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Joe Perry mira Steven Tyler em biografia, e faz bom relato sobre o rock

Combate Rock

28/09/2016 06h58

Marcelo Moreira

Joe Perry (FOTO: DIIVULGAÇÃO)

Joe Perry (FOTO: DIIVULGAÇÃO)

O menino feioso, que adorava água e natureza – e detestava estudar – até que se deu bem. Nem tanto quanto um dos ídolos, o guitarrista Eric Clapton, mas Anthony Joseph Pereira não pode reclamar.

Nem de longe tem o talento do ídolo na guitarra e para escrever, mas Joe Perry (o menino feioso) nem precisou chegar a tanto para se tornar um dos astros de rock mais bem-sucedidos da história como integrante do Aerosmith, banda que ajudou a fundar com o amigo baixista Tom Hamilton em 1970, no interior de Massachussets, no nordeste dos Estados Unidos.

Perry é o autor de uma surpreendente autobiografia recém-lançada no Brasil pela editora Benvirá, bem a tempo de aproveitar a vinda de banda para shows por aqui no final de deste ano.

Em parceria com o jornalista e escritor David Ritz, "Rock – Minha Vida Dentro e Fora do Aerosmith" está bem longe de ser um marco estilístico dentro da literatura roqueira, mas chama a atenção justamente por isso: sem arroubos literários e sem a pretensão de estabelecer parâmetros dentro do estilo, como ocorreu com a autobiografia de Clapton, a obra entrega o que promete.

A leitura é fácil e a narrativa é cronológica. Perry acerta ao não dar muito espaço para sua vida pré-Aerosmith – afinal, o que interessa é a sua presença na banda.

Ele é sucinto a respeito de sua infância feliz de classe média em uma cidade de Massachussets, de sua juventude igualmente feliz com tempo de curtir a natureza e as águas do lago Sunapee, como aprendeu sozinho a tocar violão, as primeiras bandas e as dificuldades para comprar a primeira guitarra elétrica.

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Conta ainda como o pouco apreço pelos estudos e os anos como operário metalúrgico moldaram sua personalidade retraída e tímida, mas que ajudaram a reforçar a determinação de se tornar músico.

A narrativa acelera a partir da formação do Aerosmith, em 1970, com o amigo de infância Tom Hamilton, baixista. É na 1.325 Commonwealth Avenue, avenida importante de Boston, que o grupo decola com a chegada do último integrante, o vocalista e baterista Steven Tallarico, que virou Tyler dois anos depois.

Despido de vaidade e preocupado em ser preciso, Perry optou por ser "sincerão" e abordou temas muito delicados de forma aberta e séria, sem subterfúgios ou eufemismos: o mergulho quase fatal nas drogas, as brigas graves com o "irmão" Tyler, os problemas administrativos que destruíram o Aerosmith várias vezes, as farras na estrada e a dificuldade de manter o fracassado primeiro casamento.

Ele não nega que sua vida fora do grupo é pouco interessante, e fez uma boa opção ao fundir a "biografia" do Aerosmith com a sua própria, entrelaçando a narrativa e tornando-a mais "jornalística".

Dois são os pontos altos do livro: o relacionamento conturbado com Tyler e o desastre que se tornou sua carreira solo quando esteve fora do Aerosmith, entre 1979 e 1984.

Embora haja a preocupação de dizer que "ama" Steve Tyler como a um irmão e que o respeita demais, Perry faz do companheiro o alvo principal de ressentimento e de muitas mágoas. O guitarrista ama o vocalista, mas não confia totalmente nele – na realidade, longe disso.

Perry narra várias pisadas na bola de Tyler – a demora na composição das músicas, a exigência de ganhar dinheiro para emprestar sua voz a músicas da banda a serem usadas em games e uma muito grave: quando marcou de encontrar o guitarrista para compor em um final de semana, não apareceu e não deu notícias por semanas, para Perry saber via imprensa que o cantor tinha decidido aceitar o convite para ser jurado no reality show American Idol. Tal decisão implicou o adiamento por anos do novo álbum da banda de uma lucrativa turnê pelos Estados Unidos.

Aerosmith nos anos 2000 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Aerosmith nos anos 2000 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

E o pior é que houve reincidência. Tyler desapareceu por dois meses, segundo Perry, em meio a planejamento de turnê e CD, e os companheiros só souberam o que estava acontecendo pela imprensa: decidiu ir a Londres para fazer um teste para cantar no Led Zeppelin, após outra recusa de Robert Plant para uma reunião. Com sarcasmo, Joe Perry conta o tamanho do fiasco do companheiro – Jimmy Page teria lhe dito que Tyler chegou despreparado e foi muito mal na jam.

Em relação à carreira solo, Perry diz que saiu o Aerosmith por conta do caos que virou a administração da banda, estava falida em 1979 e deixou os cinco integrantes endividados.

De grande astro de uma superbanda, o guitarrista teve de voltar a tocar em clubes e teatros de baixo orçamento, além de bares. Foram cinco anos intensos, em que os três álbuns lhe proporcionaram uma crescimento como músico, mas nem de longe aliviaram as dívidas herdadas do Aerosmith – e tudo isso temperado por um divórcio caro.

Perry foi sincero e honesto ao dizer que tinha saudades dos ex-companheiros, mas que uma volta ocorreria principalmente para que ele pudesse retomar o fôlego financeiro. E assim aconteceu em 1984, já que o Aerosmith, na época, com todos os excessos de seus membros, já era considerada uma ex-banda em atividade.

Aerosmith na primeira metade dos anso 70 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Aerosmith na primeira metade dos anso 70 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

O retorno da formação original e clássica era o que banda precisava para resgatar a credibilidade e a inspiração necessária para voltar ao sucesso, graças aos álbuns "Permanent Vacation" (1987), "Pump" (1989) e "Get a Grip" (1993).

O guitarrista também foi bastante direto a respeito dos vícios em remédios, álcool e drogas, contando sem censura os detalhes das farras e dos mergulhos em todo o tipo de excesso.

Um dos bons méritos da obra é narrar com detalhes os problemas administrativos de uma banda gigante, os erros absurdos que são cometidos e as decisões que precisam ser analisadas e tomadas para que projetos não fracassem antes mesmo de sua implantação. Nem as melhores obras do gênero chegaram a tanto.

O livro é obrigatório para fãs do Aerosmith e é bem bacana para quem gosta de rock e quer ter informações diferenciadas e diferentes sobre o funcionamento de uma banda de rock.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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