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Debate político entre roqueiros foi feito ao som de machadadas e pancadaria

Combate Rock

28/10/2014 06h44

Marcelo Moreira

A eleição presidencial brasileira, que transformou as redes sociais em ringues de lutas marciais, afetou de forma chata o mundo do rock nacional. Esqueça as pataquadas de gente como Lobão e Roger Moreira (Ultraje a Rigor), que aceitaram o papel de bufões de um pensamento político conservador e muitas vezes ofensivo contra adversários/inimigos políticos. Gente esclarecida e com currículo importante no rock e no metal nacional se digladiou com termos fortes e pesados.

O cantor Percy Weiss, por exemplo, nome importante do rock dos anos 70 e 80, com passagens pelo Made in Brazil, em nenhum momento escondeu sua oposição ao PT e a Dilma Rousseff, mas fez postagens no Facebook com ares de tragédia em caso de vitória petista, assumindo uma postura antiesquerdista que deve ser respeitada, mas que abusou bastante do chamado terrorismo político – prática desagradável também perpetrada por simpatizantes do PT.

Weiss foi atacado por adversários políticos dentro do meio musical, mas segurou a onda e manteve suas opiniões polêmicas. Entre outras coisas perigosas, compartilhou posts absurdos que acusavam Lula e Dilma de estarem por trás de um suposto envenenamento do doleiro Alberto Youssef, preso por envolvimento em fraudes e desvios de dinheiro na Petrobras. E termina pedindo "imnpeachment já" da presidente. Em outro, dissemina informação onde um militar morto recentemente acusa Lula de matar dois desafetos (!!!!!!!!!!!). Apoiando Aécio Neves PSDB), continuou exagerando ao dizer que Brasil estava virando Cuba e que apoiava quem não permitiria que isso acontecesse.

Jaime Filho, blogueiro que mantém um interessante sobre heavy metal, o Metalvox, desceu o malho em seu perfil no Facebook no vocalista China Lee, que lidera o emblemático e histórico Salário Mínimo, ainda na ativa. Formado nos anos 80, o grupo fazia a linha politizada de denúncia de mazelas sociais e problemas econômicos, a começar pelo nome.

Post extraído do perfil de China Lee no Facebook

Entretanto, de forma surpreendente, passou a compartilhar nas redes sociais comentários no mínimo inapropriados, recheados de posições preconceituosas e outras que esbarram no racismo. A mais recente, e que motivou a ira de Jaime Folho, foi uma foto onde China Lee diz ficar triste ao dizer isso, "mas que o Brasil precisava mesmo ser dividido porque não dava mais para ficar sustentando vagabundo", em uma provável referência ao Bolsa Família, programa social do governo federal que é derivado do Bolsa Escola, criado na gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), nos anos 90.

Outro cantor foi alvo de petardos nas redes sociais por comentários depreciativos aos partidos de esquerda e ao PT, embora tenha sido mais comedido. Jack Santiago, ícone do metal brasileiro dos anos 80, quando encabeçou o Harppia, entre outras bandas, insistiu por todo o período eleitoral que o Brasil corria o risco de virar uma "Venezuela", seja lá o que ele quis dizer com isso ou de onde tirou evidências de tal coisa. Chegou inclusive a dizer que estava do lado de Lobão nas críticas, quase todas desprovidas de fundamento, que este fez ao governo federal e ao PT.

"Venezuelização", "cubanização", "transformação em república bolivariana"? Santiago é um dos caras mais bacanas e articulados da cena do metal e do rock brasileiro, o que deixou ainda mais perplexos amigos e admiradores por conta de suas mais recentes posições políticas: como foi possível que ele caísse na armadilha do discurso de ódio e quase segregacionista da extrema direita, baseado em argumentos tão pueris e despropositados?

Houve internauta que o comparou ao impagável Roger Moreira, aquele que minimizou as consequências da ditadura militar, em especial no episódio a respeito da morte do deputado Rubens Paiva, assassinado por torturadores militares em 1971 no Rio de Janeiro, e que rendeu uma polêmica desnecessária com o filho do deputado, o jornalista e escritor Marcelo Rubens Paiva.

Do outro lado do espectro, também houve exageros do mesmo naipe, com músicos menos conhecidos, mas com trânsito importante nos cenários paulista e carioca, endossando as alavras absurdas de um deputado eleito petista contra a "elite paulistana", justamente no momento em que a presidente reeleita fazia um discurso conciliados, pedindo união. "Vitória suada e heróica do povo brasileiro.Derrota dessa elite paulistana mesquinha que odeia os nordestinos, negros, gays, pobres, enfim o povo brasileiro", postou Carlos Zarattini, eleito deputado federal pelo PT. 

Satânico Dr. Mao e os Espiões Secretos: Mao é o de jaleco branco (FOTO: DIVULGAÇÃO)

Esquerdista convicto e envolvido com movimentos sociais desde os anos 80, José "Mao" Rodrigues Júnior, cantor do Satânico Dr. Mao e os Espiões Secretos e ex-líder do emblemático Garotos Podres, mostrou-se engajado e contundente nesta campanha eleitoral, mas evitou , na maior parte do tempo, os exageros típicos das brigas eleitorais. Só que, como em uma situação de extrema polarização e radicalismos, o articulado e politizado professor universitário Mao também deu as suas escorregadas.

"Derrotamos muito mais a direita retrógrada e autoritária. Derrotamos o narcotráfico, os 'paus mandados do imperialismo',  ou seja, derrotamos os Tucanazis!", respondeu a um amigo ontem no Facebook, ainda comemorando a vitória de Dilma. Inteligente, esperto e muito bem informado, Mao surpreende os interlocutores com análises precisas e cirúrgicas sobre política nacional e geopolítica internacional, além de opiniões geralmente ponderadas, mas espanta os mesmos interlocutores com conceitos fora de moda e, de certa forma, embolorados, como "imperialismo", "revolução socialista" e o inapropriado/inadequado "tucanazis". Não é de hoje que o músico e professor enxerga relações que considera preocupantes entre o PSDB paulista e o que chama de "forças fascistas e neofascistas", seja lá quem sejam.

Sobrou machadada para todo lado dentro do rock nacional e do metal brasileiro. Muitas das rusgas não passaram, na verdade, de exacerbação de rixas antigas entre os contendores. Na maioria dos casos, entretanto, o calor da disputa política levou a evidentes exageros. Ninguém ganhou esta parada.

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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