Perseverante, Mario Linhares brilhou no rock conceitual nacional
Marcelo Moreira
Mario Linhares tinha um sorriso fácil e uma conversa boa demais, mas nunca escondeu um agudo senso de urgência. Sabia que tinha deixado o seu Dark Avenger por muito tempo na geladeira nos anos 2000, e também sabia que era um afortunado por ter se curado de um câncer.
Na última quinta-feira, 21 de dezembro, quando o link do programa de web rádio Combate Rock subiu no site www.combaterock.com.br com os melhores lançamentos nacionais do ano, o cantor do Dark Avenger ficou exultante com a inclusão de "The Beloved Bones: Hell".
Em rápida troca de mensagens conosco, Linhares agradeceu mais uma vez o apoio (agradecer pelo quê? O álbum é ótimo!!!) e disse já tinha ganho a semana.
Menos de 48 horas depois, surge a notícia da morte do cantor cearense radicado em Brasília. Como lidar com a velocidade de tão avassaladora notícia?
Persistência e paixão eram, provavelmente, as duas características que definiam aquele que era o melhor compositor de obras conceituais do rock brasileiro.
Os temas e as letras das músicas do Dark Avenger nunca foram fáceis, e Linhares, o compositor, nunca fazia concessões. Perfeccionista e culto, não abria mão da profundidade dos assuntos abordados, a ponto de ser admirado por músicos e produtores internacionais.
Isso ficou claro na recente viagem que fez à Europa para divulgar "The Beloved Bones: Hell", quando foi recebido com muita pompa por representantes de gravadoras na Itália.
Linhares era persistente porque sempre acreditou no Dark Avenger e no seu trabalho conceitual, na força dos temas e das letras. Nas redes sociais se mostrou meio ranzinza nas últimas duas semanas com o que considerou "rumo errático para as trevas" em relação à cultura musical atual – a era das bundas rebolantes e dos realities shows estéreis e sem conteúdo.
Entretanto, em nenhum momento deixou de acreditar no próprio trabalho e no talento de sobra que existe no rock e no metal do Brasil, a começar pelo seu próprio trabalho, defendido com uma paixão comovente.
O cantor era tão apaixonado pelo que fazia e tinha tanta consciência da boa qualidade de seu trabalho que não hesitava em comprar brigas e tretas para explicitar seus pontos de vista – quando não para tentar impô-los nas discussões.
Essa passionalidade lhe rendeu alguns reveses e broncas homéricas de muita gente boa e importante do meio roqueiro brasileiro, mas que não o fizeram recuar ou ceder – no máximo, refletir e contornar algumas situações.
A falta de paciência com as questões diversas no mercado nacional da música atingiu o auge em setembro, quando o show de lançamento de "The Beloved Bones: Hell" em São Paulo foi cancelado.
Em meio a boatos de fechamento da casa noturna onde seria realizado o espetáculo e de outros de que as vendas antecipadas foram fraquíssimas, Linhares engatou uma discussão pelas redes sociais onde questionava a idoneidade de promotores de shows e de donos das casas, sempre aludindo ao que chamou de "quebra frequente de contratos e descumprimento de acordos."
A manifestação irada e passional não pegou bem, justamente porque vinha de um artista em ascensão que voltava ao holofotes com um ótimo trabalho e que tinha fama de negociador afável.
Seja como for, esse contratempo que o tirou do sério foi compensado pela produtiva viagem pela Europa, onde teve reconhecida a qualidade do seu trabalho.
A morte de Mario Linhares interrompe uma trajetória de luta tenaz pela cultura e pelo trabalho diferenciado dentro do rock nacional. Perseverante ou teimoso? A resposta está em "The Beloved Bones: Hell", trabalho de extremo bom gosto e uma das obras mais importantes do metal brasileiro neste século.
Sobre os Autores
Sobre o Blog
Contato: contato@combaterock.com.br
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.