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Ressentimento e mágoas dominam o livro de Rex Brown, do Pantera

Combate Rock

16/09/2014 06h54

Marcelo Moreira

Quanto maior o ressentimento, melhor e mais saborosa é a história contada. O ditado sensacionalista costuma proceder em grande parte das obras literárias polêmicas, mas não foi tão eficiente no livro "A Verdade Oficial – Nos Bastidores do Pantera" (Edições Ideal, R$ 39,90), escrito por Rex Brown, em parceria com o jornalista inglês Mark Eglinton.

Brown foi o baixista do Pantera, fantástica banda de heavy metal dos anos 80 e 90, por quase toda a existência do grupo. O mais quieto e o mediador entre os enormes egos e conflitos que dominavam os bastidores do quarteto, decidiu vomitar tudo o que podia no livro, descarregando 25 anos mágoas e ressentimentos represados. Até mesmo exagerando na sinceridade, o ex-baixista apostou na crueza e na pancadaria, não poupando os ex-companheiros, apesar de repetir a cada três página que Phil Anselmo (vocal) e os irmãos "Dimebag" Darrel (guitarra) e Vinnie Paul Abbott (bateria) são seus "irmãos".

E a sinceridade de Brown parece ser o grande problema do livro, que tem o título absurdo de "verdade oficial". O músico carrega tanto no ressentimento e na ânsia de contar a sua "verdade" que atropela os fatos, deixando uma quantidade grande de pontas soltas, prejudicando o entendimento.

Em alguns momentos a "putice" de Brown com os companheiros e managers é tão grande que se tona mais importante do que o fato em si – não há uma explicação sobre os motivos que desaguaram em tantos problemas gerenciais, de relacionamentos e drogas e álcool.

Ele até tenta criar um suspense em relação à escalada de tensão entre os quatro membros do grupo até o rompimento inevitável, mas há falta de informações básicas que leve o leitor a entender o porquê dos desentendimentos – um problema que também afetou a autobiografia de Max Cavalera (ex-Sepultura).

Essas lacunas provavelmente vão deixar os mais exigentes um pouco decepcionados, mas o livro funciona como uma boa biografia do Pantera, e nem tão boa assim autobiografia de Rex Brown, que não decidiu no livro se queria ser o discreto baixista que sempre foi ou o rock star que sempre teve vontade, ao narrar seus encontros e amizades com grandes nomes da música.

O livro é preciso em datas e situações sobre os eventos cruciais da história do Pantera, que foi a principal banda de metal do mundo nos anos 90, enquanto o Metallica optava por um direcionamento cada vez mais pop.

Arguto e ferino em seus comentários, Brown analisou com honestidade e frieza os maiores trabalhos da banda e surpreende pelo pé no chão com que narra circunstâncias profissionais e o seu cotidiano dentro e fora da banda, esforçando-se para demonstrar que foi o menos afetado pela fama e pelo dinheiro em toneladas que caiu em sua conta. No entanto, não escondeu os graves problemas causados pelo alcoolismo e pela falta de direcionamento profissional em alguns momentos.

Mesmo com os excessos e as lacunas, "A Verdade Oficial – Nos Bastidores do Pantera" é um livro bem interessante, talvez um dos mais interessantes sobre rock dos últimos três ou quatro anos pela crueza da narrativa e pela falta de censura em todas as "detonações" – sobrou até para Jerry Abbott, pai dos irmãos Darrell e Vinnie Paul,  produtor musical e dono de estúdio que sempre militou na música country, mas que apoiou decisivamente o Pantera em seus primeiros seis anos de carreira, quando a banda ainda era apenas mais uma no cenário.

Ainda que apele para as famosas diferenças musicais e a fama/dinheiro repentinos que alteraram posturas e comportamentos, para justificar as constantes brigas entre os membros, Brown não economiza no verbo para contar que nunca se deu bem, de fato, com Vinnie Paul, por causa de suas manias e de seu comportamento infantilizado.

Reclama do arredio Phil Anselmo, que nunca fez questão da companhia dos outros músicos e que, ao mesmo tempo em que se drogava demais e se comportava como rock star, fazia questão de se manter recluso e reservado em Nova Orleans, sua cidade natal – o autor insinua que a reclusão do vocalista, em última análise, acabou com a banda por volta de 2003, já que sumia e se recusava a atender aos telefonemas dos companheiros, ainda que gostasse de Brown.

Sobre Dimebag Darrell, as palavras mais amistosas, revelando ser o integrante com quem melhor se dava, inclusive musicalmente – eram os dois principais compositores. Nem por isso alivia o amigo, revelando o pouco interesse do guitarrista pela banda além de música em si e pelo comportamento extremamente exagerado nas brincadeiras e sacanagens durante a turnê, sempre movido a hectolitros de álcool. Poucas biografias contém detalhes tão completos – e irritantes – a respeito das brigas, restrições e disputas internas em um grupo musical.

Como nem tudo é ressentimento, merece destaque também a comovente descrição da morte de Dimebag, assassinado no palco de uma espelunca no interior os Estados Unidos por um fã alucinado em 2004, já fora do Pantera e integrando o Damageplan.

Brown mostra do tamanho do impacto que o fato teve em sua vida e como foi difícil lidar com o velório e o enterro, assim como as difíceis negociações com Vinnie Paul e a viúva, Rita Haney, sobre a permissão para que Anselmo estivesse presente – o que não ocorreu, devido às "ameaças"  de morte feitas por Rita. Enfim, é um livro sobre rock diferente do que estamos acostumados.

 

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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