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Há 50 anos morria Brian Jones, o criador dos Rolling Stones

Combate Rock

03/07/2019 06h15

Marcelo Moreira

O guitarrista inglês Brian Jones conseguiu uma rara unanimidade no rock, em especial no tempo em que ficou vivo: conseguiu desagradar a todos que conviveram com ele.

Óbvio que ele não pode mais se defender, mas são abundantes as declarações e petardos disparados contra ele, de ex-mulheres a ex-companheiros dos Rolling Stones, de ex-funcionários a empresários e até amigos que um dia foram mais chegados.

Em todas as biografias da banda ou livros sobre fatos específicos da carreira do grupo as referências ao músico, sobretudo no período entre 1966 e 1969, não são nada lisonjeiras. É raro achar alguém que fale bem do cara.

No momento em que os 50 anos de sua morte são lembrados – sua morte ocorreu em 3 de julho de 1969 -, não só o seu desaparecimento ainda está envolto em mistério, mas sim boa parte de sua breve vida.

Não há dúvidas de que foi um dos grandes pilares dos Rolling Stones, mas também é fato de que sua saída foi um bálsamo para que a locomotiva continuasse e se tornasse a maior de todas as bandas de rock.

Musicalmente, entretanto, Jones foi extraordinário dentro do rock e reconhecido como um de seus primeiros visionários.

Apaixonado por blues e exímio instrumentista, tinha o defeito de não saber (ou não querer) compor, o que o limitava como artista – e que acabou determinando o futuro dos Rolling Stones, que ajudou a criar, mas que saiu de seu controle  quando Mick Jagger e Keith Richards se tornaram bons compositores e assumiram a linha de frente.

Para muita gente Jones se tornou o verdadeiro primeiro rock star da história, pelo menos da forma como conhecemos atualmente,em relação ao comportamento.

Excêntrico, irritadiço e totalmente dependente de drogas diversas, fazia questão de demonstrar sempre que podia o seu talento, um traço impressionante de sua personalidade insegura e paranoica.

Brian Jones na capa de um dos mais famosos LPs piratas dos Rolling Stones nos anos 70 (FOTO: REPRODUÇÃO)

Brian Jones na capa de um dos mais famosos LPs piratas dos Rolling Stones nos anos 70 (FOTO: REPRODUÇÃO)

Entretanto, da mesma forma que se destacava como uma estrela perdida – e mais tarde cadente -, cativava amigos e fãs por conta de um charme espantoso e uma aura de intelectualidade e jovialidade, temperado com rebeldia, que caracterizou  rock britânico dos anos 60 bem no meio da beatlemania.

Guitarrista elogiado, com um ouvido absoluto, – conseguia em pouco tempo tirar qualquer música e aprender qualquer instrumento de cordas – Lewis Brian Hopkins Jones é muito mais lembrado por seu comportamento errático e insano, além do consumo industrial de drogas.

É consenso que ele perdeu a mão por causa do abuso de drogas, mas não só por isso.  Inseguro por natureza e incapaz de aceitar a derrota (ou que alguém o superasse), foi aos poucos se desligando da realidade e se afastando da banda, até porque não compunha.

Teimoso e pouco colaborativo, insistia em manter a fidelidade ao blues puro e "sem contaminação", que já o colocou em rota de colisão com os demais Stones ainda em 1965.

Competitivo, mas sem grandes argumentos ou outros instrumentos que lhe permitissem encarar de igual para igual Jagger e Richards, logo caiu em depressão e não conseguiu reagir. Perdeu a liderança e o controle da banda – e a namorada para Keith Richards – e se afundou ainda mais nas drogas.

A partir de 1966 sua presença nos estúdios era cada vez mais rara – e, para sua grande frustração, sua ausência era cada vez menos notada, com as guitarras assumidas integramente por Richards.

Nos álbuns "Between the Bottons" (1967) e "Their Satanic Majesties Request" (1967), assim como os singles daquele ano, Jones pouco acrescentou ao som dos Stones, coisa que piorou no ano seguinte, em "Beggar's Banquet", quando apenas duas faixas tinham algum instrumento tocado por ele.

Prestes a ser limado da banda, Jones era incapaz de perceber que estava perdendo rapidamente a credibilidade no meio artístico.

Com quase todo mundo familiarizado com os problemas dos Rolling Stones e com a fama e o comportamento errático do guitarrista, Brian já era tratado como caso perdido por quase todos, incluindo o amigo e junkie de carteirinha Jimi Hendrix. Seria Brian Jones um dos maiores desperdícios do rock?

Uma alma penada em vida

Brian Jones se considerava o verdadeiro criador dos Rolling Stones, mas na verdade ele foi procurado pela dupla Mick Jagger e Keith Richards no começo de 1962 para formar uma banda.

Como já era experiente e tocava na noite de Londres, conhecia muita gente e logo tomou conta do "empreendimento", autoproclamando-se líder e empresário, pois arrumou um lugar para ensaios e outros músicos para iniciar os trabalhos.

Também foi de Jones a ideia de nomeá-los como Rolling Stones, nome que foi detestado pela banda, em meio ao desespero no momento de agendar o primeiro show, no Marquee Club, em 12 de junho de 1962, substituindo a Blues Incorporated, de Alexis Korner.

