Topo

Um músico é a primeira vítima da guerra do Estado contra nós

Combate Rock

08/04/2019 17h00

Marcelo Moreira

FOTO: REPRODUÇÃO INTERNET

Primeiro foram os xingamentos e enfrentamentos na campanha eleitoral. Depois foram as agressões a artistas de rua em várias partes do país às vésperas do segundo turno das eleições de 2018. Em seguida, as agressões e destruição de instrumentos musicais em locais como avenida Paulista e parques estaduais em São Paulo.

Para quem achou que a intimidação aos opositores de esquerda, aos simples críticos do bolsonarismo e aos artistas não passou de uma "ação/reação inflamada" de eleição, os exemplos de disseminação de ódio, racismo e constantes ataques aos direitos humanos nos 100 dias de governo Jair Bolsonaro escancaram o limbo em que jogaram o país.

É sintomático que o Exército tenha matado dois civis sem envolvimento com o crime em dois dias no Rio de Janeiro. É sintomático que a Polícia Militar paulista mate mais no primeiro trimestre de 2019 do que na comparação com períodos semelhantes de anos anteriores, segundo reportagem do SP 1, da TV Globo.

E não deixa de ser irônico que uma das vítimas dos criminosos do Exército no Rio tenha sido um músico negro. Claro, naquela circunstância, poderia ser qualquer um, de qualquer profissão.

Mas tinha de ser um músico, e tinha de ser negro, para simbolizar bem como esse governo conservador despreza a vida dos cidadãos, dos artistas e de quem eles consideram "dresprezíveis", já que os relatos dos sobreviventes ao fuzilamento em Guadalupe, no Rio de Janeiro, dão conta do comportamento dos soldadinhos de chumbo: debocharam do que tinham feito, riram, do morto e dos protestos de sua família.

Muita gente garante que, em qualquer país civilizado, tal coisa colocaria fogo no país, provocaria protestos no estilo dos que aconteceram quando Marielle Franco, a vereadora carioca, foi assassinada, derrubaria ministros e comandantes de Exército.

O desesperador é que continuamos vendo gente defendendo a ação do Exército mesmo diante da constatação do "erro" ridículo, do "engano" cometido depois de 80 tiros contra um carro branco de uma família.

A patologia é tão grave que um imbecil ameaçou um repórter da TV Globo e sua família por conta de uma reportagem simples mostrando o ocorrido, sem grau nenhum de opinião, e já com a constatação de o Exército tinha fuzilado uma família de pessoas inocentes.

É muito clichê dizer que as artes e a cultura foram gravemente feridas com a morte do músico Evaldo Rosa, de 51 anos. Foi isso e muito mais, já que poderia ser qualquer um a vítima do fuzilamento. Só que é bastante simbólico que a música esteja envolvida em um caso tão lamentável.

Muita gente está preocupada, com razão, com a flexibilização da legislação para o porte e a posse de armas por civis. Antes disso, creio que temos de nos ater ao crescimento dos casos de violência institucional do Estado contra os cidadãos, especialmente nas periferias e regiões mais pobres.

O conservadorismo burro e irresponsável que cerca todos os governos de direita e extrema-direita eleitos no ano passado deu um salvo-conduto para que as forças repressivas estatais, devidamente orientadas ou não, exerçam seu fanatismo pela violência e compulsão por matar "inimigos" entre supostos opositores e críticos, em especial os mais pobres e seus defensores.

Com isso, o músico Evaldo Rosa se torna o primeiro mártir da música e das artes trucidado pelas forças de repressão do governo federal. Não dá para afirmar que é uma política deliberada e instruída pelo Estado, mas certamente é um comportamento estimulado e incentivado "conceitualmente" por conta da militarização do governo e da guerra que parte expressiva das forças de segurança querem travar contra os "inimigos" reais e ideológicos. Evaldo Rosa, infelizmente, será a primeira de muitas vítimas de "visão política e estratégica" de atuação do Estado.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
Contato: contato@combaterock.com.br

Blog Combate Rock