Bendicta larga bem apesar da escolha arriscada
Marcelo Moreira
Os caminhos estão bem mais difíceis. Esburacados, cheio de obstáculos e até destruídos. E tem gente que ainda insiste – ainda bem.
É o caso da banda Bendicta, de São Paulo, que ainda investe no sonho de fazer música pesada em português e conseguir algum tipo de reconhecimento.
O material de apoio impressiona, com adesivos e um pen drive caprichado com o EP "Recomeço" e todos os videoclipes que a banda já gravou e lançou.
Há futuro para o Bendicta, cantando em português na poderosa voz da vocalista Angel e buscando uma sonoridade mais moderna?
A julgar pelos predecessores no subestilo, o caminho é arriscado e perigoso. A baiana Pitty é hoje um dos nomes mais importantes do pop rock nacional, mas teve de deixar o som pesado de sua carreira solo de lado – tanto que também faz soft rock com o projeto paralelo Agridoce.
Já o Madame Saatan, do Pará, deu a impressão de que iria decolar com uma sonoridade mais vintage, bem hard rock, apostando na voz forte da cantora Sammliz e na sua imagem sensual.
O começo foi promissor, mas depois o grupo implodiu e a vocalista engatou uma até agora bem-sucedida carreira solo no ano passado, com o álbum "Mamba", muito mais pop e bem menos rock.
"É óbvio que não está sendo fácil, e nunca achamos que seria. Temos um projeto sério e esntamos muito empenhados nisso", afirmou a cantora Angel após o show de lançamento de "Recomeço", no Manifesto Bar, em São Paulo.
O dia não era dos melhores, um domingo frio de maio. Em pouco mais de 50 minutos, o quarteto se esforçou bastante para quase 200 pessoas e impressionou pela performance afiada e pelo entrosamento.
O show surpreendeu porque a banda é muito mais pesada ao vivo do que no estúdio e nos clipes. Isso é bom e é ruim: causa boa impressão no palco para quem nada esperava; por outro lado, deixa a pergunta no ar – por que esse peso não é captado no estúdio?
No primeiro trabalho, a Bendicta mostrou qualidades, ainda que tenha de manter a busca por um som original. E o diferencial, por enquanto, é o peso mostrado ao vivo, com duas guitarras e uma afinação baixa, unindo um hard rock clássico com uma sonoridade mais moderna.
Essa modernidade às vezes espanta, como nas três versões escolhidas para completar o repertório das cinco músicas do EP.
Como disse Angel no palco, as músicas escolhidas refletem os gostos dos integrantes – Alter Bridge, Nickelback e Disturbed, ainda que o que está em "Recomeço" não demonstrem explicitamente essas influências.
"Na Memória" é uma canção básica e forte, feita para abrir a festa e mostrar as boas qualidades instrumentais do grupo. "A Cor Que Sangra" é a melhor do EP, que traz mais peso e mais força para uma letra mais politizada.
"Verdade em Confusão" tem cara de hit, com uma letra esperta e desencanada. Ao vivo é mais impactante, em especial pela performance do guitarrista Thiago "Thigas" Sobral, adepto de um instrumento de sete cordas e que o executa com competência.
"Essência" tem uma bela melodia e dá destaque ao baixo gordo e firme de Clayton "Mestre" França, que ressalta o competente trabalho de Fernando Quesada (baixista do Noturnall e violonista no projeto ANIE).
O Bendicta tem uam série de desafios neste instável e depredado mercado musical-roqueiro do Brasil. São corajosos por enveredarem por um caminho difícil. O começo é animador em quase dois anos de atividades.
A empolgação e a juventude de seus integrantes contam a favor, assim como as canções acima da média. O "mas", em relação à banda, é que hoje o mercado não espera muito tempo por amadurecimento, e o grupo terá de acelerar esse processo para superar as dificuldades adicionais de fazer som pesado e "modernoso" com vocal feminino potente.
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