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A explosão da música instrumental com Bixiga 70,Medusa Trio e Gabi Gonzalez

Combate Rock

12/02/2019 06h33

Marcelo Moreira

A música instrumental brasileira mostrou recentemente uma vitalidade surpreendente – mas apenas para aqueles pessimistas que costumam reclamar da morte do rock e do comodismo de instrumentistas espalhados por esse Brasil. É gente que perdeu o costume de frequentar os bares com música autoral ao vivo e de procurar coisas novas nas plataformas de streaming.

Os combos Bixiga 70 e Medusa Trio, além da ótima guitarrista Gabi Gonzalez, decidiram jogar na cara dos desavisados verdadeiras pancadas sonoras onde a música de qualidade dá o tom, com uma mistura fantástica de ritmos e instrumentos.

A cada novo trabalho majestoso fica difícil rotular que tipo de som faz o paulistano Bixiga 70. É jazz, é soul, é blues, é MPB, é samba, é rock e é tudo isso misturado.

"Quebra-Cabeça" é o mais recente CD, uma obra-prima de bom gosto, de energia e de alto astral. Como sempre, o naipe de sopros está à frente e faz uma condução primorosa de temas que, aparentemente, não passam de jam sessions.

O equilíbrio sonoro entre as várias sessões é perfeito, mas temos de ressaltar o duelo de saxofones dos virtuosos Cuca Ferreira (sax barítono e flauta) e Daniel Nogueira (sax tenor). A faixa-título é o melhor exemplo, com performances certeiras em cima de uma base grooveada extraordinária.

"Ilha Vizinha" mostra todo o talento da sessão rítmica, com Décio 7 (bateria), Rômulo Nardes (percussão) e e Marcelo Dworecki (baixo), que fazem uma cama precisa para que os metais brilhem. Cris Scabello, na guitarra, parece fazer tudo ficar mais fácil na condução da "orquestra", como em "Pedra de Raio" e na magnífica "Ladeira".

A guitarra é proeminente também na maravilhosa canção "Primeiramente", que ganha um ar "progressivo", com passagens intrincadas e uma avalanche sonora perpetrada pelos saxofonistas e pelo trombonista Douglas Antunes.

Não é exagero dizer que o Bixiga 70 é a principal banda de música instrumental na atualidade no Brasil, sela pela qualidade, seja pela variedade de temas que despeja nos ouvidos da plateia.

Também abraçando o experimentalismo, até certo ponto, o Medusa Trio escancara seu leque de influências no álbum "Medusa Trio, 10 Anos!". Orientado para a guitarra do santista Milton Medusa, o trio recebeu uma constelação de amigos para celebrar o rock e blues praticados por músicos excelentes.

Sergio Hinds, Robertinho de Recife, Fernando Cardoso, Willie de Oliveira, André Cristóvam e Mozart Mello fazem participações especiais no CD, explorando o hard rock, o blues rock e até o rock progressivo. O resultado é primoroso.

 "Ganhar e Perder" tem a voz de Willie de Oliveira, ex-integrante de Rádio Táxi e Tutti Frutti, em um hard rock vigoroso, com uma guitarra contagiante que faz lembrar o saudoso Hélcio Aguirra, do Golpe de Estado, morto há cinco anos.

O destaque, no entanto, é a "colagem sonora" de "6 Cordas & Muitas Alegrias", um jazz fusion que se transforma em rockj progressivo com a contribuição dos mestres guitarristas convidados.

Sérgio Hinds (O Terço), Robertinho de Recife, Mozart Mello (Terreno Baldio) e André Christóvam, um dos pioneiros do blues no Brasil, participaram de uma verdadeira seção de criação para que pudessem executar suas partes, som solos alternados e dando uma coloração única para uma faixa extraordinária.

"Guitarras Brasileiras" é uma verdadeira celebração do rock brasileiro, assim como "Anos 70" incorpora elementos da música brasileira, com uma performance endiabrada de Milton Medusa.

Já "O Blues do Rock" é mais uma ode à guitarra, só que desta vez resgatando referências variadas – de Rory Gallagher a Robin Trower, de Martin Barre (Jethro Tull) a Mick Taylor (ex-Rolling Stones).

Não se trata apenas de virtuosismo ou perfeição técnica – tudo isso tem de sobra no CD. Milton Medusa, Luis Pagoto (bateria) e Rogério Duarte (baixo) transbordam paixão na maneira como tocam. É um feeling extraordinário, extrapolando a simples execução do blues rock – algo bem raro de se ver, sendo que no Brasil temos também como exemplos o tecladista Adriano Grineberg, o guitarrista Edu Gomes (ex-Irmandade do Blues) e multi-instrumentista Vasco Faé, entre outros.

 

Fé no blues e é na estrada com elas. Gabi Gonzalez e Dani Ela, do Hard Blues Trio, destacaram-se no ano passado dentro do gênero musical ajudando a dar ma cara diferente a um mundo ainda bastante dominado pelos homens.

Elas se juntam às irmãs Tatiana e Nina Pará (guitarra e bateria, respectivamente), à cantora Bia Marchese e às gaitistas Sarah Messias e Tiffany Harp, entre outras, a um clubinho que deve crescer ainda mais: ao das meninas que mergulham de cabeça no jazz e no blues.

Gabi Gonzalez é guitarrista e professora no Conservatório Souza Lima. Toca muito e tem uma habilidade peculiar para tocar blues e música regional brasileira.

"Com Elas" é o seu mais recente CD, lançado no ano passado pela Rock Company Records, do visionário e persistente Valmir Zuzzi.

Foi com a ajuda do Elas Quarteto, o qual ela integra, que ela gravou tudo com simplicidade e talento – completam o time a baterista Bianca Predieri, a baixista Gê Ruiz e a percussionista Roberta Kelly, que ainda convidaram a saxofonista Sintia Piccin e a baterista Priscila Brigante.

Totalmente instrumental e composto por Gabi, "Com Elas" teve como grande sacada a produção limpa e clara de Lucas Gatti, que respondeu ainda pela captação, mixagem e masterização.

Tem muito blues e rock, mas tudo misturado com ritmos brasileiros, o que confere um ar de "world music" ao trabalho. Gabi adora um fraseado jazzístico, aplicando duetos interessantes com Gê Ruiz, mas tem o cuidado de não atropelar ninguém. Ela é a estrela, mas dá espaço para todas brilharem.

"Com Elas no Groove" abre oCD de forma contagiante, com todas as meninas mostrando as suas credenciais. E uma jam session bacana, bem ensaiadinha (santa hipocrisia!), com a guitarra conduzindo toda a melodia em cima de um baixo ziguezagueante.

"Manaê" e "Da Chuva" já se embrenham nos rimos brasileiros e o quarteto se dá bem, mostrando destreza e qualidades técnicas elogiáveis.

O blues e o jazz dão as caras em "Com Calma", Lídia" e "Soutien no Abajour", esta a melhor do álbum, com linhas variadas de guitarra e baixo e uma percussão contagiante e precisa. "Indo Para Camburi" tem uma levada mais bossa nova, com um trabalho muito bacana de guitarras e violões.

Gabi Gonzalez gravou provavelmente o trabalho de música instrumental mais instigante e interessante do Brasil no ano passado, ao lado do ótimo álbum "Quebra-Cabeça", do estupendo grupo Bixiga 70.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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