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Chico Buarque comprova: ter opinião faz mal à saúde (física e mental)

Combate Rock

23/12/2015 15h00

Marcelo Moreira

Desconsolada, uma jovem de pouco mais de 20 anos postou um comentário em uma notícia do portal UOL nesta terça-feira triste (22): "Regredimos à Idade Média e parece que todo mundo está gostando disso".

Ela se referia a uma notícia, com vídeo, a respeito de uma discussão bizarra entre o cantor e violonista Chico Buarque e algumas pessoas, no Rio de Janeiro, na saída de um restaurante.

O sambista, um dos patrimônios culturais do Brasil e da humanidade, é conhecido pelo seu apoio de muitos anos ao PT e foi interpelado de forma grosseira e mal-educada por um grupo de rapazes que fora "tirar satisfação" com o artista por conta de suas "opiniões políticas".

Esse patrulhamento asqueroso também vitimou gente como o vocalista Tico Santa Cruz, da banda Detonautas Roque Clube, outro que tem posiçções mais à esquerda, e o cantor Lobão, crítico contumaz e ferrenho do PT e do governo petista de Dilma Rousseff.

Chico Buarque, ao centro, sendo interpelado na calçada (FOTO: REPRODUÇÃO)

O acirramento político entre apoiadores e críticos do governo federal petista desde a eleição presidencial do ano passado provoca cenas lamentáveis e constrangedoras em ambos os espectros políticos e revela características do povo brasileiro: que recentemente ficaram explícitas: a pouca disposição ao debate, a intolerância, o desrepseito geral a todas as instituições e, o mais grave, a desinformação quase que deliberada.

Os fascistas e totalitários, aparentemente, estão conseguindo o impensável desde a redemocratização do Brasil, em 1985: transformar a opinião e a divergência  em "crimes", passíveis de serem punidas com constrangimentos, ataques verbais e, pasmem, a restrição de movimentos e do direito de ir e vir – forçar alguém a deixar de frequentar abres e cinemas é exatamente isso, não é?

Quando foi que perdemos a capacidade de conversar e discordar? Será que foi no momento em que palmeirenses e corintianos perderam o direito de torcer lado a lado na arquibancada, assim como flamenguistas e vascaínos?

Quando foi que deixamos de nos importar com os direitos básicos da vida em sociedade, como o de opinar e o deixar os outros falar, ou de simplesmente admitir a existência do contraditório?

Quando um artista importante e ministros ou ex-ministros de Estado são interpelados com violência e intimidação em restaurantes e locais públicos por conta de suas funções ou opiniões políticas – e a ponto de terem de de abandonar os locais -, é porque a democracia deixou de fazer parte dos fundamentos das vidas das pessoas (*).

Muitos teóricos e especialistas vão resgatar a tese de que foi o PT que sempre estimulou, desde a primeira campanha presidencial de Lula, em 2002, a divisão da política nacional em facções, sempre apontando o dedo para os "corruptos e fisiológicos" e assumindo uma posição moral de superioridade – coisa que desapareceu com os seguidos casos recentes de corrupção. O clima de arquibancada e de briga de gangues, portanto, seria uma reação tardia à política de confronto petista.

Embora tenha algum fundamento, apesar de altamente questionável, não justifica o comportamento hidrófobo lamentável e perigoso de confrontação e enfrentamento que predomina no ambiente social e político do País.

A perda de referências de liderança em muitas áreas da sociedade, em especial na política e na economia, produziu um vácuo de ideias e de inteligência que tornam muito difícil o restabelecimento de qualquer tipo de diálogo.

Em um tempo em que a simples cor de uma camiseta ou a emissão de uma opinião se tornam motivo de briga e troca de socos na mesa do bar, é porque não só a educação foi embora, mas também a capacidade de dar bom dia sem te de se preocupar com as reações.*

(*) Só para esclarecer, recentemente em São Paulo o ex-senador Eduardo Suplicy (PT), hoje secretário de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, foi covardemente atacado verbalmente em uma livraria por um bando de celerados, liderados por uma mulher encolerizada e totalmente desprovida de educação.

Os ex-ministros Alexandre Padilha (Saúde) e Guido Mantega (Fazenda), que integraram o governo Dilma, foram hostilizados em restaurantes. Por outro lado, as hostes petistas elegeram Lobão como alvo principal, com toda a sorte de ameaças feitas pela internet.

 

 

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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