Titãs e Ira! caem no folk, uma alternativa interessante e necessária
Marcelo Moreira
Reinvenção não significa inovação e não necessariamente envolve criatividade ou inventividade. Entretanto, nem sempre é algo negativo ou desprovido de qualidade.
Dois anos atrás, o Ira! decidiu repaginar seu repertório com uma nova modalidade de "acústico". O espetáculo Ira! Folk trouxe os clássicos do grupo de uma forma diferente: a abordagem era semiacústica, mas desprovida dos excessos de arranjos do clássico "MTV Unplugged" e com andamento mais lento, com arranjos bem diferentes. Ficou muito bom.
Agora é a vez dos Titãs, que realizaram alguns shows no formato trio – os fundadores remanescentes Tony Bellotto (guitarra), Branco Mello (guitarra, voz e baixo) e Sergio Brito (voz e teclados). Beto Lee (guitarra) e Mário Fabre (bateria) aparecem como "convidados".
Depois do interessante trabalho "12 Flores Amarelas", uma ópera-rock, os Titãs surpreendem ao retornar ao estilo "acústico", mas com algo bem mais próximo ao modelo "folk" apresentado pelo Ira!, ou seja, arranjos despojados e uma pegada mais leve, quase MPB em alguns momentos. Surpreendente e bem interessante.
Será que essa é a tendência que vai prevalecer entre os veteranos do rock nacional? Será que poderemos esperar Paralamas do Sucesso ou Frejat no estilo folk?
É muito cedo para apedrejar esses artistas que procuram a reinvenção sem que realmente criem algo novo. O que o Ira! fez foi bem diferente do usual, com bom resultado, assim como o Titãs, que recuperaram o acústico mas nem tanto assim.
Falta de criatividade, comodismo ou mero oportunismo? É muito fácil apontar o dedo para quem quer que seja quando falamos de um mercado fonográfico depredado e falido, em que muitos consumidores simplesmente se recusam a "consumir", preferindo obter música de graça ou pagar quase nada para ter acesso a aplicativos de streaming.
Vale a pena investir e criar música nova autoral, que certamente passará despercebida e será descartada quase que imediatamente? A imensa maioria dosa artistas diz que sim, que é o que faz um artista se sentir vivo e produtivo. Na prática, no entanto, a coisa é bem diferente.
Há os que falam abertamente sobre a questão. "Não faz mais sentido lançar CD novo com músicas novas, as pessoas não querem mais saber", comentou Mick Jagger em uma entrevista para a revista Rolling Stone em 2013.
O último CD de inéditas dos Rolling Stones, "A Bigger Bang", de boa qualidade, mas longe do brilhantismo do auge da carreira do quarteto, foi lançado em 2005. O mais recente, de 2016, é "Blue and Lonesme", uma coleção de versões para clássicos do boues norte-americano.
O formato folk é uma boa sacada, e casa bem com bandas versáteis, que têm catálogo extenso, variado e consistente. Dependendo do caso, podem soar completamente diferentes reciclando o mesmo repertório, mas de forma mais amena.
É o que sobrou para bandas veteranas, mas preguiçosas, como dirão alguns? Talvez sim, mas ainda bem que existe essa alternativa. Não é o ideal, óbvio, mas é o que o público parece disposto a aceitar e pagar (ao menos em parte).
É o que temos para o momento, embora queiramos bem mais de alguns de nossos artistas favoritos. E nem dá para que exigir muito ou condenar os Titãs por conta do novo espetáculo. Afinal, faz menos de dois anos que a banda lançou o ambicioso e interessante "12 Flores Amarelas", provavelmente o melhor trabalho autoral de rock nacional dos últimos anos.
No caso do Ira!, se a solução caiu bem e se tornou um sucesso, por outro lado coloca a banda em um dilema: até quando esse formato vai durar? Qual será o próximo coelho a ser sacado da cartola?
Aparentemente, Edgard Scandurra (guitarra e vocais) e Nasi (vocais), a dupla que comanda o Ira!, não tem pressa de elaborar um novo trabalho de inéditas. Já são praticamente cinco anos desde a volta da banda após uma separação dolorida.
Desde o começo a ideia era reativar o Ira! sem aquele compromisso de tornar a banda o que era antes da separação. Haveria o Ira! convivendo com os múltiplos trabalhos paralelos de Scandurra e a carreira solo bem-sucedida de Nasi. Portanto, eles avisaram desde o começo que teríamos o Ira! ao vivo de vez em quando, mas sem a obrigatoriedade de tê-la em tempo integral.
Entretanto, o dilema permanece: depois do formato folk, o que poderemos esperar? Essa não é uma precupação imediata dos músicos, que certamente ainda apostam fichas neste tipo de reciclagem.
O fato é que o estilo folk foi um achado para artistas veteranos com catálogos respeitáveis, algo que certamente cairia bem para gente como Paralamas, Frejat e Lobão, que possuem músicas perfeitamente adaptáveis ao estilo.
Se o acústico revigorou nos anos 90 várias carreiras e se tornou o trabalho mais vendido de muitas bandas dos anos 80, o folk se mostra uma alternativa bem viável para fazer o mesmo, embora não na mesma intensidade.
Se há algum oportunismo, ele surge como uma necessidade de mercado, uma alternativa para manter a relevância de artistas que ainda se mostram ativos e criativos. E só bandas boas e artistas talentosos têm capacidade para transformar seus repertórios e virá-los de tal forma que as músicas os ares sem que soem como meros produtos requentados.
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