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Bom gosto e ousadia dominam o novo trabalho do Maestrick

Combate Rock

22/08/2018 06h48

Julio Verdi – do blog Ready to Roll

Quando nos referimos ao assunto rock and roll (e sua família de subestilos), é muito comum se ouvir que "o rock está estagnado", ou "hoje apenas se copiam coisas do passado, nada se cria".

Em muitas situações isso se aplica sem dúvida. Mas não se pode afirmar que não seja criado algo de interessante e de supremo valor artístico, advindo de músicos que ainda hoje atuam na criação autoral do rock. O que vamos abordar a seguir é apenas mais uma prova cabal disso.

Quando lançou, em 2011, seu primeiro álbum, "Unpuzzle!", a banda paulista Maestrick não só cravou um dos melhores discos de estreia de uma banda nacional, como surpreendeu crítica e público com uma coleção de ótimas e bem produzidas canções, cuja maior referência se estabelecia no prog-metal.

Após o álbum ser também lançado na Europa, EUA e Ásia, a banda fez diversos shows no Brasil e até no Chile. Em 2013, em meio ao processo de composição do que viria a se tornar o sucessor de "Unpuzzle!", a banda soltou o EP "The Trick Side Of Some Songs", com versões de artistas que foram algumas de suas influências confessas, como Queen, Dio, Jethro Tull, Floyd, Beatles e outros.

Em 2018, o grupo anunciou o fechamento de contrato com a gravadora japonesa Marquee/Avalon, uma das grandes gravadora mundiais, para distribuir seu novo álbum "Expresso Della Vita – Solare" no mundo todo. No Brasil o disco saiu em 28 de junho de 2018, após uma noite de lançamento no evento do Central Panelaço, em São Paulo (SP), que contou com a presença de músicos como João Gordo (RDP). O disco, que saiu anteriormente no Japão, recebeu a nota 86/100, da revista japonesa Burrn!.

Não há como destacar a atuação diferenciada de um ou outro músico, visto que todos mostraram evolução técnica ao longo dos últimos anos. O que mais sente-se no entanto é a amadurecida capacidade de composição deles. A bateria é precisa em andamentos e viradas e um baixo técnico sempre na cara, junto a levadas de muito bom gosto de teclados e vocais carregados com a dose certa de dramaticidade.

O que o Maestrick apresenta então em "Solare"? Se tivesse uma expressão que pudesse resumir o trabalho esta seria "diversidade criativa". Mas é muito pouco para definir o que Fábio Caldeira (vocal/teclado), Heitor Matos (bateria) e Renato Montanha (baixo) conseguiram registrar no álbum.

Estamos diante de uma dos mais criativos, inteligentes, interessantes e cativantes discos que uma banda de heavy metal já lançou no Brasil. E vou mais além, não é fácil lembrar de uma banda em todo o globo que tenha feito recentemente um trabalho com tão intensa densidade artística.

O trio que capitaneia a banda, se juntou ao renomado produtor brasileiro Adair Daufembach (Project46, John Wayne, Hangar), que foi o responsável por registrar também as guitarras do disco, que se mostram por demais surpreendentes. Recentemente o tecladista Neemias Teixeiraingressou na banda. Se o primeiro álbum já trazia muita variação ainda que bem calcado nos trilhos do prog-metal, "Solare" foi mais além e conta com um oceano de variações e arranjos, costurados por diversas linha de instrumentações (viola caipira, violoncelo, flauta, violino, ukulele, etc), mas ainda assim conseguiu se mostrar mais direto e objetivo.

Nele vemos elementos de metal clássico, melódico, jazzisticos, influência de rock clássico e muita world music. Após "Origami" abrir o disco, com a nítida intenção de mesclar muitos momentos melódicos que se seguem posteriormente no disco, nossa viagem no expresso segue com "I a.m. Living", que vem com um metal direto e grudento, com um forte refrão (artifício sabiamente utilizados em outras músicas).

O que se percebe no disco é que bateria, baixo e teclado ditam o formato das composições, ainda que as guitarras trazem o elo de ligação entre os 3 elementos, soando também bem diversificada, em solos e riffs. "Rooster Race" segue a linha mais direta da segunda faixa, mostrando muitos elementos de brasilidade ao longo de sua execução.

Em "Daily View" a direção do teclado remete a influências do Queen, e tem levada com a suavidade vocal e seus backings. "Waters Birds" caminha nessa direção de variação constante, apresentando uma levada orquestral, um belo trabalho de criação de guitarra, que se reveza com a força das vozes. "Keep Trying" enxerta momentos de hard rock e AOR na obra, se mostrando direta e onde as vozes tem uma força dramática, ancorada pelos backings.

Em "The Seed" um coral de dezenas de vozes introduz mais um tema que mistura peso, velocidade e vocais fortes. Chegamos em "Far West". O tema é conduzido pelo baixo, que abre os primeiros movimentos. A música tem seu tempo de velocidade, e clima conduzido por voz e guitarra que nos transporta sim para um clima western, como propõem o titulo e a letra da música.

A seguir o expresso aporta na estação de "Across the River", que poderia ser classificada como a mais radiofônica do disco. O início com cordas dedilhadas e vocal suave e dobrado, com aura de blues, dá espaço minutos depois à pegada pesada, com belas intervenções melódicas da guitarra.

E eis que chega "Penitência", a única faixa em português do disco. E acredito que ela seja a passagem mais polêmica do álbum. Começa uma levada com influências de músicas nacionais em sua cadência rítmica (incluindo as percussões) e referências a personagens do folclore e história do Brasil.

Mas ao contrário por exemplo de "Ratamahatta", do Sepultura, mais uma vez ela ganha contornos variados por conta da força das vozes, de Fábio bem como das cantoras principais dos backings, Danielle e Carol, além de outras participações.

Cada um terá suas preferências no disco, obviamente. Para mim, as duas faixas que fecham a obra se encontram com essa condição. "Hijos de la Terra" inicia-se com a intenção dessa interação entre a world music e o heavy metal. Uma música poderosa, onde os elementos se entrosam de maneira simétrica.

Bateria perfeita, elementos sonoros andinos e a inclusão precisa da cantora chilena Cinthia Santibañes, fazendo os refrães cantados em castelhano. Tem-se. a sensação que essa faixa será bem aclamada internacionalmente, muito por conta da dramaticidade envolvida.

E por fim, a viagem acaba em "Trainsitions", um trocadilho com o conceito do álbum e a transição que deverá ser encontrada na segunda parte do "Expresso Della Vita", álbum que será lançado nos próximos anos, trazendo a continuação do conceito de "Solare". Esta última faixa é uma suíte, dona muito bom gosto em sua melodia e um refrão daqueles que a gente fica cantarolando por dias.

Isto é apenas uma síntese de cada música, mas elas tem muitos mais detalhes, que a cada audição nos são revelados. A inserção de dezenas de elementos musicais se mostram corajosa, sem ser pretensiosa ou forçada.

O álbum conta com a presença de diversos músicos convidados, como Fernando Freitas (percussão), Maurício Lopes (backings/vozes), Kevin Miura, Rosecler Caldeira, Bárbara Silva (vozes), dentre várias outras pessoas que participaram dos corais.

Em "Solare", o Maestrick foi ousado, se desafiou, foi ambicioso e conseguiu emplacar um álbum que será evidentemente muito elogiado mundo afora. Gravaram um majestoso álbum, assinaram com uma major e começar sua primeira tour internacional. Todos elementos que devem fazer com que o nível de sua carreira musical seja elevado a patamares muito maiores.

 

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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