Oportunista, David Gilmour 'mata' o Pink Floyd - que morreu há 20 anos
Marcelo Moreira
De uma forma estapafúrdia e sem sentido, o guitarrista David Gilmour decretou ontem o fim "oficial" do Pink Floyd após o lançamento do disco de retalhos que erroneamente a maioria dos veículos de comunicação chama de "novo" álbum da banda, "Endless River", que será lançado em breve. Ao lado do parceiro Nick Mason, um dos grandes bateristas do nosso tempo, concedeu uma entrevista onde diz que o próximo "trabalho" será o fim do gigante do rock progressivo.
Tudo o que envolve o Pink Floyd em 2014 é constrangedor, para não dizer vergonhoso. O guitarrista acabou com a banda após a turnê gigante de 1994, de suporte ao mediano álbum "The Division Bell". Na época, Gilmour dava todas as indicações de que a banda, que ainda contava com o tecladista Rick Wright (morto de câncer em 2008), não mais se reuniria para shows ou gravações. Em 1997, ele decidiu falar abertamente sobre a questão em uma entrevista à revista norte-americana Rolling Stone, onde declarou "duvidar de uma alguma atividade nova com o Pink Floyd".
Gilmour cumpriu a promessa e matou o Pink Floyd discretamente, de "de inanição", deixando a instituição esfarelar com o tempo. Em 2005 ele deu sinal de vida, quando anunciou que trabalhava em novo álbum, "On a Island", editado no ano seguinte, cuja turnê rendeu dois maravilhosos DVDs – "Live in Gdansk" e "Remember that Time". Pink Floyd? Devidamente ignorado e enterrado, com direito a mais uma declaração ao site da BBC de que "não via mais sentido em trabalhar com o nome Pink Floyd e que provavelmente não trabalharia mais com o nome da banda".
Portanto, David Gilmour não pode decretar o fim de uma coisa que na verdade acabou 20 anos atrás, por iniciativa do próprio. O guitarrista não pode matar o que já está morto e enterrado desde 1994. Essa desfaçatez é só mais uma ignomínia cometida pelos gerenciadores do "espólio" floydeano – em especial a culpa recai sobre Gilmour e Mason.
Apesar da pataquada de chamar o arremedo de retalhos "Endless River" de "novo álbum", muita gente não engoliu o fato de que não passa de uma reunião de sobras de estúdio que foram editadas e "completadas" de forma oportunista na tentativa de faturar mais alguns tostões antes do reconhecimento do falecimento do Pink Floyd – como se Mason, Gilmour e os herdeiros de Wright, todos milionários ou muito riscos, precisassem deste caça-níqueis.
Por mais que tentemos – e olha que muita gente boa no mundo está realmente tentando -, não dá para levar a sério um álbum "novo", mas com um conteúdo formado por sobras de estúdio que não serviram para serem incluídas em um álbum apenas mediano como "The Division Bell" (naquele ano de 1994, provavelmente foi um dos melhores do ano devido ao baixo nível da produção roqueira daquele ano e desde então; mas, se comparado com as obras-primas do Pink Floyd, é apenas mediano, para ser bastante generoso"). Se não serviram há 20 anos, por que esses retalhos serviriam agora?
"Loud Than Words", a primeira música a ser liberada para audição na internet, é mais do mesmo: sege a mesma cantilena das lamúrias e lamentos de "On a Island", o álbum solo de Gilmour de oito anos atrás (um bom trabalho, com boas ideias, mas irregular, de certa forma). A música guarda mais relação com este trabalho do que com "The Division Bell". Não é ruim – os integrantes do Pink Floyd parecem ser incapazes de fazer algo ruim -, mas definitivamente não é memorável. E sempre que se fala em Pink Floyd espera-se algo, no mínimo, memorável.
"Endless River" é uma iniciativa oportunista, desnecessária dentro de uma biografia riquíssima e gigantesca de um gigante do rock. E decretar a "morte oficial" de algo que morreu há 20 anos só agrava a sensação de engodo que envolve todo o "projeto".
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