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Robert Plant: entre a sombra do Led Zeppelin e a busca de uma identidade

Combate Rock

16/10/2014 06h41

Marcelo Moreira

Um músico em busca constante de uma identidade musical, ao mesmo tempo em que tenta se livrar de um passado opressor e que tenta equilibrar a relação de amor e ódio com o principal parceiro de sempre. A vida de Robert Plant, ex-vocalista do Led Zeppelin, não tem a dramaticidade da de Eric Clapton, ou a dinâmica e imprevisibilidade da de Keith Richards, a exuberância da de Mick Jagger, a insanidade de Ozzy Osbourne ou mesmo a complexidade intelectual/pessoal/sexual da de David Bowie ou Freddie Mercury. No entanto, consegue mostrar a dimensão exata de como é andar na estreita via entre o deus do rock e o fazendeiro bucólico e "normal".

"Robert Plant – Uma Vida", do jornalista inglês Paul Rees, lançado recentemente no Brasil pela Editora Leya (R$ 39,90), traça um retrato cru e direto sobre aquele que um dia se atreveu a assumir a postura do tal "deus do rock". Despida de penduricalhos que costumam exagerar trechos obscuros ou espalhafatosos da vida de astros, a obra se concentra em cima da personalidade conflituosa e contraditória de Plant, mas sobretudo mostrando com sucesso os dois lados da lenda – o o preocupado chefe de família e pacato fazendeiro no interior da Inglaterra, e a estrela máxima e hedonista do rock, obcecado por mulheres, mas também um profissional dedicado e considerado, na maioria das vezes, bacana e gente fina pelas equipes de apoio e assessores.

O texto de Paul Rees é eminentemente jornalístico e bastante documentado, com dezenas de entrevistas com músicos, produtores, amigos de infância, ex-namoradas e ex-empresários, entre outras fontes, além de duas longas entrevistas com o cantor. O resultado é um relato sereno e objetivo, os grandes méritos da obra, com trechos interpretativos longe de qualquer exagero – para decepção daqueles que se deliciaram com a decadência e dos sórdidos detalhes da vida "on the road" regada a sexo, drogas e rock'n roll narradas no livros "Hammer of the Gods" (a mais famosa obra sobre o Led Zeppelin) e "Led Zeppelin", de Mick Wall.

Se Plant desde criança almejava ser uma estrela, e desde sempre chamava a atenção por onde passasse na adolescência, atraindo as mulheres e a ira dos "concorrentes", por outro sempre teve incutida uma ética de trabalho precisa e inquestionável, chegando á beira da obsessão, como em relação ao seu conhecimento de blues – provavelmente ninguém chegava perto na região de Birmingham, cidade industrial da Inglaterra, onde nasceu (é natural do subúrbio de West Bromwich, mesmo local de nascimento de Paul Rees).

Com vida remediada, mas estável, na adolescência, aos poucos a música se tornou o seu objetivo – e o ponto de discórdia com os pais. Tranquilo, mas determinado, deixou sua casa e a escola aos 17 anos para perseguir o sonho da estrela de rock com inúmeras bandas locais, sendo que em duas delas ao lado do baterista John Bonham, um conhecido que se tornou amigo mais para frente e futuro companheiro de Led Zeppelin.

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Os amigos e colegas músicos o descreviam nesta época como uma pessoa agradável e leal, solidário e prestativo, mas ao mesmo tempo competitivo e determinado a conseguir se tornar um cantor importante. A trajetória até o estrelato foi marcada por penúria e decepções por quase três anos – e a coisa só piorou quando a namorada Maureen Wilson ficou grávida em 1967, quando Plant tinha 19 anos. "Se nada acontecer até os 20 anos, abandono tudo, volto para casa e arrumo um emprego."

E eis que surge um gordo suarento e intimidador chamado Peter Grant em meados de 1968 na vida do cantor. Empresário do então esfacelado Yardbirds, o empresário recebe a indicação e gosta do que viu no magrelo cantor louro de Birmingham e convence Jimmy Page a ir conferir. Estava formado o núcleo do Led Zeppelin – e a vida do moleque adorador do blues estava salva.

Paul Rees não alivia com Plant. Aponta suas idiossincrasias, põe o dedo nas feridas, em especial na questão do sexo compulsivo na estrada e nos problema de relacionamento dentro da equipe do Led por causa do uso excessivo de drogas – embora o cantor pegasse leve na comparação com Page e Bonham. E consegue estabelecer os pontos exatos das rachaduras internas que levaram ao colapso da banda antes da morte do baterista, em setembro de 1980.

De figura importante, mas quase subalterna no começo do Led Zeppelin, o vocalista se torna o ponto central em todos os sentidos na segunda metade dos anos 80 – musicalmente, administrativamente e estrategicamente, o que, obviamente, colidiu com a errática e esparsa liderança de Page, para surpresa e consternação deste.

A vida pó-Led de Robert Plant se tornou um dilema que perdurou por muitos anos. O fantasma da banda o perseguiu sempre, enquanto que a busca por uma identidade musical o levou a expandir seus horizontes musicais, ao mesmo tempo em que cometia barbeiragens, como o esquizofrênico álbum "Now and Zen", de 1988, recheado de influências de música eletrônica – e com canções fracas.

Não bastasse isso, o Robert Plant legal, pé no chão, aquele que bebia e se divertia nos pubs com amigos, volta e meia se transformava no tirano que enlouquecia a todos dentro dos estúdios, e que descartava bandas de apoio e músicos sem cerimônia, caso achasse que deveria mudar radicalmente de rumos musicais – nem mesmo o genro, o baixista Charlie Jones, casado com sua filha Carmen, foi poupado da devassa.

As idas e vindas no relacionamento com Page também mostram a desorientação profissional em certo período e o comportamento dúbio – ora não perdoava Page por uma série de fatos do passado, ora o elogiava e insinuava uma abertura para discutir uma volta do Led – algo que quase aconteceu em 1986, mas que foi abortada pelo cantor por conta de problemas antigos da banda ainda não resolvidos e pelo comportamento estranho do guitarrista à época.

E a relação de amor e ódio entre irmãos ficou evidente quando finalmente Plant concordou em um projeto com Page, a gravação de um "MTV Unplugged" em 1993, que resultou no Page-Plant em seguida, rendendo dois álbuns e um DVD. Em vez de aproximá-los, acabou por criando mais tensão. "Page uma vez me falou que Robert desprezava tanto o legado do Led Zeppelin por ressentimento, pois o guitarrista o havia ensinado a cantar, a se colocar em cena, no palco e a se tornar um astro de rock", comentou o fotógrafo Ross Halfin, amicíssimo de Page.

"Robert Plant – Uma Vida" faz parte da leva de biografias musicais do século XXI focadas na farta documentação e no jornalismo interpretativo, mas sem os excessos e o histrionismo sensacionalista dos anos 80. É bem-sucedido quando retrata o cantor sem firulas e ressalta tanto o personagem humano e despido da fantasia de rockstar quando o músico chato e perfeccionista, ciente do poder que emana e que detém, e que sempre usa para satisfazer suas necessídades profissionais-musicais. É uma das grandes biografias do rock na atualidade.

 

 

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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