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O pop rock no buraco: crônicas de um palco que desabou há muito tempo

Combate Rock

19/02/2014 06h12

Marcelo Moreira

O melhor analista do pop rock nacional decidiu que pretende ser um dos principais cronistas do segmento. Se em "Dias de Luta" o jornalista paulista Ricardo Alexandre dissecou a gênese, o auge e o declínio do rock brasileiro dos anos 80, em um ótimo de trabalho de pesquisa e análise que durou dez anos, no recém-lançado "Cheguei Bem a Tempo de Ver o Palco Desabar" ele mostra versatilidade, ao misturar análise, relatos factuais e crônicas sobre o mesmo pop rock nacional, mas embalado em uma narrativa que esbarra na ficção, com um resultado bastante satisfatório.

A ideia não era transformar a nova obra em continuação de "Dias de Luta", mas resgatar lembranças e momentos importantes vividos pelo autor como jornalista e músico entre os anos de 1993 e 2008. Para descaracterizar a ideia de continuidade, veio da decisão ousada, criativa e acertada de modificar a forma narrativa, permeando os fatos com a trajetória de um garoto do interior que realiza o sonho de viver da música – mesmo que seja escrevendo e dirigindo documentários, e não tocando.

As memórias não dão um toque de autobiografia, mas sim de um romance despojado e até despretensioso, com a vida do garoto do interior permeando as 50 historias que são narradas em um texto leve, dinâmico e bem construído. "Lutei para que não houvesse uma continuidade, por isso achei que dava mudar o projeto. E as pessoas se identificaram com o tom pessoal e quase romântico do livro, ao menos por enquanto", explica Alexandre.

O trabalho surgiu na internet, com o autor escrevendo periodicamente os capítulos e postando-os em um blog. Bem no começo Alexandre decidiu que era o caso de transformar em livro, mas físico, e não digital. "O apelo do livro físico ainda é muito forte, ainda que os e-books estejam crescendo e se disseminando. A reedição de 'Dias de Luta' em 2013 mostrou que o papel, ao menos na literatura, ainda tem demanda. Não tinha como o novo livro não ser editado em forma física", diz o autor orgulhoso pela repercussão.

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Tudo bem que os primeiros elogios partiram de jornalistas e músicos, que não apenas são amigos, mas também personagens. Preocupação com melindres ou mágoas que possa surgir? "Deixo claro no livro que, antes de ser uma análise, é um relato pessoal de experiências que vivi ao longo de 15 anos, e que permite contestações de quem possa ter vivido ou participado dos mesmos fatos, com experiências diferentes. Por isso acho que o tom ficcional que adotei é o adequado para narrar passagens interessantes."

O título faz uma alusão a fato verídico presenciado pelo autor, mas também é uma metáfora com a perda de espaço, importância e de relevância do pop rock nacional a partir dos anos 90, em consonância com o declínio das grandes gravadoras, cada vez mais imediatistas, e com a ascensão de gêneros mais populares recheados de artistas e hits descartáveis.

"Os anos 90 tiveram um momento de grande beleza, talvez entre 1993 e 1996, no Brasil, com Raimundos lançando discos bons, Chico Science estourando… Essa geração teve um desvio de rota abrupto", contextualiza Alexandre. "A euforia comercial do bom momento foi prejudicial para o ecossistema como um todo – e não só porque o Chico Science morreu em 1997. Houve muita pressão para que qualquer coisa lançada vendesse muito, 1 milhão de discos, e esse imediatismo acabou coincidindo com o começo do fim das lojas de CDs, com a própria indústria se esfarelando e precipitando a ruína de tudo."

O palco que desabou é uma das histórias mais saborosas do livro. Ocorreu durante o 2º Juntatribo, festival de rock alternativo realizado em 1994 na cidade de Campinas. "Eu, um jovem jornalista empolgado por estar fazendo coberturas de shows, corri para o festival e cheguei a tempo de ver a banda curitibana Resist Control segundo antes do palco cair, já que tinha mais gente no palco do que na plateia. Acho que serve como uma boa alegoria para o que viria depois."

 

Clique aqui para ouvir o programa Combate Rock sobre o rock nacional dos anos 90 e sobre o livro, com entrevista com o autor Ricardo Alexandre:

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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