Christófaro com filosofias de vida de Bruce Lee

07 FAR BEYOND EXISTENCE
Musica: Amilcar Christófaro e Castor
letra: Amilcar Christófaro

08 CURSED BY DISEASE
Musica: May Undead e Amilcar Christófaro
letra: May Undead

09 YOU MUST PROCLAIM
Musica: Amilcar Christófaro e Castor
letra: Castor

10 JUST GOT PAID
Musica: Billy Gibons e Bill Ham
Versão: Torture Squad

11 TORTURE IN PROGRESS (instrumental)
Musica: Amilcar Christófaro e Castor

12 Unknown Abyss (Intro)
Autor: Amilcar Christófaro

BÔNUS

Brasil
Torture in Progress (Instrumental)
Just Got Paid (Zztop)
Unknown abyss (Intro)

Europa I
Just Got Paid (ZZTop)
Flick of the Switch (ACDC)
Area 51 (Regravação)
Unknown abyss (Intro)

Europa II
Inside the eletric Circus (WASP)
Divine Step (Coroner)
Overkill (Motorhead)
Unknown abyss (Intro)

USA – Licenciado pela Secret Service para o selo Brutal Records
Area 51 (Regravação)
Unknown abyss (Intro)

CHILE
Area 51 (Regravação)
Unknown abyss (Intro)

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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