Rock no Brasil peca pela originalidade, mas mostra muita qualidade
Marcelo Moreira
A eterna busca da originalidade é fonte de extrema angústia para músicos em todas as áreas, e algo que críticos e jornalistas cobram com veemência em um momento onde a música se tornou supérflua e que perde valor cultural constantemente. Como busca algo diferente em um segmento como o rock, onde aparentemente se tem a sensação de que se chegou a um teto, ou a um momento de saturação? Como estimular a criatividade na busca pelo inédito e pelo novo?
Desafio que se estende a todo o mundo – pelo menos aos músicos e a uma parcela dos consumidores que gostam de ser surpreendidos -, a procura por músicas diferentes e bandas inovadoras perdeu um pouco de fôlego nos últimos anos, no mesmo ritmo em que o mercado encolhe e os instrumentistas e cantores encontram menso lugares para tocar.
Cada vez mais bandas e artistas divulgando seus trabalhos, e cada vez menos tempo para ouvir tudo, para buscar coisas novas e muito menos lugares para ver e ouvir rock autoral. Será que realmente existe música que seja ao menos um pouco diferente na atualidade, que possa surpreender o ouvinte – para o bem ou para o mal?
O rock nacional, variando entre pop e rock, há coisas interessantes. Se não há originalidade, ao menos existe sopros bem-vindos de qualidade e um pouco de ousadia, como no caso da banda paulistana Fábrica de Animais, que seu som coalhado de blues, soul e rock ligeiramente pesado, com o ótimo vocal de Fernanda D'Umbra. O trio paulistano O Terno se destaca pela mistura de elementos do rock sessentista britânico, rock setentista brasileiro e MPB com competência, embora a originalidade não seja o forte do grupo.
Mergulhando na linha do rock psicodélico, bebendo também no rock setentista e no progressivo, há duas boas iniciativas, com criatividade em alta. Os goianos do Boogarins, com agenda cheia em shows no Brasil e no exterior, mostram garra e qualidade no recente Popload Gig, festival alternativo no final de novembro, em São Paulo. O quarteto faz um trabalho diferente, com qualidade e inteligência, buscando sonoridades pouco abordadas no Brasil.
Hard rock setentista alemão diretamente de Pernambuco, da melhor qualidade. A banda Anjo Gabriel não economiza na hora de explicitar as suas influências. E não está nem aí para as costumeiras críticas de "som datado", "estagnação no passado" e outras idiotices que costumam acompanhar quem opta pelo som vintage em pleno século XXI, fazendo música boa e repleta de referências. Mesmo que seja música instrumental, algo que nunca teve boa acolhida por aqui, a banda tem qualidade de sobra para conquistar os fãs roqueiros órfãos de música com qualidade e informação.
A banda Anjo Gabriel, além de apostar em algo próximo do que ficou convencionado de kraut rock – típico som pesado e progressivo característico de grupos alemães dos anos 70 -, faz músicas instrumentais e de longa duração, o que assanha ainda mais os críticos pobres de espírito e sem nenhuma cultura musical. É stoner rock, bem pesado e cadenciado, mas também é doom metal, com seu ritmo que lembra Black Sabbath em muitas partes. E é totalmente progressivo, nas melhores tradições inglesas, holandesas, alemãs, italianas e belgas.
No metal nacional, há bandas que também buscam inovar, ou ao menos fazer algo diferente do que a maioria. A mais recente é a Higher, de São Paulo, que juntou cinco músicos com larga experiência no jazz e na MPB instrumental para criar um metal diversificado, lotado de fraseados de guitarra inusitados, linhas de baixo sincopadas e virtuosas e desenhos de bateria com algumas viradas improváveis. Se a originalidade não é o forte, como na esmagadora maioria dos casos, louvemos a coragem e a audácia por conta das "invenções" em arranjos estranhos, mas eficientes.
O Daydream XI mostrou-se seguidor legítimo seguidor do Dream Theater, apostando no puro prog metal virtuoso e técnico. Com certo sucesso, a banda tenta romper alguns limites e criar suítes com diversos elementos de rock progressivo, música erudita e até jazz.
Na mesma pegada, O Maestrick, de São José do Rio Preto, também segue na linha do prog metal, embora cada vez mais prog, folk e world, por assim dizer, com a fusão do metal com elementos de música brasileira de forma inusitada diferente, indo além do Angra, que surpreende com o o ótimo "Holy Land", em 1996.
Ressurgindo depois de mais de uma década de silêncio, a banda brasiliense Dark Avenger também surpreendeu com um ótimo álbum, "Tales of Avalon – The Lament", a segunda parte de um trabalho bastante interessante iniciado em 2000. O álbum de 2013 ficou entre os três melhores do ano lançados no Brasil, de acordo com o Combate Rock, e mostrou ao mais do que um trabalho conceitual.
O que muitos enxergaram como excesso em relação aos arranjos grandiosos e muito elaborados, outros viram um trabalho meticuloso de busca incansável de timbres de guitarra, teclados e de orquestra, sempre de acordo com o tema proposto e casando de forma magistral com as letras e linhas vocais de Mário Linhares. Um trabalho primoroso e elogiável, ainda que remeta a produções levemente similares feitas na Europa, mas com bom gosto e competência poucas vezes vistas no Brasil.
Para finalizar, a porrada extrema do metal cantando em português, com três expoentes do gênero: Confronto, Project46 e Paura cospem fogo em uma mistura de thrash metal, death metal, hardcore e muita violência sonora, despejando fúria com competência e qualidade. A originalidade não é algo que possa ser identificada nos trabalhos mais recentes destas bandas, mas o peso e a pancadaria sonora criada remete aos grandes momentos do Ratos de Porão e outros mestres do crossover nacional. Violência sonora extrema, e em português, tem sido coisa rara por aqui.
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