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Dream Theater e Haken: o prog metal em busca da reinvenção

Combate Rock

25/02/2019 06h52

Marcelo Moreira

Os fãs continuam fiéis; os lançamentos são esperados com ansiedade e apreensão; e eis que surgem teses e mais teses para sacramentar decadências ou promover redenções.

Assim como o seu pai, o rock progressivo, o heavy metal progressivo precisa de uma constante injeção de novas ideias e desafios.

Mais do que os demais subgêneros do rock, necessita de forma obsessiva buscar uma reinvenção para provar a si mesmo que merece a devoção e a eventual atração de novos adeptos.

Mais uma etapa dessa reinvenção desse peculiar subgênero começou no ano passado, com os novos trabalhos de bandas como Threshold, Fates Warning, Riverside e Steven Wilson, que lançaram álbuns muito bons.

Nesse aspecto, as tarefas das bandas Dream Theater e Haken não seriam muito confortáveis com tamanha concorrência.

O norte-americano Dream Theater, possivelmente o maior nome de todos os tempos no prog metal, ainda que não seja o mais antigo, precisava de certa redenção após a ópera-rock "The Astonishing", de 2016, um CD duplo hermético e pouco acessível em termos líricos, embora bem menos pesados que os discos anteriores.

Com 34 anos de carreira e um prestígio gigantesco dentro do heavy metal, o quinteto norte-americano reduziu as suas aspirações e procurou um novo alento na sonoridade que fazia nos anos 2000, ou seja, uma música mais pesada e menos grandiosa, se é que podemos usar este termo.

"Distance Over Time", recém-lançado, abre mão dos temas conceituais e retoma abordagens mais dinâmicas e diretas, como em "Unthetered", faixa que abre o CD, com seu estilo "As I Am", do pesado e incompreendido álbum "Train of Thoughts"

É uma tentativa saudável de voltar a um passado glorioso, onde o prog metal era complementado por deliciosas doses de rock progressivo oitentista do estilo King Crimson daquela época.

"Barstool Warriors" é uma música extraordinária, com ótima concepção de arranjos e um duelo instigante de guitarra e teclados. O guitarrista John Petrucci e o tecladista Jordan Rudess, que hoje formam o núcleo criativo do Dream Theater, nunca estiveram tão entrosados.

No entanto, parece que falta alguma coisa, falta algum tipo de energia que estava em álbuns anteriores. Não creio que seja falta de inspiração, mas, no caso de bandas como essa, como Iron Maiden, Metallica, sempre esperamos algo excepcional, fora do comum, ainda que não seja genial.

Não é o caso do novo trabalho do Dream Theater. "Distance Over Time" é muito bom, e provavelmente estará nas listas de melhores do ano de vários veículos.

Só que falta a excelência e a arrebatamento de obras como "Octavarium" (2005) ou "Black Clouds and Silver Lining".

Virou um característica relevante e esperada da banda um punhado de temas épicos e virtuosos, que mostrem uma certa excelência na composição e na execução.

Com um álbum pulverizado em muitas canções para encadear uma histórica complexa de ficção científica, "The Astonishing" acabou por contemplar a parcela dos fãs mais antigos e radicais que sempre esperam por hinos.

O novo álbum tenta remediar a questão, mas falta justamente aquele épico, como a monumental "IN the Name of God" ou a climática "Count of Tuscanny". Um hit também não seria nada mal, mas essa é uma coisa da qual o grupo abriu mão faz tempo.

Ouvir Dream Theater é sempre bom, mesmo que o  mais recente álbum não esteja recheado de hinos como nos acostumamos. É uma das raras bandas que é incapaz de fazer coisa ruim.

No caso dos ingleses do Haken, a situação é um pouco diferente. Não é uma banda nova, mas atingiu cedo a maturidade e continua em ascensão após 12 anos de carreira.

"Vector" é o seu mais recente álbum e traz também um retorno às origens, só que mais pesado e eclético. Não dá para saber se foi intencional ou não a aproximação com o som do King Crimson – os integrantes não falam sobre isso -, mas o resultado é muito bom.

Quinto álbum de estúdio, a banda colocou um pouco mais de peso em seu som e aprofundou suas experiências no jazz e nas partes progressivas.

O som está coeso e o vocal é um dos destaques – Ross Jennings aperfeiçoou sua  técnica e atua de forma mais integrada com a banda.

O guitarrista Richard Henshall, cérebro e um dos fundadores do grupo, mostra notável performance nos solos e nos momentos mais "climáticos", digamos assim. Aparecem em suas exibições traços das guitarras de Robert Fripp e Steve Howe (Yes), além de fraseados que remetem à fase mais jazz de Steve Hackett (Genesis).

"Veil", o principal destaque musical, é uma longa suíte que certamente resume bem o som da banda, com som o pesado combinando com o rock progressivo e os arranjos estupendos de teclados. É uma viagem de quase 13 minutos.

"Nil By Mouth" é uma peça instrumental intrincada conduzida pela guitarra de Henshall, que demonstra ser um instrumentista subestimado na atualidade.

"The Good Doctor", o primeiro single, é um prog metal mais reto e direto, mostrando, de certa forma, o direcionamento musical da banda – maior concisão, um pouco menos de complexidade e injetando mais feeling nos solos e passagens instrumentais.

Dream Theater e Haken, ao lado da banda norueguesa Circus Maximus, são os principais expoentes do prog metal atual com trabalhos novos na praça. Nem sempre dá para fazer a obra-prima desejada (na imensa maioria das vezes, quase nunca), mas esses artistas seguem firme em busca da reinvenção de seus sons para evitar repetir as mesmas fórmulas.

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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