Judas Priest mostra vigor e qualidade; Alice in Chains aposta nos clássicos
Combate Rock
25/11/2018 06h36
Flavio Leonel – do site Roque Reverso
Alice in Chains e Judas Priest passaram mais uma vez por São Paulo, desta vez como bandas principais da segunda edição do festival Solid Rock, no dia 10 de novembro. Com a união de tribos diferentes do rock em torno do som pesado, as duas bandas entregaram shows que satisfizeram seus fãs no Allianz Parque, a Arena do Palmeiras.
De um lado, o Alice in Chains trouxe um repertório recheado de clássicos e fez um show quase perfeito.
Do outro, a majestade Judas Priest apostou na maestria do incomparável vocalista Rob Halford para proporcionar uma apresentação que, se não foi a melhor em solo paulistano, ficou longe de decepcionar.
O público presente ficou bem aquém da importância das bandas na história do rock. Apesar do Allianz Parque comportar perto de 50 mil pessoas para shows, a organização do festival optou pela não utilização das Cadeiras Superiores, deixando o número de fãs restrito aos setores de Pista Vip, Pista Comum e Cadeira Inferior.
Preço elevado, quantidade enorme de shows marcados para o mês de novembro em São Paulo e a crise econômica no País são elementos fáceis para justificar o público bem menor do que os verificados, por exemplo, em shows do Iron Maiden, Guns N' Roses e Coldplay , no mesmo Allianz Parque, em anos anteriores, quando mais de 45 mil pessoas estiveram na Arena do Palmeiras.
Até o fechamento deste texto, o Roque Reverso não havia obtido o público oficial do show, mas, visualmente, ninguém apostaria que o Allianz Parque recebeu mais do que 30 mil pessoas.
Cobertura prejudicada
A cobertura do festival por parte deste veículo jornalístico ficou, por sinal, profundamente prejudicada pela negativa, por parte da assessoria de imprensa da Time For Fun, do credenciamento da equipe do Roque Reverso. Sem a opção das credenciais de imprensa e com os preços salgadíssimos do evento, restou a este veículo assistir aos shows da Pista Comum, depois de aproveitar um bem-vinda promoção de desconto de 60% do site Peixe Urbano.
Tanto o público como qualquer jornalista sabe muito bem que, quanto mais perto do palco, melhor é a possibilidade de uma análise mais detalhada dos shows. Este veículo, que sempre preza não apenas pelo bom texto, mas também pela possibilidade de fotos e vídeos que tentem repassar mais claramente o que foi cada apresentação, obviamente, não conseguiu fazer a cobertura desejada, mas não desistiria jamais de estar presente num evento deste porte para trazer algo aos fãs e fiéis leitores.
Causa estranheza, no entanto, a tendência recente da Time For Fun em negar credenciais em vários shows ao Roque Reverso. Desde que este veículo criticou, em 2016, a qualidade ruim do som de um show do Whitesnake no Credicard Hall, em evento organizado pela produtora, passou a receber uma quantidade de "nãos" quase sucessivos, com exceção, ironicamente do Solid Rock de 2017, no mesmo Allianz Parque. Desde 2016, restou, portanto, a este veículo: ou bancar os custosos shows ou ser salvo pela ajuda de bravos jornalistas colaboradores que decidiram transmitir o que captaram nas apresentações.
O Roque Reverso deixa bem claro que não faz parte de "panelas" para agradar produtores. Não faz parte de um pequeno grupo, mas existente, de pessoas que só porque conquistaram credencial, não podem criticar para não perderem futuras possibilidades de ver shows. Não estamos aqui para ficar elogiando quando vemos coisas erradas. E, quando vemos coisas certas e espetaculares, retrataremos, como manda o bom Jornalismo. Não somos assessores de imprensa ou de marketing, somos jornalistas.
Itaipava quente e a R$ 12
Como também este veículo costuma ser porta-voz de críticas feitas pelo público durante os shows, a grande reclamação sobre a organização do Solid Rock de 2018 ficou por conta da cerveja. Com preço elevado de R$ 12 e, muitas vezes, quente, a bebida ficou longe de agradar a galera presente. Reclamações sobre as opções de comida também foram ouvidas pela reportagem.
