Prêmio Nobel de Literatura, Bob Dylan continua 'salvando' a música
Marcelo Moreira
O garoto caipira era tímido, mas ao mesmo tempo muito confiante. Foi desencorajado quando chegou ao Greenwich Village, em Nova York, bem no comecinho dos anos 60: "A concorrência é enorme, e há mais intelectuais e artistas bons por metro quadrado do que ratos".
Robert sonhava demais, e viajava demais, e produzia demais, mas a pequena Duluth, em Minnesota, não tinha condições de entender – e nem muito interesse de entender – a inquietação do jovem aspirante a artista.
E foi com coragem que Robert assumiu o apelido Bob, trocou o sobrenome jodeu Zimmerman por Dylan e ganhou o mundo com seu violão e sua poesia refinada, ainda que um tanto ingênua e inocente, em 1961, em uma da capitais do mundo.
Bob Dylan não tinha o sofrimento e a pegada visceral de grandes nomes do folk, como Peter Seeger, Arlo Guthrie e Woody Guthrie, por exemplo, mas logo o público percebeu algo muito diferente no trabalho do menino que cantava "pelo nariz" e que tinha alguma dificuldade com o violão: as letras eram mais sofisticadas, muito bem elaboradas para um jovem de 20 anos. Sua mensagem era clara, mas poética e com gemas de metáforas escondidas em muitos versos.
Esse talvez tenha sido apenas o impulso para que o tímido Bob deixasse de ser apenas o bardo interiorano de letras binspiradas para se tornar um nome crucial e fundamental para a cultura ocidental.
Aos 75 anos de idade, completados em maio, Dylan ainda carrega um legado gigantesco a cada show e a cada CD que lança. O mais recente trabalho é "Fallen Angels", recém-lançado, onde o músico se mostra mais melancólico e deixa um pouco de lado a sua contundência.
É o segundo trabalho onde revisita alguns clássicos da música norye-americana das três primeiras décadas do século XX, e Dylan se sai muito bem como intérprete, em um caminho parecido com o de outro gênio septuagenário, o guitarrista Eric Clapton.
É um aprofudamento no jazz, no lues, no gospel e no folk, com a característica sombria e melancólica que suas interpretações recentes atingiram nos últimos tempos.
O bom gosto é inevitável, especialmente em interpretações tocantes como nas duas canções que fecham o trabalho, "That Old Black Magic" e "Come Rain Or Come Shine". Em outras, Dylan ressalta o lirismo e a delicadeza, como na suave "Melancholy Mood" e na bela "It Had To Be You".
Agitação, rebeldia e volatilidade
São pelo menos 56 anos de carreira musical, com um impacto cultural talvez só comparado com o dos Beatles. Não apenas Dylan é reconhecido facilmente pela própria música nos primeiros acordes: ele se tornou, contra a vontade, um símbolo de uma geração e de gêneros culturais.
O trabalho coalhado de temas políticos nos anos 60, obviamente, o levou para a defesa dos direitos civis, atraindo a admiração geral, mas também o ódio de uma direita norte-americana fossilizada e assustada com a velocidade das mudanças. Dylan era a voz das ruas, das mudanças e dos protestos. Passou a ser temido.
Só que isso ocorreu também com os fãs. Eles temiam que tipo de Bob Dylan encontrariam da próxima vez que o vissem, ou o ouvissem.
Inquieto e sempre buscando desafios literários e musicais, revoluxionou a própria música quando adotou a guitarra elétrica em 1966, motivo de ódio e satanização por parte dos piratas. Tocou a vida em frente e se tornou ainda maior.
Esqueça as suas idas e vindas em relação às religiões que abraçou e às dificuldades de relacionamento que teve com namoradas e esposas. Esse aparente teve enorme contrubuição para que sua carreira atingisse o status de lenda.
Uma boa definição para a importância de Bob Dylan para a música foi dada anos atrás pelo jornalista Alexandre Matias, um dos blogueiros do UOL Entretenimento e UOL Música.
"Dylan talvez mereça ser lembrado como o sujeito que salvou um dos maiores legados do século passado: a canção norte-americana.
Uma tradição que se iniciou quando definiram que os novíssimos discos de vinil não podiam carregar mais do que quatro minutos de música – e, portanto, não serviam para gravar música erudita.
Foi inventado um gênero que misturava a tradição popular ao modelo fordista de produção – e logo os cânticos do povo eram enquadrados ao formato introdução-estrofe-refrão-estrofe-solo-refrão, que funcionou como terreno fértil para novos mestres como os Gershwin, Cole Porter, Irving Berlin, Johnny Mercer e Louis Armstrong."
Sobre os Autores
Sobre o Blog
Contato: contato@combaterock.com.br
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.