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Campanha de boicote de Roger Waters é impertinente e desrespeitosa

Combate Rock

13/06/2015 10h16

Marcelo Moreira

Roger Waters (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Roger Waters (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Roger Waters tem uma tenacidade e uma perseverança dignas de serem admiradas. Levou o Pink Floyd à frente várias vezes em momentos críticos e próximos da desintegração e consolidou a sua posição de um dos roqueiros mais politizados da história. Sempre fez questão de ressaltar o viés pacifista em sua obra solo e na banda, pendendo para a esquerda.

Se ele não teve atuação destacada contra o apartheid na África do Sul, nos anos 80 – estava envolvido totalmente na batalha judicial para acabar com o Pink Floyd e evitar que David Gilmour (guitarra e vocais) e Nick Mason (bateria) tomassem conta do nome e fossem adiante -, entrou de cabeça em campanhas de defesa do povo palestino nos conflitos contra os israelenses, ao lado da atriz inglesa Vanessa Redgrave.

Radical, tornou-se um intransigente crítico de qualquer governo israelense e desde os anos 90 prega um boicote cultural e esportivo total ao Estado judeu.

Não foram poucas as intervenções que fez junto a artistas ingleses e europeus solicitando que cancelassem apresentações em Israel. Às vezes convencia, às vezes era solenemente ignorado.

Steven Wilson, líder do Porcupine Tree (banda de metal progressivo inglesa), foi um dos alvos, já que frequentemente se apresenta em Israel por conta de ligações e projetos com artistas locais. Chegou mesmo a morar em Tel-Aviv por um tempo. Foi outro que ignorou os apelos de Waters. "O poder da música é muito superior ao da política e do ódio", declarou Wilson certa vez.

Pela segunda vez em 2015 o ex-baixista do Pink Floyd insiste, em carta aberta, para que Caetano Veloso e Gilberto Gil, grandes expoentes da MPB, desistam de apresentações em Israel. Está sendo ignorado pela segunda vez.

É respeitável o engajamento político internacional de Waters e sua participação em diversas outras campanhas humanitárias e beneficentes. É um artista que merece respeito e por sua obra musical importante e pela coragem de encampar brigas políticas delicadas.

Entretanto, o ex-Pink Floyd já é motivo de piada e já é um considerado um chato. Que defenda os seus pontos de vista, polêmicos ou não, é um direito inalienável, mas se tornar impertinente a ponto de ver o respeito que adquiriu ser substituído pelo enfado e pelo tédio, para ser generoso, não é uma boa ideia para um artista de tal porte.

Que ele tenha feito o pedido de boicote em carta aberta aos músicos brasileiros faz parte do jogo político, mas insistir no tema, desrespeitando as decisões dos artistas, não só é impertinente, mas é de uma extrema grosseria. Ninguém é obrigado a concordar com os pontos de vista anti-israelense de Waters, ou mesmo a ter algum tipo de opinião política pública.

O boicote é legítimo, assim como os shows em Israel. Portanto, o ex-baixista do Pink Floyd precisa parar com a campanha mala e insistente de tentar convencer artistas a riscar Israel do mapa. Os brasileiros já negaram o primeiro pedido e ignoraram o segundo. Chega de factoides, Roger Waters.

Abaixo, a tradução da segunda carta de Waters a Caetano e Gil, publicada no site da revista Rolling Stone Brasil:

No mês passado eu escrevi para Caetano e Gil e não recebi nenhuma resposta, mas suponho que eles irão cruzar a linha do piquete e tocar em Tel Aviv. Que seja. Eles devem ter razões imperativas que estão guardando para si mesmos. Em minha carta a eles, eu falei sobre futebol, praias, direitos humanos e sonhos. Aqui vai uma história sobre sonhos e futebol.

Jawhar Nasser Jawhar, 19, e Adam Abd al-Raouf Halabiya, 17, dois jovens e promissores jogadores de futebol, sonhavam em um dia jogar profissionalmente, talvez até defendendo a camisa do país deles. Em 31 de janeiro, enquanto eles caminhavam para casa, saindo de uma sessão de treinamento no Estádio de Faisal al-Husseini em al-Ram, no centro da Cisjordânia, forças israelenses abriram fogo contra eles sem aviso.

Jawhar foi atingido sete vezes em seu pé esquerdo e três vezes no direito. Halabiya foi ferido uma vez em seu pé esquerdo e uma no direito. Médicos no hospital governamental de Ramallah dizem que os dois nunca chutarão uma bola de futebol de novo; na verdade, serão necessários seis meses de tratamento antes que os médicos possam avaliar se eles poderão andar novamente.

Estes dois jovens não foram acusados de nenhum delito, e nenhum inquérito foi aberto sobre as ações dos soldados responsáveis por suas lesões incapacitantes.

Assim, Caetano e Gil, Jawhar e Halabiya não estarão presentes no show de vocês em Tel Aviv. No entanto, os homens que os balearam estão livres para comparecer, se desejarem.

Roger Waters

7 de junho de 2015, Nova Iorque"

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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