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Rock tem de rejuvenescer e encontrar um novo caminho

Combate Rock

13/07/2018 13h36

Marcelo Moreira

Rock é coisa de velho? Esse é um clichê que muitos jornalistas jovens repetem quando pretendem fazer reportagens sobre o gênero musical em datas comemorativas, como o proclamado Dia Mundial do Rock.

Se rock é coisa de velho, imagine então o blues e o jazz, assim como a música erudita. Tais rótulos têm de ser rechaçados por conta da extrema variedade cultural em que vivemos atualmente.

O rock não tem mais a preferência do público, nem aqui, nem nos Estados Unidos e nem na Europa, mas ainda desperta paixões em muita gente pelo mundo. Os festivais internacionais e grandes ainda atraem excelente público.

A questão é que o rock precisa resolver o seu dilema, que é o mesmo de outros gêneros musicais: como atrair mais jovens e renovar o seu próprio público?

Hoje somos soterrados por um volume de informações imenso, que é despejado em nossas cabeças. A facilidade de  obtê-las aumentou muito. É muita oferta para uma procura que não dá conta.

O rock ainda tem seu público e ainda é uma indústria cultural poderosa e emblemática, mas tem um desafio de buscar a renovação, de atrair mais jovens que ultimamente preferem o rap e a música eletrônica.

O farto é que os "velhos" continuam ouvindo rock por paixão, mas a molecada está cada vez exigente – e preguiçosa. A internet ampliou as possibilidades de acesso e busca por informações, só que deixou os jovens mal acostumados.

Krisiun em ação no Centro Cultural de São Paulo: trio gaúcho se aproxima dos 30 anos de carreira, mas é idolatrado por um público jovem de heavy metal (FOTO: MARCELO MOREIRA)

Acham que tudo é de graça e que tudo pode ser acessado com um ou dois cliques. O rock no Brasil é coisa de classe média, ao contrário do que foi nos Estados Unidos, e requer um pouco mais de informações , tanto para aprender a tocar o instrumento como para conhecer o gênero.

Foram fatores importantes para criar um público nos anos 70 e 80 por aqui, até para manter a aura de gênero "contestador" e "rebelde".

A partir dos anos 90 o rock deixa de ser o veículo da contestação e acaba por ser assimilado definitivamente pelo "sistema", perdendo espaço para o rap, para o pagode e para a música sertaneja moderna. Coma concorrência, ficou mais difícil lutar por corações e mentes. Como o rock conseguirá voltar a "falar" com o público jovem, como o rap e o sertanejo? Esse é o desafio.

Muitos especialistas e músicos afirmam que o rock, no Brasil, voltou a ter o tamanho que tinha nos anos 70 e 80, antes do estouro do chamado BRock: um estilo marginal e cultuado por um público mais especializado, digamos assim.

Assim como o blues, no Brasil o rock se tornou coisa de classe média, de quem tinha acesso a livros e discos importados. O gênero era visto como algo "difícil" e "profundo", além de "agressivo".

Com a progressiva popularização e mistura com ritmos nacionais, o rock se transformou em algo possível de ser comercializado e ganhou mercado com o fim do regime militar e o surgimento de um movimento roqueiro lastreado em uma juventude bem nascida no Rio de Janeiro primeiro, e depois em São Paulo (o punk paulistano foi um movimento mais marginal ainda, que seria melhor compreendido anos depois).

Se formos observar o fenômeno do BRock dos anos 8o, aquilo foi algo "fora da curva", uma exceção dentro do que realmente deveria ser o lugar do rock.

Tanto no Brasil como nos Estados Unidos, tirando os medalhões do tamanho de Rolling Stones e U2, o rock voltou a um estágio underground e com mercado mais restrito, para um público "especializado".

O rock era considerado música de resistência. Ainda é? Depende do ponto de vista, mas, no geral, deixou de ser considerado de resistência porque houve um amadurecimento generalizado, tanto de artistas como do grosso do público.

O U2 era uma banda política por natureza que decidiu mudar radicalmente, abraçando a música eletrônica e letras mais leves. O Metallica nasceu para arrebentar, como diz em "Seek and Destroy", só que 30 anos depois o discurso ficou mais introspectivo.

Boogarins, no palco do Sesc Belenzinho: sucesso no exterior só aumenta (foto: Debora Oliveira)

Uma vez Pete Townshend, líder do Who, foi perguntado pelo chefe da gravadora dele, em 1985: "Por que você não compõe mais canções fortes como 'My Generation' (grande hit da banda, de 1965)?". "Simples, eu tenho mais 20 anos de idade e hoje tenho 40, penso completamente diferente e evoluí muito musicalmente."

Ou seja, o rock evoluiu bastante e muito rápido, e parece ter batido em um teto de criatividade.

As bandas que surgiram nos anos 2000 não conseguiram ocupar o espaço existente no quesito qualidade. Para o bem e para o mal, a contestação migrou para o rap no Brasil e nos Estados Unidos, só que o grosso do público jovem brasileiro parece não estar disposto a reeditar os "Dias de Luta" (música do Ira!, de 1985).

Isso é uma das explicações para o crescimento absurdo do sertanejo. O que vejo é que quem tenta fazer música de resistência no rock brasileiro hoje (e também na Europa) dá murro em ponta de faca. Só mesmo os grupos punk, thrash metal e death metal ainda insistem neste caminho – coisa obrigatória nestes subgêneros.

Como rejuvenescer o rock e fazê-lo ultrapassar as barreiras de mercado – notadamente em relação às mudanças na forma como ouvir e consumir música?

Essa é a meta perseguida por todos os músicos e empresários de todos os gêneros. O negócio música/entretenimento sofreu mudanças drásticas desde o advento da internet. As gravadoras sumiram e o dinheiro mudou de mãos.

Autoramas, uma das poucas bandas brasileiras com agenda lotada dentro e fora do país e que é autossustentável (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Ganhar dinheiro com música? Viver de música? Ainda está muito difícil. Há exemplos bem-sucedidos no mercado? Sim, mas ainda, infelizmente, são exceções. Ou são os medalhões dos anos 80 e 90 (gente como Paralamas do Sucesso, Ira!, Plebe Rude, Angra, Sepultura, Krisiun e outros) ou estrelas em ascensão do mundo indie, como Autoramas, Boogarins, Far From Alaska e mais três ou quatro bandas.

Deve demorar um pouco para que o mundo da música consiga encontrar novos caminhos para rentabilizar o negócio. Enquanto isso, várias possibilidades estão sendo tentadas em várias partes do mundo, mesmo em tempos de Trump e retrocessos conservadores.

A questão iminente para o rock é achar meios de atrair o público jovem e fidelizá-lo, sem a necessidade da exclusividade. É fazer os aficionados de outros gêneros musicais enxergarem a beleza e a importância do rock, seja como música de consumo rápido, seja como música de protesto e de resistência.

O que rock ainda tem muito a dizer, e sempre teve. O número de pessoas dispostas a escutar tem de crescer, senão o gênero corre o risco de cair no conformismo, na fossilização e do comodismo em que se encontram o jazz e o blues.

Rock não é e nunca foi música de nicho. Restrição não combina com o rock, e sim a expansão. Esse é o grande desafio do gênero na atualidade.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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