Topo

Censura e a normalização do autoritarismo

Combate Rock

22/08/2019 06h58

Marcelo Moreira

Reprodução da capa da edição brasileira do livro "liberdade de Expressão: Dez Princípios para Um Mundo Interligado", de Timothy Garton Ash

A censura está em vigor no Brasil e tem origem no Palácio do Planalto. E parece não bastar que o próprio secretário de Cultura do Ministério da Cidadania, Henrique Pires, demissionário, ser o autor da mais contundente denúncia: a repercussão é absurdamente insossa. As pessoas estão achando normal.

A intervenção direta na Ancine, a agência reguladora do cinema, ainda não aconteceu, mas vai acontecer, a julgar pelo cancelamento de editais de séries com temas LGBT promovidos pela secretaria.

Após o governo publicar no Diário Oficial desta quarta-feira (21) uma portaria cancelando o processo de seleção de séries com temática LGBT pré-selecionadas para um edital para TVs públicas, o secretário pediu para deixar o cargo.

Pires estava a frente da Secretaria desde o início do governo de Jair Bolsonaro. "Eu tenho o maior respeito pelo presidente da República, tenho o maior respeito pelo ministro, mas eu não vou chancelar a censura", disse o secretário ao G1.

E a acusação de censura foi direcionada diretamente ao presidente Jair Bolsonaro (PSL), um político da pior espécie empenhado em fazer o país passar vergonha mundial e em destruir qualquer política decente de meio ambiente, para não falar da depredação institucional do Estado.

Artistas que votaram e apoiaram a excrescência estão apavorados com os rumos que o país está tomando, pincipalmente na área de cultura e artes. São muitos os arrependidos que temem ser vítimas da censura que ajudaram a fomentar.

A Ancine está na mira e será aparelhada para impor a visão medieval de um governo racista, fundamentalista evangélico e inimigo do conhecimento.

Em qualquer país civilizado o governo seria destituído ou haveria tamanha repercussão nma sociedade que tudo pararia. Os protestos atuais em Hong Kong .contra medidas repressivas seriam nada perto do que deveria estar ocorrendo no Brasil.

E o que vemos? Uma perigosa e dramática normalização do absurdo. Poucos parecem estar se importando com a volta da censura oficial/governamental sobre nossas cabeças. A coisa é tão séria que funcionários graduados do próprio governo abandonam o barco diante da sanha autoritária diante uma gestão estapafúrdia e lamentável.

Não bastam apenas manifestações bimestrais a favor da educação promovidas por entidades e sindicatos de esquerda.

É preciso que a sociedade como um todo encampe a luta contra as trevas e emparede um presidente tacanha e incompetente, cuja única missão é destruir os fundamentos de uma sociedade civilizada.

A esquerda inteligente está horrorizada, enquanto a direita digna de algum respeito se cala. Já os céticos e isentões, que fazem parte da massa ignorante que ajudou a eleger tal governo, fazem troça e relativizam mais esse ataque à liberdade de expressão. Tratam do caso como se fosse mais uma tiada folclórica de um personbagem caricato saído e um programa humorístico ruim de televisão.

Não se enganem vocês, roqueiros conservadores que detestam o PT, qualquer coisa relacionada aos direitos humanos ou ao mundo LGBT: primeiro serão os editais municipais e estaduais de icnentivo à cultura e festivais de música que vão restringir o espectro de "temas" a serem admitidos.

Em seguida, haverá uma intensificação nas "intervenções" policiais e agentes repressivos do Estado contra shows e eventos considerados "fora da conformidade" diante do pensamento esdrúxulo expelido por esse governo inacreditável.

Não vai demorar muito para que surjam pressões econômicas, políticas e religiosas para banir bandas de rock, nacionais ou estrangeiras, que atentem contra a "moral, a família e os bons costumes" – ouvi alguém dizer que bandas como Slayer e Behemoth poderão ter shows cancelados por aqui, doiante desse quadro tenebroso?

O que será que músicos de black metal que tiveram a coragem e a falta de discernimento de apoiar esse governo terão a dizer quando suas obras encharcadas de blasfêmia forem banidas, assim como seus shows?

O que será que artistas que fizeram obras denunciado a devastação da Amazônia e defendendo o meio ambiente falarão a respeito das medidas de desmonte da área, favorecendo o pior agronegócio que existe, o predatório – aquele que destrói e canibaliza?

O secretário de Cultura do Ministério da Cidadania – na prática o ministro da área – pede demissão e acusa diretamente o presidente da República de censura e interferência, mas o mundo não caiu.

A maioria está encarando apenas como mais uma pataquada de um governante hilário e sem credibilidade. É mais um episódio de normalização do autoritarismo e do absurdo.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
Contato: contato@combaterock.com.br

Blog Combate Rock