Topo

Nenhum de Nós e o abuso sexual: 30 anos depois, a ferida não fecha

Combate Rock

27/05/2016 06h50

Marcelo Moreira

Nenhum de Nós (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Nenhum de Nós: Thedy Corrêa está no centro (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Quando imaginamos que as trevas estão dominando a nossa sociedade por conta dos recentes fatos políticos e pelas constantes ameaças de retrocesso em direitos civis, humanos e trabalhistas, eis que ainda somos submetidos a uma sucessão de episódios de barbárie.

Na noite de quarta-feira (25), as redes sociais viralizaram um vídeo de um suposto vídeo, com fotos também, que mencionariam, em tom de zombeteiro, que uma menina de 16 anos teria sido vítima de um estupro coletivo no Rio de Janeiro – 33 homens a teriam violentado, após dopá-la.

No dia seguinte, a menina que teria sido estuprada compareceu a uma delegacia da Polícia Civil e, em depoimento, alega ter sido vítima do estupro coletivo e dopada pelo namorado.

Tudo indica que a barbaridade realmente aconteceu, ainda que as investigações estejam apenas no começo e que não tenha sido feita uma perícia médica na garota, que mora em uma comunidade pobre no Rio.

A repercussão nacional e internacional do crime hediondo foi gigantesca e mobilizoua internet como poucas vezes ocorreu – o crime foi tão absurdo que faltam adjetivos para qualificar o que ocorreu.

Thedy Corrêa, vocalista e guitarrista da banda gaúcha Nenhum de Nós, um dos bons nomes da geração dos anos 80 do rock nacional, escreveu um manifesto em seu site pessoal.

Ele é o autor da música "Camila", o maior hit de sua banda. Com uma letra forte e contundente – e muito boa -, o músico sou bons artifícios poéticos para narrar um caso de violência sexual.

Trinta anos depois, Corrêa volta indignado ao tema por conta do crime ocorrido no Rio de Janeiro. Ele aborda o caso, mas também faz uma reflexão sobre os tenebrosos tempos em que vivemos no ano de 2016.

Leia o texto de Thedy Corrêa:

A FERIDA QUE NÃO FECHA

Há trinta anos atrás o Nenhum de Nós surgiu na cena do rock dos anos 80 com uma canção que abordava a violência de gênero.

"A vergonha no espelho naquelas marcas"

"Olhos insanos que passavam o dia a me vigiar"

"Às vezes peço a ele que vá embora"

Faça uma busca em sua memória e tente lembrar de outra música que tenha esse tema. Difícil, não é?

Pense em três caras, universitários, que queriam fazer uma banda e, quem sabe, viver do rock. Pense nos anos 80 como os primeiros passos pós-censura. Na verdade, ela ainda rolava. Nós queríamos o sucesso, mas não a todo preço. Queríamos deixar uma marca e construir uma carreira.

Você consegue pensar em alguém que faria o mesmo hoje em dia?

Infelizmente a nossa música "popular" está revestida de um verniz machista e repleta de desrespeito às mulheres. Quando a gente pensava que chamar alguém de cachorra seria o limite, vieram as letras que sugerem a embriaguez forçada seguida de "amor sem consentimento". O estupro oculto em metáforas absurdas que rodam em todas as rádios e TVs, ocupando feiras, festas e shows país afora. É o fundo do poço. 

As mulheres viraram "malas feministas", exageradas, histéricas e recalcadas. Perfis de feministas são alvo de ataques e ameaças. Defensoras dos direitos das mulheres são rotuladas de "mal amadas"… Eu poderia listar outros tantos absurdos que encontram em "gente bacana e esclarecida", defensores obtusos e ignorantes desses agressores. Admiradores de um sujeito como o Bolsonaro, que disse que não estupraria a deputada Maria do Rosário "porque ela é feia". Muitos concordaram com ele, afinal é petista e defensora dos direitos humanos, portanto, defensora de bandidos. Que país é esse?????? Onde foi parar nossa civilidade? O que nos diferencia dos animais? Tudo é permitido???

O caso da garota estuprada por 30 homens – eu os chamaria de ANIMAIS – não reabre nenhuma ferida, pelo simples fato de que essa ferida não fechou, não cicatrizou. Essa ferida é simplesmente IGNORADA diariamente no Brasil. Ela segue aberta e sangrando. Até quando?

ATÉ QUANDO????

 

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
Contato: contato@combaterock.com.br

Blog Combate Rock