Patti Smith faz uma celebração da união, do poder do povo e do amor
Maurício Gaia
18/11/2019 17h11
*Por Lucio Pereira – especial para o Combate Rock
O dia da Proclamação da República de 2019 começou chuvoso e até meio frio. Assim, foi difícil convencer alguém a ir mais cedo comigo ao Popload Festival. Suas atrações pareciam ter baixo poder de convencimento sobre amigos ou familiares a sair das tocas e encarar uma jornada ao Memorial da América Latina, espaço que particularmente aprecio para esse tipo de evento.
Cheguei ao local sem problemas durante o show do Cansei de Ser Sexy, banda que assisti pela última vez nos idos dos anos 2000. Parecia que nada havia mudado muito, boas canções em inglês sobre bases dançantes tocadas por uma banda de garotas descoladas. Legal, porém sem grandes novidades.
Em seguida foi a vez do Hot Chip. Levadas pop recheadas por teclados e batidas que traziam uma sensação meio anos 80. Aproveitei a deixa para dar uma volta pelo Festival e entender as ativações de marcas que merecem consideração por acreditar no poder da música e da cultura nesta fase deplorável da história brasileira. A banda britânica no palco chamou de volta minha atenção ao tocar um cover decente de "Sabotage" dos Beastie Boys ao final de sua apresentação.
O próximo show, da banda americana liderada por Jack White (ex-White Stripes) e Brendan Benson, além Jack Lawrence e Patrick Keller, os Raconteurs, mudou a chave e foi espetacular. Cumprindo aquilo que espero dos festivais, surpreendeu com o que há de melhor e mais novo na cena musical. A banda desceu a lenha nos instrumentos e causou curiosidade tocando as músicas de seu novo álbum "Help Us Stranger" (recomendo a audição em alto e bom som).
Canções fortes, ácidas e bem tocadas, como "Bored and Razed" (Entediado e Arrasado), "Help Me Stranger" (Ajude-Me Estranho), Somedays (I Don´t Feel Like Trying) (Alguns Dias (Eu Não Estou Afins de Tentar), entre outras, despertaram uma antiga vontade de entender as letras, analisar os contextos e seu processo criativo. Desde então tenho ouvido todas as canções repetidamente, buscando captar suas nuances e reviver os picos de energia que vi em cima do palco. Definitivamente um dos melhores shows que assisti nos últimos tempos. Um salve a esses bravos "Contadores de Histórias" ("Raconteurs" em tradução livre).
Para melhorar ainda mais a noite, já com a cabeça feita e aberta, nada melhor do que finalmente assistir a um show da poderosa Patti Smith. Fiquei seu fã a partir de 2011, quando ouvi sua voz ao vivo no palco de um festival de criatividade. As falas sobre liberdade, energia e a possibilidade das pessoas fazerem o que quiserem, expressando suas ideias com palavras, música e sob inspiração perene, foram marcantes. Ainda lembro seus conselhos essenciais:
"Não se acanhe, não seja constrangido, acredite em si mesmo e trabalhe duro."
Seu show foi energético e recheado de mensagens fortes e necessárias contra os males atuais da política e seus patéticos, malévolos, representantes. Ela sugeriu caminhos para superar esse estado das coisas e celebrou a união, o poder do povo e, essencialmente, o amor. Fiz questão de olhar para os lados e foi bom ver tantas pessoas apreciando o show sem exagerar de suas onipresentes telinhas. Aproveitei e fiz o mesmo, entoando em alto e bom som letras como
"(…) The power to dream to rule/(…) A força de sonhar as regras
To wrestle the world from fools/De arrancar o mundo dos idiotas
It' s decreed the people rule/Está decretado que o povo faz as regras
It' s decreed the people rule/Está decretado que o povo reina
I believe everything we dream/Eu acredito que tudo que sonhamos
Can come to pass through our union/Pode vir a acontecer através de nossa união
We can turn the world around/Podemos mudar o mundo
We can turn the earth' s revolution/Podemos revolucionar a terra
We have the power/Nós temos o poder
People have the power/O povo tem o poder"
Uma catarse estava em curso e fez o tempo ser percebido de outra forma, como se tivesse passado rápido demais. Seu impacto separou todos da sensação de estarmos solitários, com os corações quebrados, duros, desempregados e/ou sem esperança. Por alguns momentos foi possível sentir algum significado em nossas breves experiências mundanas. Obrigado pela reconexão, Patti. Seu show foi punk!
* Lucio Pereira é cientista social, conselheiro aleatório para assuntos intangíveis na Boca de Lobo produções e jurado no Music Video Festival 2019 e acredita que o Rock ainda tem boas surpresas para nos pregar.
Sobre os Autores
Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.
Sobre o Blog
O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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