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O dia em que o Kiss mascarado ofuscou Senna e Piquet em Interlagos

Combate Rock

13/05/2020 07h00

Marcelo Moreira

Gene Simmons, do Kiss, no Monsters of Rock (Foto: Divulgação Midiorama/Francisco Cepeda e Joshua Bryan /AGNews)

É longe, é ruim de chegar, é ruim de ver o show e é muito pior sair de lá. Quem teve a ideia de levar shows de rock para o o autódromo de Interlagos, hoje casa de festivais como o Lollapalooza?

Completando 80 anos de criação, assim como o estádio do Pacaembu, o autódromo sempre foi um lugar inóspito, exceto para os amantes da velocidade.

Sede das maioria das corridas de Fórmula 1 no Brasil, é a disneylândia pra gente como Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet, Felipe Massa, Rubens Barrichello e toda uma comunidade de stock car, Fórmula Ford e kart. Para essa galera, a pista de corrida é logo ali.

Se não me falha a memória, quem começou a levar a sério o subutilizado autódromo para outros tipos de eventos foram os promotores da terceira passagem do Kiss pelo Brasil, em 1999, trazendo a reboque os então pouco conhecidos alemães do Rammstein. Foi o primeiro evento musical de peso a ser realizado lá naquele fim de mundo.

"Justamente ser longe e subutilizado, o valor aluguel foi mais baixo e abriu os olhos da Prefeitura de São paulo para um potencial novo a ser explorado e amenizar os gastos com o autódromo", afirmou um importante empresário de shows do Brasil e que trabalhou na produção do Kiss em 1999 – por uma série de questões pessoais, pediu para nao ser identificado.

Foi um teste importante. O autódromo fica encravado em um bairro populoso e estreito da zona sul de São Paulo, a mais de um quilômetro da estação de trem mais próxima da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). São poucas as linhas de ônibus que atendem a demanda alta em dias de eventos que lotam, e a quantidade de estacionamentos na região é pequena.

Para o show do Kiss, escolheram montar o palco no fundo de um vale, em uma das extremidades do local. Quem não quis ir para a "muvuca" da pista larga à frente do palco teve de se contentar com o morro meio enlameado por conta da garoa forte do dia anterior e da chuvinha chata do dia do show.

Houve tumulto e uma série de problemas na chegada ao bairro e na entrada única (um absurdo) para o local do palco. Ok, a cerveja ajudou a passar as mais de três horas necessárias para finalmente entrar no autódromo.

Lá dentro, a estrutura de banheiros, posto médico e alimentação era precária, mas a irritação logo se dissipou diante da perspectiva de vermos o Kiss de volta com as máscaras que os caracterizaram dentro da turnê "Psycho Circus". Foi a primeira, e última, vez que a formação original e clássica tocou no Brasil, e todos mascarados.

Do alto do morro, era um pouco difícil escutar com clareza as músicas por causa dos fortes ventos. O Rammstein sofreu demais por conta disso, mas fez um show diferente e tecnológico, todo cantado em alemão, o que provocou muita estranheza na grande maioria do público, que desconhecia a banda.

Parecia combinado: a garoa cessou e o vento sumiu quando o Kiss subiu ao palco para quase uma hora e 50 minutos desfilando clássicos e novas músicas. De repente, tudo parecia estar perfeito e o rock reinou, mesmo com pequenas falhas nas guitarras de Ace Frehley e no microfone de Paul Stanley.

Foi um dos grandes eventos do nosso tempo e uma grande descoberta para um novo local de shows. Nem mesmo a enervante saída do local e o congestionamento monstro na madrugada para deixar Interlagos e atingir a Marginal do Rio Pinheiros ou a avenida Washington Luís ofuscou as lembranças do grande show.

Essas mesmas dificuldades foram ignoradas nos anos seguintes, já que a pista de corrida sediou uma série de eventos nos anos seguintes, como raves e o Lollapalooza.

A estrutura interna foi aperfeiçoada, e a malha viária do entorno modificada para permitir mais estacionamentos e bolsões para quem vai de carro.

Voltei algumas vezes para shows ao local e nunca fiquei empolgado ao saber que o evento seria lá. Mas está lá, no calendário paulistano de eventos e requisitado para shows diversos. As pessoas se acostumaram.

Em breve a prefeitura soltará novo edital para privatizar o autódromo. As chances de que haja melhorias e aperfeiçoamento para que se torne um grande local de eventos multiuso é grande, com a esperada correspondência em termos de valorização dos preços – seja do aluguel, seja dos ingressos.

Para quem não esperava nada e nunca mais voltar para shows ao local, é uma surpresa e tanto observar como se tornou popular. Interlagos se tornou importante para o rock e para a música pop no Brasil. E, por algum tempo, deixou o Kiss reinar sobre as lendas Senna, Fittipaldi, Piquet, José Carlos Pace (que nomeia o autódromo).

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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