Metal que atropela a crise: Nervochaos, Zaltana, Vulcano, Unearthly, Eterna
Combate Rock
30/09/2014 06h54
Marcelo Moreira
Em momentos de crise a criatividade renasce e abre inúmeras possibilidades. É comum ver frases como essa, ou similares, em livros de auto-ajuda ou manuais de administração de empresas, quando não em livros de história da arte. Se é assim, então a crise do rock no Brasil do metal nacional.
Já faz muito tempo que o padrão das produções de muitos álbuns, assim como a qualidade das músicas, é de padrão internacional, ainda que para um público reduzido. Isso não é problema para o Nervochaos, por exemplo, um dos destaques do gênero no Brasil neste século XXI.
"The Art of Vengeance" é o melhor trabalho desta banda paulistana veterana da cena da música extrema. Lançado neste ano, empurrou o grupo ainda mais adiante, adicionando ainda mais violência e brutalidade ao seu death metal que pode ser considerado "old school", mas com sonoridade moderna.
Mesmo brutal, o álbum traz uma diversificação muito interessante à música do Nervochaos, alternando momentos cadenciados com um peso gigantesco e muita velocidade, característica principal do som da banda.
"Devil's Work" traz uma variação interessante de timbres e uma riqueza sonora, assim como a ótima "Blood Ritual", muito bem trabalhada e com instrumental primoroso, enquanto que pauladas "Betrayed" "Ghost of the Past" partem para a violência pura. Com produção ótima do italiano Alex Azzali, é candidatíssimo a um dos melhores do ano.
Na mesma pegada surge o surpreendente Zaltana, também de São Paulo, com seu imponente álbum de estreia, auto-intitulado. A expectativa era grande, até porque o grupo demorou bastante para finalizar a obra e tem como nome mais chamativo o multiintrumentista Tito Falaschi (ex-Symbols), que é um renomado produtor musical.
Revezando-se na bateria e no baixo, o irmão mais novo de Edu Falaschi conseguiu reunir um time de qualidade para colocar no mercado um produto diferenciado. E boa parte desta diferenciação vem da vocalista Mischa Marmade, versátil ao extremo, passeando com facilidade irritante dos vocais melódicos para os extremos.
Com produção eficiente, mas sem firulas, o Zaltana atirou para muitos lados e praticamente acertou em todos. Quando parte para o prog metal, como em "Sovereign", soa moderno e instigante, com bons duelos de guitarra.
Quando pretende ser agressivo, com mais velocidade e uma pegada quase thrash, não deixa nada a dever para bandas importantes como Arch Enemy e The Agonist – na verdade, Mischa, neste caso, faz o Agonist comer poeira.
Derrapadas? Não, mas perde um pouco o vigor quando decide enveredar pelo metal melódico, que é justamente quando o Zaltana se aproxima muito do que normalmente é feito no Brasil e no exterior neste segmento – ou seja, deixa de ser novidade.
E é justamente por ser algo diferente do que estamos acostumados em 2014 é que o Zaltana chama a atenção. Não é uma banda original, mas tem bastante coragem em diversificar em busca de personalidade para se diferenciar. Uma estreia promissora, com destaque para boas músicas como "Always Left Behind" e "Hungry for Life".
De Santos temos o petardo "Wholly Wicked", da lenda Vulcano, mais pesado e extremo do que nunca. O grupo passou anos hibernando, mas voltou com tudo na segunda década do século. Lançou "The Man, The Key , The Beast" em 2013, elogiadíssimo (com toda a razão), fez turnê pela Europa e agora o novo álbum consegue superar o anterior.
Acostumados a serem tratados como sinônimos de thrash/death metal no Brasil, o conjunto entrega o promete de forma magistral: muito peso, muita velocidade e excelentes riffs de guitarra.
"Tormented", "Malevlent Mind", The Tenth Writing", "Blowing Death", "The Return of a Long Night"… escolha qualquer uma, é brutalidade despejada com muita competência e crueldade – não se poderia esperar na menos do Vulcano.
Na praia ainda mais extrema, eis que a banda carioca Unearthly vem para 2014 com muito mais fome. Integrante do primeiro time do black metal nacional, já tinha chamado bastante a atenção pela alta qualidade do trabalho anterior, "Flagellum Dei", de 2012, e agora, com "The Unearthly", o grupo vai além.
Literalmente, o som é infernal, que faz tremer qualquer ambiente, mas agora temos mais atenção para alguns arranjos, alguns com inspiração em temas regionais, como na emblemática "Eshu", a primeira música da banda Canadá em português.
Talvez seja exagero dizer que o Unearthly tenha agregado novas sonoridades, mas é certo que ousou bastante dentro de um subgênero que não costuma olhar com bons olhos algumas "invenções" ou "modernidades". Entretanto, a maldade e a violência, dentro do contexto, estão intactas.
O grupo ignorou quaisquer dogmas e fez um trabalho muito bom, esbanjando categoria no peso extremo e na velocidade insana, que casou bem com os novos arranjos. Escute ""The Fire of Creation" e "The Sin Offering" e tente não ficar atordoado.
No outro extremo, quem também ressurge com um trabalho de boa qualidade é a banda Eterna, que já foi um dos pilares do white metal nacional. "Spiritus Dei" traz letras em português e um instrumental interessante, variado do hard rock ao metal progressivo com bastante competência.
O destaque é a excelente performance do vocalista Neno Fernandes, que consegue transitar entre os estilos com facilidade, em especial na música "Forte Brado". Releve as mensagens de fé explícitas e a catequese caso não seja religioso ou não se importe com isso: é um trabalho muito bem feito, que merece ser conferido.
Por fim, merece menção dois trabalhos de boa qualidade de duas bandas promissoras. "Unstoppable", o mais recente EP da banda paulista Threat. Muito pesado e violento, o quinteto adiciona agressividade em "Victory" e "Proud", e mostra qualidade técnica e versatilidade na melódica "Rest in Pain".
"Powered Heart", do conjunto Rexor, conseguiu dar um pouco de vida a um subgênero desgastado e quase que fossilizado, o heavy metal tradicional. Não busque originalidade, mas preste a atenção na energia e no entusiasmo. Com boa dosagem no peso e nas passagens melódicas, deve agradar aos mais "conservadores", como na música "Evil Knights", com seus ecos de Grave Digger e Running Wild.
Sobre os Autores
Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.
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O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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