Topo

Rod Stewart, 70 anos: esqueça o crooner de cassino e mergulhe no bluesman

Combate Rock

30/01/2015 06h35

Marcelo Moreira

Esqueça o cantor canastrão que se veste de branco para cantar músicas do cancioneiro norte-americano de forma brega em algum cassino de Las Vergas. Esse senhor espalhafatoso, ainda que engraçado, fazendo caras e bocas tentando parecer bacaninha para um público idoso e saudosista é apenas uma pálida lembrança do furacão do blues e da soul music misturadas em um potente rock setentista.

Rod Stewart é e sempre será muito mais do que a caricatura de si mesmo que se tornou ao investir em um repertório de versões na série de quatro CDs "The Great American Songbook". Encontrou um novo nicho de mercado, mesmo que tenha aberto mão de fazer o que sempre soube, e da melhor maneira possível.

O cantor escocês chega aos 70 anos de idade neste mês de janeiro ainda com vitalidade, mas sem o menor resquício da genialidade e do vigor criativo dos anos 70 – ou até mesmo da bem-sucedida série de hits dançantes pop que engatou no final dos anos 70 e década de 80. Ainda assim, é um dos grandes mitos do rock.

De coveiro e aspirante a jogador de futebol e uma das estrelas principais do rock, Stewart mostrou que era possível cantar rock e blues de forma exagerada sem ser cafona – ao menos não nos anos 60. Dos primeiros singles fracassados gravados entre 1964 e 1966 até o estrelato dos anos 70, ele encarnou personas distintas, emulando alguma coisa de Otis Redding e Sam Cooke, com a postura de palco de Mick Jagger e a potência vocal de Roger Daltrey e Eric Burdon (The Animals).

rod-stewart-best-of-the-great-american-songbook

 

Times de craques

Não foi por outro motivo que nem deu chances a nenhum concorrente para a vaga de vocalista do então recém-formado Jeff Beck Group, em 1966. Em dois álbuns obrigatórios, "Truth" (1968) e "Beck-Ola" (1969), o narigudo escocês estabeleceu as bases do vocal roqueiro rasgado e versátil, passando do blues ao rock com uma simplicidade irritante. Pena que o amigo Beck logo virou ex-amigo quando começou a ter mais destaque nos shows.

"Ei, Beck, sua banda é excelente, grande som. E seu guitarrista até que toca bem", gritou um empresário para Stewart ao final de uma apresentação em Nova York. Furioso, Beck decidiu ali que seria o fim daquela formação (que tinha ainda Ron Wood no baixo e Mick Waller na bateria), fato que anunciou semanas depois em Londres, em meados de 1969.

Para a sorte dos amantes da boa música, eis que o fim da primeira encarnação da banda de Jeff Beck gerou o surgimento dos Faces, que surgiu no final de 1969 das sobras de outra banda icônica, os Small Faces. Rod  e Ron Wood, demitidos, perceberam que havia ótima possibilidade com a saída de Steve Marriott, vocalista e guitarrista dos Small Faces que deixava o grupo para criar o Humble Pie com Peter Frampton.

Ronnie Lane (baixo), Kenney Jones (bateria) e Ian McLagan (teclados), os remanescentes dos Small Faces, convidaram os amigos e vizinhos Wood e Stewart para uma jam session. Bastaram três ensaios para que um novo grupo, The Faces, surgisse, e começasse em seguida as gravações do primeiro álbum, "First Step", ainda sob o nome de Small Faces, no final daquele ano.

No contrato que assinaram com a EMI, deveriam lançar dois LPs por ano, um como Faces e outro como álbum solo de Rod Stewart. Surgiram assim clássicos e obras-primas como "Long Player", "A Nods as Good as Wink… to a Blind Horse" e "Oh La La", dos Faces, e "Every Picture Tells a Story", "An Old Raincoat Won't Ever Let You Down" (nos Estados Unidos, "The Rod Stewart Album"), "Gasoline Alley", "Smiler" e "Never a Dull Moment", de Stewart.

A carreira de Stewart logo deu um salto, e o narigudo escocês que pensou em jogar bola se tornou um astro do quilate de David Bowie, Freddie Mercury, Paul Rodgers e fazendo sombra a um certo Robert Plant. Claro que os agora cada vez menso amigos dos Faces sentiram ciúmes, especialmente o baixista Ronnie Lane, principal compositor.

Apesar do sucesso – rivalizavam em venda de ingressos para shows com Who, Rolling Stones e Led Zeppelin -, a química foi desaparecendo à medida que Wood e Stewart priorizavam suas carreiras solo – Ronnie Lane saíra oficialmente no comecinho de 1973 em carreira solo, substituído pelo japonês Tetsuo Yamauchi (ex-Free).

Em 1975 a banda praticamente não existia mais, a não ser para acompanhar o cantor em sua careira solo paralela. Stewart precisava de um motivo para daixar a banda sem magoar os amigos. E ele veio com o convite de Keith Richards para que Ron Wood substituísse Mick Taylor nos Roling Stones.

rod

Lá se foram os bons tempos

Há uma corrente de fãs e críticos que estabelecem o álbum "A Night on the Town", de 1976, como o fim da fase de ouro do cantor Rod Stewart. Outros são mais condescendentes e esticam essa fase para o álbum seguinte, "Footloose & Fancy Free" (1977). Nuncas mais ele conseguiu algo sequer parecido com os memoráveis "Gasoline Alley" (1970), "Every Picture Tells a Story" (1971), "Never a Dull Moment" (1972) e "Smiler" (1974), clássicos absolutos de sua discografia.

Esperto, decidiu jogar o jogo e aos poucos caiu de cabeça no pop, cada vez menos exigente e detalhista, e cada vez mais longe do blues rock que o consagrou. A popularidade explodiu, os hits radiofônicos se sucederam, mas junto com eles escorreram parte da criatividade e da credibilidade, com direito a acusação de plágio feita por Jorge Ben (hoje Jorge Benjor) – "Do Ya Think I'm Sexy?" em passagens idênticas ás da música "Taj Mahal".

Portanto, esqueçamos o crooner de churrascaria chique que gravou versões cafonas para clássicos antigos norte-americanos. Devemos comemorar os 70 anos de um dos maiores cantores do rock ouvindo "Maggie May", "Bad'n'Ruin", "(I Know) I'm Losing You", "Blues Deluxe", "I Ain't Supertitious", "Rock My Plymsoul", "Let Me Love You", "You Shook Me"…

 

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
Contato: contato@combaterock.com.br

Blog Combate Rock