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A defesa da liberdade de expressão precisa de mais atitude dos roqueiros

Combate Rock

08/03/2019 18h13

Marcelo Moreira

Reprodução da capa da edição brasileira do livro "liberdade de Expressão: Dez Princípios para Um Mundo Interligado", de Timothy Garton Ash

Sempre ouvi com muitas reservas  a tal frase "rock é atitude, senão não vale a pena escutá-lo". É atitude sim mas, antes de tudo, é música e precisa ser analisado dessa forma. E música geralmente não tem ideologia; se tiver, nenhum problema.

Já faz tempo que comecei a rever algumas de minhas posições a respeito. Rock tem de ter atitude assim, principalmente em momentos de graves problemas políticos e sociais. Atitude pode ser entendida como qualquer coisa, desde posicionamento político ou engajamento em qualquer tipo de campanha.

Neste Combate Rock defendemos de forma intransigente a democracia e as liberdades de expressão, opinião e de imprensa. Desde 2016 temos visto com muita preocupação a ascensão de grupos políticos e movimentos de direita bradando contra as liberdades individuais e defendendo posições indefensavelmente antidemocráticas, em especial quando pretendem legislar sobre os direitos individuais das pessoas.

Lá em 2013, quando houve as manifestações de junho e julho, víamos a pouca ou nenhuma relevância dos roqueiros e das bandas de rock naquele momento. Quem dava o tom musical na época dos protestos era o rap e o samba/MPB. O hit roqueiro que de vez em quando surgia era "Até Quando Esperar", uma música da Plebe Rude de 1986.

Por isso eu reforço aqui o que escrevi nesta semana, onde afirmo que o rock parece não se importar com a liberdade de expressão. As b andas de rock sumiram das emissoras de rádio, dos aplicativos de streaming da maioria dos ouvintes e também do imaginário popular de que rock é contestação.

Se ainda é, onde estão os roqueiros se posicionando contra as bobagens que o governo Bolsonaro anda fazendo ou sobre as frequentes declarações de autoridades contra a cultura, a educação e o conhecimento. Pouco se ouve dos  irados de sempre – José Mao Rodrigues, dos Garotos Podres, Tico Santa Cruz, do Detonautas Roque Clube  e, muito timidamente, de vez em quando, Dinho Ouro Preto, do Capital Inicial. É muito pouco para um gênero musical que foi ativo há 30 anos.

Quem não se lembra da efervescência política quando do impeachment de Fernando Collor de Mello, em 1992? O rock pegava fogo, novas bandas surgiam e as dos anos 80 pegavam pesado nas declarações em cima dos palcos e nas entrevistas.

Quase 30 anos depois, até mesmo Caetano Veloso está quieto, mesmo tendo sido atacado ferozmente por conta do videoclipe polêmico gravado com Daniela Mercury. Um mero videoclipe polêmico, e é isso que o meio musical, ainda meio atordoado, produziu para tentar contrapor a narrativa extremista de direita nas redes sociais, na imprensa e na divulgação dos fatos de um governo atabalhoado.

Muitos leitores e amigos discordaram em parte sobre a apatia do rock a respeito da liberdade de expressão em perigo em nosso tempo. Citaram alguns exemplos esporádicos de bandas de rock e metal que fazem letras de protesto e tentam pegar pesado em relação a descaminhos políticos brasileiros.

Onde estão esses artistas? Onde estão essas músicas? Por que não repercutem? Por que isso não vem à tona nos shows ou em manifestações públicas? Por que as vociferações e protestos ficam restritos a shows de bandas punks com público quém do esperado?

"Além de perceber um certo conservadorismo no rock e no metal da atualidade, tem outra coisa que atrapalha: o medo de perder trabalho. Já escutei de mais de dez artistas, de todos os calibres e públicos, que optaram pela omissão por medo de cancelamento de shows ou turnês. Essa gente teme reduzir muito os locais para tocar se começarem a se envolver políticoa, principalmente em cima do palco. É uma época muito ruim para a cultura, em todos os sentidos", disse-me nesta sexta-feira, 8 de março, um renomado produtor de shows e empresário, que pediu para não ser identificado.

Se realmente há gente partindo para cima em termos de protesto e se manifestando contra os descalabros que ameaçam a liberdade de expressão, estão nos subterrâneos da cultura ou seus pequenos nichos.

E não bastam apenas bandas punk ou metal underground produzirem material que lance o rock na berlinda da luta para preservar o conhecimento.

É preciso também que medalhões voltem ao ringue para mostrar que o rock é um fronte de resistência e de luta contra as forças antidemocráticas.

É um momento importante, onde o presidente da República repudia cartilhas do próprio governo que orientam as pessoas a evitar doenças sexualmente transmissíveis e gravidez na adolescência.

É um momento de luta contra uma ministra que ignora a realidade da violência contra a mulher e prega que meninos precisa dar "rosas" para as meninas e abrir a porta do carro para elas.;

Não basta ironizar e fazer memes nas redes sociais. Não basta apenas vociferar contra o governo e a polícia em shows de rock na periferia com pouco público.

Os principais nomes do rock nacional, do metal nacional, precisam se posicionar publicamente, ou assumir que estão sendo deliberadamente omissos e que não se importam com a liberdade de expressão.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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