Não bastasse tudo isso, foi o maior entusiasta da assinatura de contrato com Andrew Loog Oldham, um moleque de apenas 19 anos, mas com a "experiência" de ex-assistente de Brian Epstein, dos Beatles, no currículo. Oldham foi o primeiro empresário e o mentor da frase "Você deixaria sua filha se casar com um Rolling Stone?"

Ironicamente, foi Oldham que deu o primeiro empurrão para o início da autodestruição do paranoico, ególatra e narcisístico Jones ao trancar Jagger e Richards na cozinha de sua casa no começo de 1965.

O aviso foi claro: os dois só sairiam de lá quando compusessem uma música. A ideia era não depender mais da ajuda de amigos (como os Beatles, que cederam "I Wanna Be Your Man") e e dversões do blues americanos. Demorou horas na madrugada, mas a dupla fez uma música, e a partir daí embalou a perpetrar sucessos atrás de sucesso.

Os Stones em 1965: Joes é o primeiro da esq. para a dir. (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Os Stones em 1965: Jones é o primeiro da esq. para a dir. (FOTO: DIVULGAÇÃO) 

Como não compunha, Jones ficou para trás. Quando percebeu, tinha perdido a liderança para Jagger e Richards, especialmente no final do ano, com o estouro de "(I Can't Get No) Satisfaction", hit gigantesco até hoje.

O guitarrista problemático e irascível já demonstrava um desequilíbrio e fragilidade emocionais preocupantes, agravados pelo tempestuoso relacionamento com Anita Pallenberg, a modelo alemã que o trocou por Ricghards, e com as constantes visitas de oficiais de Justiça e moças pedindo o reconhecimento de paternidade de seus filhos (oficialmente, foram seis filhos ilegítimos nascidos entre 1963 e 1969).

Segundo o escritor Simon Wells em "Encurralados: Os Stones no Banco dos Reús", aos 17 anos Brian Jones já era pai de dois filhos que ele não reconheceu. Até a sua morte, em 1969, teria outros quatro. Pelo menos três das crianças teriam sido encaminhadas para a adoção em Londres e Cheltenham.

O guitarrista mergulhou na decadência física e artística em 1966, mergulhando de cabeça nas drogas e no álcool – que já usava em doses bastante altas desde 1963.

Embora fosse um prodígio nos instrumentos – era capaz de aprender um instrumento novo em horas, como no caso da cítara – não compunha, o que o relegou ao segundo plano nos Stones. Lentamente foi se desinteressando pelo trabalho no estúdio, com suas partes sendo tocadas por Richards. No palco, mostrava desinteresse ainda maior.

Nos álbuns "Between the Buttons" e "Their Satanic Majesties Request", gravados e lançados entre 1966 e 1967, sua contribuição foi pequena, participando de poucas músicas, piorando ainda mais no clássico "Beggar's Banquet", lançado em 1968, coincidindo com Anita Pallenberg o trocando por Richards após uma viagem à França e ao Marrocos ocorrida no finalzinho do ano anterior.

Mergulho fatal

O ressentimento e a paranoia aumentaram muito, assim como o consumo de drogas. Jones praticamente desapareceu dos estúdios e teve problemas com a polícia por conta de posse de "substâncias ilícitas".

Por um momento passou a odiar Jagger, a quem culpava por todos os seus males – o maior deles, o de "roubar a minha banda". Culpava também Richards por seu isolamento na banda e pelo fosso artístico-criativo em que estava mergulhado.

Jones foi levando a situação em estado catártico até o primeiro semestre de 1969, quando se recusava cumprir compromissos com a banda e a gravar novas músicas desde final do ano anterior.

Na época os Stones estavam tocando pouco ao vivo, mas voltariam às turnês no final do ano nos Estados Unidos. Richards adiou o quanto pôde, mas teve de ceder à ira de Jagger: Brian estava fora da banda e não havia mais como mantê-lo.

A decisão foi tomada em abril, quando Mick Taylor, geniozinho da guitarra da banda de John Mayall, foi convidado a gravar partes do álbum que viria ser "Let It Bleed" (lançado em dezembro de 1969), para pouco depois ser efetivado.

Apesar de tudo isso, Jagger e Richards só tomaram coragem de ir ao apartamento de Jones no começo de junho para oficialmente dispensá-lo. Surpreendentemente, o demitido recebeu a notícia de forma serena e resignada, ao menos na aparência.

Dilacerado emocionalmente, passou a consumir toneladas de drogas para aplacar a depressão e a sensação de fracasso, que culminariam na sua morte um mês depois, em 3 de julho de 1969, afogado na piscina de sua casa.

É fato que ele estava entupido de drogas e completamente bêbado, mas até hoje persistem versões de que teria sido assassinado por um pedreiro que fazia uma obra no imóvel. Outras versões dão conta de que Jagger teria mandado matá-lo – ou feito com as próprias mãos. As sandices são muitas neste caso.

Dois dias depois, os Stones fizeram o célebre concerto do Hyde Park, em Londres, com abertura do King Crimson e do Blind Faith. O que era para ser a apresentação oficial de Taylor tornou-se um show em memória de Brian Jones, embora Jagger e Richards não tenham comparecido ao funeral dias depois. Como disse Pete Townshend em uma entrevista logo depois, "Brian era um cara que morria todos os dias".

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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