Kadavar assombra pela energia e qualidade em show em São Paulo
Marcelo Moreira
Alguns artistas costumam levar muito a sério o ambiente em que mergulharam. Outros vivem intensamente a vida que lutaram muito para conquistar. E o que dizer então daqueles que simplesmente nunca se desligaram da época em que não viveram, saindo diretamente do túnel do tempo?
Os alemães do Kadavar, um dos maiores nomes do stoner rock europeu, tocou pela segunda vez em São Paulo no último dia 3 de março e pareciam ter saído de um daqueles seriados de ficção científica: hippies cabeludos que subiram ao palco vindos diretamente de Woodstock…
E não somente o som e as roupas da banda remetiam aos anos 70 – era possível identificar de tudo ali, de Led Zeppelin a Uriah Heep, de Free a Queen, de Deep Purple a Black Sabbath.
Os maneirismos, o comportamento, o sotaque do inglês falado pelo guitarrista e vocalista, tudo era setentista demais. Tudo parecia um cenário "fake" em excesso. Mas e daí?
E daí que o trio alemão não deu a mínima, muito menos as mais de 500 pessoas que superlotaram a casa Fabrique, na zona oeste da cidade.
O negócio ali era escutar um bom rock'n'roll pesado. Ninguém se importou com a indumentária fora de época e os cabelos na altura da cintura dos músicos.
Kadavar é uma banda que não combina muito com sofisticação, como algumas contemporâneas do segmento, como Wolfmother e The Answer. É tudo muito reto e direto, exatamente como os paulistanos queriam.
Se no começo do show predominaram as músicas mais psicodélicas, com uma guitarra saturada de efeitos (principalmente o wah wah), na segunda metade do show a coisa ficou mais pesada, com a guitarra mais suja e estridente, enquanto o som do baixo aumentou consideravelmente, remetendo a The Who, Black Sabbath e Deep Purple.
A banda é formada pelo guitarrista e vocalista Christoph "Lupus" Lindemann, o baterista Christoph "Tiger" Bartelt e o baixista Simon "Dragon" Bouteloup. São do tipo "pau na máquina", com poucas palavras com o público (só clichês do tipo 'are you feel good?') e muita energia.
Foram 80 minutos intensos, tirando o fôlego de um público curioso e que queria ser surpreendido. Os alemães foram bem-sucedidos e transformaram a pequena casa uma festa roqueira alucinante.
Lupus é um guitarrista performático, mas um atento pesquisador de timbres, e isso ficou claro nas duas primeiras músicas, "Skeleton Blues" e "Doomsday Machine". Embora menos pesadas do que o esperado, foram bons cartões de visitas, onde a guitarra psicodélica duelou de forma intensa com o baixo pesado e marcante de Dragon.
A música é datada? Sim, e também longe de ser original, embora o álbum mais recente "Rough Times", traga uma paleta sonora mais variada. O trio nunca se aventurou por essas águas, a de criar algo revolucionário. São operários do hard rock e entregam aquilo que prometem – e nada mais, o que está de bom tamanho.
Houve quem reclamasse na plateia do excesso de efeitos na guitarra de Lupus. Não estavam totalmente errados, mas o guitarrista compensou com solos muito bons e jams onde seus fraseados deram cores marcantes para algumas canções de teor mais simples.
Foi o caso de "Die Baby Die", música simples com um refrão bem bacana e pegajoso. "Living In Your Head" já mostrou um peso maior, com o baixo em destaque, enquanto que "Black Sun" e "Forgotten Past" mergulharam no heavy metal, com a guitarra assumindo timbres "sabbathianos" e "priestianos" (de Judas Priest).
O Kadavar já não era mais uma mera curiosidade do underground europeu quando desembarcou para sua segunda turnê sul-americana e, após os shows brasileiros, não só reforçaram a boa impressão que deixaram na última passagem como certamente conseguiram mudar de patamar por aqui.
Foi um ótimo show de uma banda que não quer reinventar nada. Faz um rock pesado e direto, sem grandes arroubos de criatividade, mas com muita energia e carisma.
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