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25 anos sem Kurt Cobain: legado importante, mas longe de ser revolucionário

Combate Rock

05/04/2019 15h00

Marcelo Moreira

Um garoto e sua banda ruim no momento certo e no lugar certo, por mais que muitos considero seu sucesso um engodo? Uma jogada de marketing brilhante ou uma revolução musical e comportamental?

Ainda hoje Kurt Cobain, o Nirvana e o movimento grunge causam polêmica mesmo quando muitos críticos musicais e jornalistas tentam passar a ideia de que são unanimidade em relação à qualidade e sua "revolução".

No dia em que, discretamente (estranhamente, por sinal), marca os 25 anos do suicídio do líder do Nirvana, aos 27 anos, em 1994, a controversa figura do guitarrista chama a atenção para dois fatos: como éramos felizes naquela época, por mais de odiássemos Nirvana e o grunge; e o caminho inexorável do rock para o underground nos limiares da terceira década do século XXI.

Não está longe da verdade quem diz que as bandas de Seattle, que compuseram o movimento grunge, estavam no lugar certo e na hora certa.

O mercado fonográfico já observava aquela cena energética e diferente e que poderia mostrar algo fora do hard rock, do pop plastificado e do metal extremo.

O que ninguém previa era o estouro e a identificação da molecada da época com aquele som fraco, derivativo do pior punk que se fez na década de 70. E colou, por incrível que pareça.

Kurt Cobain (FOTO: DIVULGAÇÃO)

O movimento grunge foi importante porque realmente deu uma chacoalhada no mercado, saturado de música artificial de supervalorização da imagem e dos excessos. A música era fraca, mas isso não importava. Ninguém esperava estourar e enterrar o passado. O negócio era apenas oferecer uma alternativa mais crua e pé no chão.

Kurt Cobain era uma alma atormentada que não pensava, ao menos no início, em liderar uma revolução – até porque ele foi o primeiro a reconhecer que não houve revolução alguma.

Queria fazer uma música honesta e mostrar que era possível fazer rock básico e alternativo sem ter de ficar dizendo amém a gravadoras e a executivos que só viam cifrões. Neste ponto ele estava coberto de razão e sua visão artística merece respeito.

Musicalmente, no entanto, o grunge patinou e não conseguiu atingir um patamar de qualidade que artistas que supostamente os influenciaram, como Sonic Youty, Husker Dü, Pixies e outras ótimas bandas ditas alternativas dos anos 80, atingiram.

Estes sim, em termos de qualidade e inovação, mereciam ser reconhecidos como líderes de um movimento importante e relevante artisticamente. Foram eles que fizeram o verdadeiro grunge – pena que, por uma série de motivos, eram underground demais para serem abraçados pelo mercado.

É inegável, entretanto, que, de alguma forma, Cobain e os concorrentes do Pearl Jam, Alice in Chains, Soundgarden e muitos outros atingiram os jovens que gostavam de rock na época.

O líder do Nirvana, um músico comum, um instrumentista esforçado e um compositor mediano, foi feliz em sua simplicidade e sua alma angustiada em falar diretamente para esse público, que por algum motivo rejeitou o rock alternativo já citado acima e e não se reconhecia na violência do thrash metal e nos excessos ridículos do hard rock. Aparentemente, o grunge era o que se tinha à mão e o mercado fonográfico foi rápido em aproveitar a oportunidade.

Não foi revolucionário, mas o grunge, é forçoso dizer, foi um movimento dentro da música pop com consequências duradouras até hoje.

Assim como o punk rock, como movimento estético e artístico incandescente e relevante, se autoconsumiu e esfarelou em pouco mais de cinco anos, o grunge praticamente desapareceu assim que Kurt Cobain morreu.

O Nirvana acabou e deu lugar ao Foo Fighters de seu baterista, Dave Grohl, que é uma banda muito melhor, mais criativa e mais legal. Pearl Jam e Alice in Chains flertaram com o hard rock mais maduro e coeso e acertaram no direcionamento, assim como o Soundgarden, entre idas e vindas, diversificava seu som, indo do heavy metal ao classic rock, todas tentando se desvencilhar do grunge, sendo que este se recusava a largá-los.

Cobain ganhou seu lugar definitivo na história do rock ao simbolizar uma tentativa de ruptura com um passado e com um tipo de política artística, ainda que esta tentativa de ruptura tenha sido apadrinhada – e aproveitada – por um dos inimigos, a própria indústria fonográfica capitaneada pelas gravadoras.

E não percamos as perspectiva de vista: Nirvana sempre foi muito menos do que os entusiasmados jornalistas da época fizeram crer que era.

Kurt Cobain era um guitarrista limitado e um compositor apenas medianos, mas que teve o mérito de fazer dos seus pesadelos e demônios internos um nicho artístico que atingiu em cheio um público cansado de escutar sobre carrões, garotas fáceis, porres homéricos ou romancezinhos baratos e bestas calcados em baladinhas dos anos 50. Na minha opinão, muito longe de ser revolucionários, tanto estética como musicalmente.

Talvez a data que marca os 25 anos da morte de Cobain mostre o músico com o real tamanho que ele tem dentro do rock. Pela importância que ele adquiriu, gostemos ou não, precisa ser lembrado e celebrado.

Anos atrás escrevi que o grunge nunca passou de um embuste. Os músicos do grunge eram um bando de moleques que não sabiam tocar querendo imitar tanto a música como a atitude punk, mas sem êxito, além de "criar" uma suposta estética (em todos os sentidos) despojada, mas que na verdade revelou apenas total falta de criatividade.

Foi um pouco difícil reconhecer, com o tempo, alguns méritos (mas não muitos) nas bandas e no tal movimento. Pearl Jam desde sempre foi a melhor banda daquela galera e adquiriu uma aura parecida com a do U2 diante da postura política e de enfrentamento do mercado.

O Soundgarden, apesar de sua inconstância, era o grupo mais apaixonado e aquele que tinha uma referência mais firme dentro do classic rock, enquanto o Alice in Chains sempre preservou certo mistério e um pezinho na esbórnia que sempre fez parte da vida na estrada das bandas de rock, ainda que isso significasse pouco aprendizado, a julgar pela morte inacreditável do vocalista Layne Staley por overdose de drogas.

Para mim, no entanto, o principal legado do grunge e do Nirvana chama-se Foo Fighters, possivelmente a melhor banda de rock de arena surgida desde os anos 90, ao lado do Pearl Jam. Devemos agradecer Kurt Cobain por isso – e, talvez, tão somente por isso.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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