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Está na hora do rock repensar suas letras

Maurício Gaia

01/03/2017 16h30

A polêmica estourou neste carnaval: muitos blocos de rua de Rio de Janeiro e São Paulo se recusaram a tocar algumas velhas marchinhas do carnaval, que reproduzem em seus conteúdos episódios de racismo, homofobia e machismo. O bafafá dividiu pessoas que apoiaram a decisão destes blocos e outros, como o articulista Ruy Castro, que acreditam que tudo isso não passa de "praga do politicamente correto".

Café Tacvba (foto: divulgação)

Agora, a questão chegou a uma banda importante. Os mexicanos do Café Tacvba anunciaram na semana passada que não irão mais apresentar em seus shows a canção "La Ingrata", do álbum "Re", de 1994.

"La Ingrata", uma das músicas mais populares do repertório da banda e uma das mais pedidas em seus shows, retrata um feminicídio – a letra termina assim:

"Por eso ahora
tendre que obsequiarte
un par de balazos
pa que te duela.
Y aunque estoy triste
por ya no tenerte
voy a estar contigo
en tu funeral…"

A banda havia sido questionada inicialmente pelo jornal argentino "La Nación" sobre a contradição entre estar engajado na luta pela igualdade de gêneros e o teor da letra. O vocalista Ruben Albarran afirmou que, quando a música foi composta, eles eram jovens e que ainda não haviam sido sensibilizados pelo tema. "Muitas pessoas podem dizer que é apenas uma canção. Mas as canções são a cultura e essa cultura é o que faz com que certas pessoas se sintam com o direito de agredir, causar dano, o que seja."

Claro que muitos fãs da banda criticaram a decisão, mas cabe a reflexão: em tempos que certos comportamentos são minimamente reprováveis, é correto incentivá-los através de letras de música ou outra representação artística?

Em muitos momentos, o rap é criticado pelo conteúdo das letras, com muitos casos de apologia à violência contra mulher, entre outros. Mas e o rock? Está isento desta crítica? Bom, se pegarmos alguns exemplos como Led Zeppelin, Deep Purple, AC/DC, Guns&Roses, a resposta é não.

Canções como "Hot For Teacher" ou "Use to Love Her" ou "Sílvia" (do Camisa de Vênus) fazem tanto sentido hoje em dia quanto "O Teu Cabelo Não Nega". São anacrônicas e reforçam comportamentos execráveis. Ao longo dos tempos, assim como em outros gêneros musicais, artistas de rock compuseram músicas misóginas, racistas, preconceituosas. Hoje essas canções devem ser revistas e, quando for o caso, ter seu conteúdo discutido.

A decisão do Café Tacvba pode e deve funcionar como uma reflexão para os demais artistas sobre a conveniência de se manter ou não canções que reforçam preconceitos, estereótipos e comportamentos violentos em seus repertórios.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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