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Paranoia da perseguição começa a chegar aos palcos do rock

Combate Rock

02/11/2018 06h54

Marcelo Moreira

FOTO: REPRODUÇÃO/YOUTUBE)

Deputada estadual catarinense abilolada lança campanha para denunciar professores "doutrinadores" incentivando os alunos a filmarem aulas para denunciá-los.

No mesmo Estado, policiais civis e militares disfarçados comparecem a reuniões de professores e de sindicalistas e filmam os eventos.

Na manifestação de terça-feira (30 de outubro) contra o fascismo e o presidente eleito Jair Bolsonaro, na avenida Paulista, eram vários os policiais militares filmando e fotografando militantes de movimentos sociais e partidos políticos.

Restam dúvidas de que caminhamos para um Estado policial e autoritário? Como ficarão os músicos agora, já que em todo show, grande ou pequeno, é registrado por alguém em vídeo com algum celular?

A paranoia está só começando, como tive o desprazer de ouvir de dois bons artistas nesta semana, músicos de primeira categoria e com trabalho autoral forte e engajado.

Depois da patrulha em relação ao comportamento de Roger Waters em palcos brasileiros e das seguidas campanhas de "denúncia" em vídeo contra professores e ativistas, o mundo artístico começa a avaliar como terá de se comportar diante de eventuais e previsíveis ataques de cunho fascista e autoritário.

"Vai sobrar para nós", reagiu desanimado Márcio (nome fictício), vocalista e baixista de bandas autorais e de versões de classic rock com público fiel nos bares e teatros paulistanos. Professor de história na rede pública estadual paulista, já vislumbra tempos difíceis na sala de aula de nos palcos.

"É ilusão achar que essa perseguição não vai se estender às peças de teatro e aos shows. Todo mundo filma o tempo todo. qualquer brincadeira ou mensagem que eu passar no palco servirá de munição para esse mundo podre que foi descortinado pela vitória dos fascistas", diz meio resignado.

Mais preocupada está a atriz, cantora e professora de inglês Renata (nome igualmente fictício). Engajada, vocalista de banda punk e professora voluntária em cursos diversos na periferia da zona sul, dá como certo que virará alvo da galera de extrema-direita.

"Aquele dia que achávamos que nunca chegaria infelizmente chegou. Os autoritários e intolerantes, gente geralmente sem inteligência, saiu do armário e está se sentindo autorizada a cometer barbaridades. Os ataques que partem das hostes de Bolsonaro não deixam dúvidas disso. A perseguição incentivada pela deputada catarinense é só o começo", afirma.

Mas os músicos correm esse risco? "Sim, e não vai demorar muito. Sempre houve patrulhamento. Com os celulares, os caras filmam em tempo real e atraem as matilhas de cães hidrófobos nas redes sociais. Até as bandas punks entrarão na mira uma hora ou outra, mesmo que seu público seja mais específico e homogêneo. Alguém que é progressista filma e inadvertidamente publica nas redes sociais e pode atrair a atenção dos arautos da censura", diz a cantora.

Márcio imagina que a vida ficará mais tensa para os artistas que insistem em tocar na avenida Paulista, em São paulo, aos domingos, que fica fechada para o lazer. "Que ironia: músicos tocando ao ar livre, em restrições de organização, terão de se policiar para não chamar a atenção dos patrulheiros. vai que você defenda os direitos humanos durante o show ou faça uma homenagem a Marielle Franco [vereadora carioca assassinada] e, de repente, aparece um idiota chutando a bateria e batendo nos músicos com um pedaço de pau?"

Como foram fartos os avisos durante a campanha eleitoral, quando as pessoas ficam com medo de se manifestar a favor de um candidato ou de usar uma roupa de cor identificada com algum partido político, é sinal de que o fascismo e a censura venceram.

A autocensura causada pelo medo e paranoia de uma sociedade violenta e protopolicial é mo que de pior pode ocorrer aos ambientes artísticos e acadêmicos.

Autocensura costuma impactar diretamente na produção cultural e afeta a qualidade do debate e do que é produzido. "Abriram asa jaulas e deixaram os idiotas furiosos soltos para intimidar e ameaçar. Não estou disposto a levar uma cadeirada em um bar qualquer só porque o lixo humano bêbado fascistoide não gostou do que eu ou qualqyer membro da banda tenha dito."

 

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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