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Longe do Ira!, Gaspa lança CD sem a menor preocupação

Combate Rock

31/12/2013 06h30

Marcelo Moreira

Se a discrição é a marca oficial dos baixistas, em qualquer gênero musical, então Ricardo Gaspa é a sua principal encarnação no rock brasileiro. Nos 27 anos que participou do Ira!, pouco se ouviu da boca do músico, e nada de seu comportamento – bom ou ruim –  transbordou para as páginas das revistas e internet. Nem mesmo o abalo que causou o reencontro entre Edgard Scandurra (guitarra) e Nasi (vocalista) após seis anos , os pilares do quarteto paulistano, foi suficiente para provocar alguma manifestação.

Com o fim do Ira!, em 2007, Gaspa optou por se distanciar da briga escandalosa que a separação causou, incluindo disputas judiciais e tentativa de agressões, além das costumeiras farpas pela imprensa. Deixou Scandurra e Nasi se digladiarem pela imprensa e afastou-se dos dois. Foi cuidar da vida e finalmente resolveu reaparecer no meio artístico com "The Bass Player", seu primeiro álbum solo, lançado em 2013.

Simples, despojado, direto e descontraído, é o álbum é o oposto do que pode sugerir o título arrogante – "O Baixista", em português. Ignorando os rumores de uma possível volta do Ira! sem ele e o baterista André Jung – retratados de forma não muito lisonjeira no livro "A Ira de Nasi", a biografia do vocalista – entrou no Cakewalking, estúdio da zona sul de São Paulo, e fez o álbum que sempre sonhou em fazer: cercado de amigos, de um ótimo produtor – Edu Gomes, da Irmandade do Blues e do Adriano Grineberg Quartet – e sem muita pressa. Acertou em cheio, já que o álbum, longe de inovador, é bem agradável e bastante reverente ao passado.

O músico optou por uma sonoridade predominantemente acústica, dando ar vintage à gravação, mesmo nos temas que remetem ao pop rock. Deixa fluir sua paixão pelo rockabilly e por sonoridades sessentistas, com certa preocupação com os detalhes dos arranjos. o que torna o conjunto um trabalho de bom gosto. Oito das dez músicas tem a assinatura de Gaspa, só ou em companhia de amigos de longa data. "Tarde Vazia", "Mistério", "Tanto quanto eu", "Ciganos", "O tolo dos tolos" e "Tudo de mim" são de sua ex-banda, o que pode soar um pouco oportunista. As novas versões, com arranjos mais delicados e sem os excessos do rock oitentista nacional, deram uma cara mais leve e sossegada às músicas.

Entre as inéditas, a curiosa e bem-humorada "Outubro de 65" é o destaque, uma canção de Marcelo Nova (ex-Camisa de Vênus), que também canta. embora o começo lembre demais o Camisa, ao longo da faixa o DNA do Ira! aparece, assim como os sintomas do rockabilly.  "Eu não consigo ser alegre o tempo inteiro", de Wander Wildner, com o próprio no vocal, não tem a mesma espontaneidade, mas acaba mostrando a versatilidade de Gaspa na escolha do repertório. As outras inéditas são "Sobre o outono" e "Rosa dos ventos", parcerias com Ricardo Cunha, que não são ruins, mas destoam um pouco do restante do álbum, seja pela simplicidade extrema ou mesmo por falta de inspiração. Participam ainda do álbum a cantora Karol Sun cantando "Tardes Vazias", do Ira!, e o ótimo cantor Ricardo Alpendre, da banda paulistana Tomada.

O baixista teve também o bom senso de escolher Edu Gomes para a produção. O guitarrista da Irmandade do Blues é reconhecido como um facilitador, aquele que ajuda em tudo na confecção e gravação de músicas. Se a sonoridade é homogênea e sem grandes novidades ou ousadias, por outro lado é perfeita para o clima sóbrio e simples desejado por Ricardo Gaspa. Que a despreocupação tranquila do baixista evolua para um trabalho mais autoral e menos focado no passado. "The Bass Player" mostra que o artista passou no teste solo, mas demonstra que as possibilidades artísticas são bem maiores no futuro, desde que com menos "despreocupação".

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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