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Nós quisemos os melhores, e tivemos os melhores: o Kiss e o nosso tempo

Combate Rock

18/10/2018 07h00

Marcelo Moreira

Nesta reta final de 2018 o Kiss resolveu acrescentar mais uns quilos de más notícias. Depois de Black Sabbath e Rush pararem definitivamente e Deep Purple e Scorpions (será?) estarem terminando as suas turnês de despedida, agora é a vez do quarteto mascarado norte-americano informar que vai parar.

Poucos estão dando bola para a informação, escaldados pelas supostas turnês de encerramento de carreira que fizeram em 1997/1998 e 2004. Com a maior desfaçatez e cara de pau, esqueceram nos anos seguintes que já tinham se despedido dos palcos e das turnês e continuaram fazendo shows.

Os líderes, Paul Stanley e Gene Simmons, confessaram diversas vezes que têm dificuldades para lidar com o fim da máquina de criar dinheiro e hits que criaram há quase 50 anos.

O guitarrista e vocalista Stanley chegou a aventar a hipótese de manter o Kiss na ativa sem nenhum de seus integrantes originais e fundadores, com a possibilidade de ele e o baixista e vocalista Simmons tocarem de vez em quando. A ideia parece que não colou, e foi chamada de estapafúrdia por um crítico musical de uma revista norte-americana.

Algumas bandas já fizeram essa barbaridade, como o Blackfoot, ícone do southern rock dos anos 70 – seu líder, o guitarrista Ricky Medlocke, que também toca no Lynyrd Skynyrd, empresaria o Blackfoot e fez questão de escolher pessoalmente os músicos da tual versão sem ele.

Só que o Kiss não é o Blackfoot, uma banda mediana que teve sucesso restrito. O Kiss é uma instituição mundial do entretenimento, cuja influência ultrapassa o mundo da música.

É uma fábrica de dinheiro que ganha rios de dólares com quinquilharias e toda a sorte de produtos? Também é, mas prefiro ressaltar a sua importância artística e musical.

Seu impacto foi tão grande quando estourou, em meados dos anos 70, que provocou mudanças profundas na maneira de se fazer entretenimento nos Estados Unidos e revolucionou o rock com suas empreitadas na área do marketing e do consumo.

Se a maioria das pessoas achavam que os Beatles eram heróis, os quatro integrantes originais dos Kiss assumiram, com suas fantasias e máscaras, que eram mesmo heróis e que tinha surgido para "salvar" o rock.

É a mais pura verdade. O Kiss salvou a vida de muitos moleques da mediocridade e do tédio, impulsionando-os a ter uma vida artística e agitada. Encarnou como nenhuma outra banda de rock os fundamentos do empreendedorismo e o espírito bem norte-americano de "agarrar e criar as suas oportunidades".

Povoou o sonho de garotos de todas as idades, e não só daqueles que viveram os anos 70, mas de todos até hoje que um dia sonham com a vida nos palcos. Isso explica, em parte, o porquê de milhares de crianças de 5, 10 anos de idade aparecerem maquiadas a cada show da banda no mundo inteiro. As maquiagens do Kiss são uma das marcas mais poderosas da história do entretenimento mundial.

Uma banda machista e chauvinista? Certamente que sim em boa parte do tempo, até porque era parte de seu meio, os anos 70 ainda tentando assimilar o fim do flower power e ada era hippie e prestes a entrar numa era narcísica e de egoísmo individual profundo que caracterizaria parte da população jovem norte-americana dos anos 80.

Apesar disso, as meninas foram pouco a pouco sendo conquistadas com o apelo comercial de forte apelo sensual e erótico, que tinha como base o mito dos super-heróis. Era rock pesado, mas bem longe da pauleira que viria a ser o heavy metal. O som era agressivo, mas na medida para não desagradar aos ouvidos mais sensíveis.

A pretensão era que tivessem um reconhecimento de sua competência musical que os aproximassem de seus ídolos, os Beatles. Não chegaram a tanto – na verdade, nem perto -, mas nem foi preciso: a marca Kiss extrapolou todas as expectativas e os catapultaram aos mais altos pódios possíveis.

Gene e Paul não eram e nunca foram Lennon e McCartney, mas dificilmente esses dois conseguiriam ombreá-los no apelo de marketing e na criatividade mercadológica.

O Kiss é uma instituição e símbolo do nosso tempo. Integra uma parte incrível da infância e da adolescência de milhões de fãs de rock que aprenderam a curtir música de forma despretensiosa, mas apaixonada, com um mix de histórias em quadrinhos, filmes B e hard rock simples, mas de muito apelo emocional.

Os integrantes do Kiss queriam ganhar muito dinheiro e reconhecimento. Ficaram milionários, mas conseguiram muito mais: estraram para a história.

 

 

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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