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Os 40 anos sem Bon Scott, a voz inigualável do AC/DC

Combate Rock

05/02/2020 07h02

Marcelo Moreira

O AC/DC provou que poderia seguir sem Bon Scott em 1980, quando o vocalista morreu, em 19 de fevereiro de 1980. Mas será que teria chegado aonde chegou sem o carismático e brincalhão cachaceiro como o homem de frente em meados dos anos 70?

Em variados graus de ênfase, os principais biógrafos afirmam que ele foi fundamental para a ascensão da banda em seus primórdios, ao lado dos guitarristas Angus e Malcolm Young.

Cantor e baterista frustrado nos anos 60, operário da construção civil, pescador e motorista na primeira metade dos anos 70, Bon teve de se virar para conseguir alguma grana e manter, ainda que por algum tempo, a chama do rock.

 

O Fraternity foi uma das opções, mas não durou o suficiente, e nem rendia o que ele conseguia com sua banda de covers lá nos anos 60. Entrou e saiu de vários grupos fracassados, até que dirigiu a van de um grupo de moleques fedorentos e mal encarados em Melbourne.

O cantor deles não era lá essas coisas, e já estava atritado com com todo mundo – era Dave Evans, que gravou apenas um single. Bom Scott não achou muito interessante o que viu, nem ficou impressionado, mas reconheceu que os caras tinham atitude, eram selvagens no palco e bons de briga. Fez questão de manter contato com aquele tal de AC/DC, e dirigiu a van deles mais algumas vezes.

A saída de Evans era uma questão de tempo, e algum tempo depois alguém avisou Bon que o AC/DC estava sem cantor.

Sem muita animação, o cantor, bem mais velho do que os então moleques, fez um teste, mas o entrosamento foi tal que logo o ex-velho astro de segunda categoria do rock australiano se sentiu em casa, em especial em relação à bebedeira e à putaria promovida pelo então nascente furacão.

Com suas letras sacanas e sarcásticas, e sua voz cortante de serra elétrica, Scott se tornou, em pouco tempo, um dos mais fascinantes personagens do rock, e foi tão importante para a consolidação do AC/DC e seu sucesso quanto os irmãos guitarristas Young.

Faz 40 anos que Bon morreu em Londres, após uma das constantes bebedeiras intermináveis nas frias noites inglesas. Para muita gente, foi o fim de uma era em que o rock era mais espontâneo, intenso, descontraído e sacana.

Foi um ano difícil para a música pesada, jpa que em setembro daquele ano o Led Zeppelin perdia o baterista John Bonham em setembro, o que causou o fim do grupo três meses depois.

Ele e Scott, curiosamente, pertenciam à mesma espécie de astro pop – geniais, beberrões e sem limites, mas de uma generosidade quase inacreditável.

De certa forma, suas mortes acabaram com um período rico e esfuziante do rock pesado, praticamente terminando uma fileira de mortes de astros de todos os calibres – Gary Thain (Uriah Heep), Tommy Bolin (Deep Purple), Paul Kossoff (Free), Marc Bolan, Steve Gaines (Lynyrd SkynyrdO e muitos outros.

Livro traz novidades sobre a morte de Scott

Um jornalista obcecado persistente; dois supostos segredos à beira de serem desvendados; e dois vilões perfeitos para o momento – na verdade, para sempre. E eis que temos um quase romance de investigação envolvendo um dos maiores cantores da história do rock.

O inglês Jesse Fink é um profissional corajoso, meticuloso e dedicado. Fascinado por pesquisa jornalística e investigação, tem outras duas paixões: o AC/DC e espezinhar os irmãos guitarristas Angus e Malcolm Young (e o irmão mais velho, George, produtor e mentor da dupla).

A paixão pelo grupo australiano se transformou em quase um objetivo de vida para Fink, o que o levou a pesquisar muito sobre o quinteto, e, infelizmente para muitos fãs e para os membros da família Young, a não gostar nem um pouco do que descobriu.

Decidiu escrever sobre o AC/DC e revelar o que chama as "verdades ocultas" e o mundo nem tão maravilhoso da locomotiva do hard rock.

Fresquinho, "Bon – A Última Highway" (Ed. Benvirá) acaba de chegar às livrarias. É um trabalho de fôlego, que consumiu três anos de pesquisas e inúmeras viagens pelos Estados Unidos, Europa e Austrália.

É também uma obra audaciosa e complicada: pretende reavaliar os últimos 32 meses de vida do vocalista Bon Scott, morto em fevereiro de 1980, e desvendar os pontos obscuros a respeito de sua morte.

Mais ainda: tenta provar que o cantor é o autor das letras do álbum "Back in Black", lançado quatro meses de sua morte, embora não tenha sido creditado por isso.

Já adianto: Fink "fracasssa" nas duas tentativas. Conseguiu apenas elaborar duas intrincadas teorias sem que tivesse tido a intenção de apontar culpados. Apesar de ser inconclusivo, o livro faz muito barulho e traz uma fartura de novas informações, indícios e questionamentos.

