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Enxuta e urgente, nova biografia do Sepultura é um bom resumo de 3 décadas

Combate Rock

11/02/2016 07h00

Marcelo Moreira

Rápido, urgente e frenético, na toada da música forte e extrema do Sepultura. "Relentless", a nova biografia da banda brasileira, já está nas livrarias e se tornou o principal registro da carreira do grupo – até por falta de opções mais atualizadas.

O livro em português foi editado pela editora Benvirá. A versão original saiu em 2014 nos Estados Unidos e na Polônia e uma versão para o Brasil estava programada para o comecinho do ano passado, mas as negociações com  editoras brasileiras demoraram.

Jason Korolenko, o autor, é um escritor conceituado nos Estados Unidos, já escreveu romances e também trabalha como jornalista. apaixonou-se cedo pelo heavy metal do Sepultura e, por tabela, pelo Brasil – sua lista de amigos por aqui é imensa, o que lhe  rendeu também um casamento com uma brasileira.

Antes do lançamento do livro, Jason Korolenko falou com exclusividade ao Combate Rock sobre a obra e a trajetória da banda. Clique aqui para ler a entrevista.

Sem firulas e com texto enxuto, Korolenko repassa toda a carreira  do Sepultura em ordem cronológica. Dá preferência à narração dos fatos e às entrevistas, sem tanto espaço para análises, conjecturas e contextualizações mais aprofundadas. Neste aspecto, sua obra difere, e muito, do tipo de biografia musical que jornalistas e escritores britânicos praticam.

Para suprir a presença menor de um texto com mais estofo, fez o que todo bom jornalista costuma fazer – muitas e muitas entrevistas, com entrevistados selecionados e relevantes.

A história é contada pelos integrantes que se dispuseram a falar, além de vários amigos da banda, empresários, produtores, jornalistas fãs que devotam suas vidas à banda e músicos brasileiros e estrangeiros. A narrativa é ágil, veloz e quase sempre certeira. Deve agradar à maioria.

Entretanto, existem algumas escorregadas, mas nada comprometedor. A mais "grave" delas nem é culpa do autor. Os irmãos Max e Iggor Cavalera, como era previsível, se recusaram a participar do projeto, assim como Gloria Cavalera, a mulher de Max e ex-empresária.

Diante disso, é evidente que o livro é desequilibrado, e não havia como ser diferente. Prevalecem as histórias e opiniões de Andreas Kisser, o guitarrista e principal fonte e, em menor escala, de Paulo Jr, o baixista e único remanescente da formação original.

Formação clássica do Sepultura

O desequilíbrio se acentua também na lista de entrevistados, quase todos amigos e próximos da formação do Sepultura que permaneceu depois da saída de Max Cavalera, em 1996, e de Iggor, em 2006. No entanto, dosa bem as partes históricas, entre as eras Max e sem Max.

Outro pecado são as simplificações e imprecisões na tentativa de fazer uma contextualização histórica do Brasil e suas eventuais influências no surgimento e formação do Sepultura.

Korolenko teve uma boa ideia ao tentar dar um panorama político-econômico do Brasil desde o final do século XIX, acentuando um caráter elitista e autoritário da sociedade brasileira ao longo do século passado.

Era uma tarefa difícil em poucas páginas, e ainda contendo algumas imprecisões. O resultado é que ficou complicado estabelecer nexos causais entre a vida dos irmãos Cavalera em São Paulo e Belo Horizonte na infância e a juventude e o clima tenebroso da ditadura militar brasileira.

O autor vende a ideia de que, dependendo do tipo de atuação artística, podia-se ir para a prisão no Brasil. Isso é verdade, mas dez anos antes do início do interesse dos meninos por música e mais tempo ainda antes do surgimento do Sepultura, em 1984 – quando a banda foi fundada, a ditadura esfarelava e logo haveria um presidente civil, um ano depois, por mais que ainda persistisse um odioso e imbecil departamento de censura, que durou até 1988.

Entre os méritos do livros estão diversos esclarecimentos de fatos antes tidos como verdadeiros e a confirmação de boatos que, na verdade, eram verdade, o que demandou um trabalho duro e criterioso de pesquisa e cruzamento de informações.

Também chama a atenção o desvendamento, ao menos em parte, dos bastidores da separação entre Max e o resto da banda, em dezembro de 1996.

Korolenko arrancou de Andreas detalhes sobre o clima ruim e as brigas ocorridas no segundo semestre daquele ano, onde aflorou todo o descontentamento com o gerenciamento de Gloria Cavalera, empresária do grupo e mulher de Max.

O ressentimento fica claro nas declarações a respeito de um distanciamento de Max do resto dos integrantes e equipe e de um sentimento de privilégio a ele por parte da empresária. Também há histórias e reproduções de diálogos de Iggor da época da separação.

Sepultura versão 2016 (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Uma coisa que talvez incomode alguns leitores é o clima de proximidade de Korolenko com Kisser e Paulo Jr. Em nenhum momento o autor nega que seja muito fã do grupo e que seja próximo da atual formação, inclusive do atual vocalista, Derrick Green.

Korolenko elogia bastante os álbuns pós-1996, descreve minuciosamente seus processos de criação e gravação e, com alguns exageros, enxerga certos méritos que talvez tais trabalhos não tenham.

No posfácio da edição brasileira, acrescido especialmente para o público daqui e escrito em novembro de 2015, o autor dá uma atualizada na história da banda de 2014 para cá, mas acaba passando por cima de um fato importante: o rompimento da relação empresarial entre Sepultura e Monika Bass Cavalera, ex-mulher de Iggor.

A separação não foi amigável em março de 2015, mas foi discreta. E Monika é uma das personagens principais – e fonte importantíssima – do livro e era a última Cavalera que ainda resistia no círculo da banda. Houve uma simples menção ao rompimento e nada mais.

"Relentless" (Implacável), por enquanto, é a obra de referência sobre o Sepultura neste século, pois abrange os 30 anos de história do grupo. "Sepultura – Toda a História", de André Barcinski e Silvio Gomes, é importante e tem uma narrativa mais sofisticada e elaborada, mas foi lançado em 1999 e nunca foi atualizado – Korolenko inclusive elogia a obra.

Para quem quer saber sobre a banda brasileira de rock mais importante de todos os tempos, "Relentless" é necessário.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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