O som, que havia gerado reclamação justamente na Cadeira Superior em 2017, não foi motivo de reclamação nos shows do Alice in Chains e do Judas Priest. O Roque Reverso chegou a ouvir queixas, sim, sobre o som da banda da primeira banda a tocar no evento, o Black Star Riders.
Alice in Chains
O Alice In Chains subiu ao palco poucos minutos depois do horário esperado das 19h30. Com o horário de verão em São Paulo, a banda apareceu ainda sem o anoitecer consumado, com um pouco de claridade. Logo após a introdução, feita com a "Musica Ricercata, II", de György Ligeti, que foi amplamente usada no filme "De Olhos Bem Fechados", de Stanley Kubrick, a banda norte-americana clássica de Seattle emendou uma sucessão de hits, duas vezes interrompidos por músicas do álbum "Rainier Fog", lançado em 2018.
Logo de cara, as guitarras pesadas da banda trouxeram as ótimas "Check My Brain" e "Again", a primeira presente no disco de estreia ("Black Gives Way to Blue", de 2009) do vocalista William DuVall e a segunda do último álbum de estúdio ("Alice in Chains", de 1995) do saudoso vocalista Layne Staley.
O som era alto, denso e nítido, até mesmo para quem estava nas últimas fileiras da Pista Comum. Logo após a novíssima "Never Fade", o grupo trouxe as ótimas "Them Bones" e "Dam That River", do grande disco "Dirt", de 1992. Era difícil, para quem gosta de um bom rock pesado, deixar de balançar a cabeça, já que o som cativava bastante.
Após a faixa "Hollow", do disco "The Devil Put Dinosaurs Here", de 2013, o Alice in Chains colocou mais lenha na fogueira com três clássicos da carreira: "Down in a Hole", "No Excuses" e "We Die Young", respectivamente do disco "Dirt", do EP "Jar of Flies", de 1994, e do álbum de estreia "Facelift", de 1990.
Da melodia excepcional de "Down in a Hole", passando pelo balanço de "No Excuses" e chegando ao peso de "We Die Young", as guitarras pesadas e os vocais dobrados, que são uma marca da banda, encantaram o público, mostrando que o Alice in Chains tem muito a oferecer, que Jerry Cantrell continua um monstro em seu instrumento e que William DuVall foi a pessoa mais do que certa para substituir Layne Staley.
Após a boa "Stone", também do disco "The Devil Put Dinosaurs Here", a banda trouxe dois petardos clássicos: "Angry Chair", do "Dirt" e "Man in the Box", do disco de estreia. Obviamente, o Allianz Parque inteiro cantou, pulou e agitou como se não houve amanhã, no auge do espetáculo.
Interessante notar que o telão central do palco foi pouco usado durante o show. Com raras exceções, como em "Down in a Hole", alguns efeitos bacanas que haviam sido vistos nas passagens do grupo pelo SWU de 2011, no Rock in Rio de 2013 e no show de São Paulo , também em 2013, não apareceram. Os efeitos de vídeo que marcavam, por exemplo, "Angry Chair", não foram visto no telão central, que muitas vez completamente apagado.
Depois do momento espetacular dos dois megaclássicos, o grupo trouxe ainda a novíssima "The One You Know" e deixou para o final duas músicas também marcantes da carreira: "Would?", que trouxe o brilho do sempre simpático "Mike Inez" no baixo, e "Rooster", que emocionou a todos com a performance excepcional de William DuVall.
Talvez, o show do Solid Rock não tenha superado o ótimo show de 2013 no Espaço das Américas, mas ainda assim deve ter sido um das melhores apresentações do ano em São Paulo. A ótima "It Ain't Like That" foi, para este jornalista, a ausência mais sentida, mas isso não comprometeu o show de maneira alguma.
Judas Priest
Passado o show do Alice in Chains, foi a vez do dinossauro Judas Priest subir ao palco com todo o repertório que o verdadeiro fã de heavy metal gostaria de ver.