O jornalista inglês também é autor de "Os Youngs – Os Irmãos que Criaram o AC/DC", lançado no Brasil em 2015 – o autor é casado com uma paulista e se divide entre Sydney, na Austrália, e São Paulo.

Neste livro, a ideia era fazer um relato biográfico da banda, mas focando no processo que culminou na criação do AC/DC e na maneira como os irmãos conduziram tudo até finalmente transformarem o "evento" em um dos maiores grupos de rock de todos os tempos.

A questão, no entanto, é que Fink, fã da banda, decidiu não aliviar e contar muitos podres, misturando informação e opinião, traçando um retrato nada lisonjeiro da dupla de guitarristas e de seu irmão mais velho e mentor. Mesquinhos, autoritários, paranoicos e nenhum pouco amistosos são alguns dos adjetivos mais leves usados pelo autor.

Em sua obsessão editorial pelo AC/DC, o novo trabalho de Fink tem por objetivo provar que Bon Scott, depois de morto, foi injustiçado ao não ter sido credito como coautor das dez músicas de "Back in Black" – todas de autoria, oficialmente, de Angus, Malcolm e Brian Johnson, o substituto de Bon.

Desde o livro anterior, Fink questiona as alegações oficiais para a causa da morte de Scott – intoxicação alcoólica ocorrida na madrugada de 19 de fevereiro de 1980, quando foi encontrado morto dentro de um Renault 5 no bairro de East Dulwich, em Londres.

A história oficial: Bon ligou para a amiga Margareth "Silver" Smith (viciada em heroína) para sair e tomar umas. Ela recusou e sugeriu que ligasse para o amigo Alistair Kinnear (outro viciado). Bon topou e os dois saíram pela noite. Foram parar no bar The Music Machine para assistir a um show punk.

Como sempre, completamente embriagado, apesar de sua extrema tolerância ao álcool, o vocalista do AC/DC se divertiu bastante, mas começou a baquear. Kinnear e uma amiga, Zena Kakoulla, não perceberam de imediato e decidiram ir para outro lugar com Bon.

No carro de Kinnear, Bon apagou. Não era a primeira vez que isso acontecia. Kinnear e Zena, chapados de heroína, chegaram ao apartamento de Kinnear, mas não conseguiram carregar Bon para cima. Deixaram ele no banco de trás e o cobriram com um cobertor por conta da noite fira. No dia seguinte, Kinnear encontrou Bon sem respiração e o levou para o hospital, onde foi declarado morto.

Jesse Fink questiona essa versão. Conversando com muitos personagens, muitos deles pouco conhecidos, buscou indícios de que Bon Scott também era usuário de heroína – uma overdose da droga seria a causa verdadeira da morte.

Devido à demora em levar o corpo para o hospital, os sinais de overdose teriam sumido, fato que seria bastante conveniente para, eventualmente, livrar de culpa Kinnear e Zena e outros amigos viciados de Bon, como o baixista Pete Way e o guitarrista Paul Chapman, ambos da banda UFO.

O autor não pretende estabelecer culpas, mas alega que quis encontrar a verdade. No meio de tudo, sobra os irmãos Young, que seriam insensíveis ao alcoolismo e vício de Bon. Diz que sempre foram distantes do vocalista e que havia um clima muito tenso entre ele e Malcolm em 1979 – o livro traz declarações de que Bon pensava seriamente em sair do AC/DC no final de 1980, além de recolher indícios de que os irmãos cogitavam se livrar do cantor por conta dos recorrentes excessos alcoólicos dele.

O fato é que Fink conseguiu, ao menos, traçar um quadro triste e tenso sobre os últimos meses do AC/DC com Bon – e mostrar a vida vazia, de certa forma, e solitária do vocalista na estrada e em Londres, o que indicaria que, além do álcool, a heroína também fez parte de seus últimos momentos.

Se há fartura de indícios e depoimentos que mostram algo novo – o uso de heroína -, o livro tem menos sucesso ao tentar estabelecer que as letras de "Back in Black" são de Bon Scott.

Fink entrevistou muita gente, colheu informações relevantes com namoradas, anates, roadies, ex-roadies, amigos próximos e músicos, mas ainda assim não foi possível cravar que Scott foi injustiçado.

O trabalho monumental de Fink, com toda a sua obsessão, sua má vontade para com os Youngs e eventuais furos nas teses conspiratórias que levantou, ao lado do livro "Os Youngs", é de longe a melhor coisa que já se produziu sobre a história do AC/DC.

Escritores importantes como Mick Wall contaram bem a história da banda, mas Fink foi além, fazendo uma pesquisa meticulosa e bem feita, misturando informação, opinião e interpretação, compondo um quadro diferente e menos laudatório da banda. Para quem gosta de história detalhada do rock, "Bon – A Última Highway" é uma boa surpresa neste começo de 2018.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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