A banda trouxe logo de cara a música que dá nome ao novíssimo álbum "Firepower", de 2018. Com Rob Halford esbanjando boa forma nos vocais, o Judas Priest seria comandado pelo seu grande símbolo num show que foi diferente das apresentações anteriores em São Paulo pela escolha de músicas menos conhecidas de quem não era fã de carteirinha.
"Running Wild" (do disco "Killing Machine", de 1978), "Grinder" (do clássico "British Steel", de 1980) vieram para fortalecer esta análise e, se não fosse a escolha de "Sinner" (do "Sin After Sin", de 1977) e da espetacular "The Ripper" (do imprescindível "Sad Wings of Destiny", de 1976), as primeiras músicas do show ficariam restritas ao grupo de canções menos badaladas da banda.
Quem é fã de carteirinha, sem a menor dúvida, vibrou, mas ficou claro que a escolha não levantou a parte maior do público como os shows de anos anteriores. Quem foi ao Monsters of Rock de 2015, e viu duas noites mágicas e seguidas de Judas Priest, ou quem viu a passagem da banda por São Paulo em 2011, sabe o que este jornalista está dizendo.
"Lightning Strike" (disco novo), "Desert Plains" (do álbum "Point of Entry", de 1981) e "No Surrender" (disco novo) mantiveram o ambiente do Allianz Parque, que era mais de contemplação pelo momento grandioso de ver um espetáculo do Judas Priest, do que de êxtase completo.
Estava quase tudo lá: efeitos bacanas no telão, mudanças de roupa sem moderação de Rob Halford, o baterista Scott Travis arrebentando na bateria e o baixista Ian Hill com sei jeito inconfundível no baixo. Só não estavam aqueles que foram imprenscindíveis para consolidar a imagem do Judas: os guitarristas K. K. Downing (que deixou a banda em 2011) e Glenn Tipton, que deixou de tocar nas turnês do grupo depois da progressão da doença de Parkinson.
Não que os guitarristas Richie Faulkner e Andy Sneap não tenham qualidade e categoria para tocar na banda, mas a união dos dois, para quem já havia visto o Judas Priest em outras ocasiões, pareceu algo muito comum para uma banda incomum como esta. Faltou algo ali, por mais que o fã de carteirinha do grupo possa não concordar.
Os clássicos "Turbo Lover" e "The Green Manalishi" (este cover do Fleetwood Mac) serviram para inflamar que ainda não estava agitando no show do Judas Priest. Mas foi depois que a banda executou Night Comes Down (do disco "Defenders of the Faith", de 1984), a nova "Rising From Ruins", com a introdução gravada de "Guardians", e "Freewheel Burning" (também do "Defenders of the Faith", que o Allianz Parque definitivamente se inflamou de vez.
Com o clássico "You've Got Another Thing Comin'", do disco "Screaming for Vengeance", de 1982, o Judas Priest iniciou uma sequência de hits que seguiu até o fim da apresentação. Com Rob Halford regendo a plateia e arrasando nos vocais, a Arena do Palmeiras era uma verdadeira festa do metal.
Em "Hell Bent for Leather", do "Killing Machine", o vocalista voltou ao palco com sua tradicional motocicleta, gerando delírio generalizado na arena.
Para fechar a primeira parte do show, o Judas Priest trouxe nada menos que a arrasa-quarteirão "Painkiller", que abriu uma série de rodas de mosh na Pista do Allianz Parque. Com vocais agudos e ensurdecedores, ele ratificou a condição de vocalista supremo do heavy metal.
Depois do breve descanso, o bis trouxe mais uma trinca de clásicos: "The Hellion/Electric Eye", "Breaking the Law" e "Living After Midnight" é a típica sequência que somente um grupo do quilate do Judas Priest pode oferecer num show de rock pesado. Felizardos são aqueles que, em algum momento da vida, puderam testemunhar momentos como este, proporcionado por um dos maiores símbolos do heavy metal.
A certeza de quem esteve no Allianz Parque era de que havia visto bons shows e de que valeu a pena demais estar ali. Independente de um ou outro reparo, a noite do sábado contou com uma verdadeira festa do rock pesado para a cidade de São Paulo.
Sobre os Autores
Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.
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