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'The Unforgettable Fire', a salvação do U2, faz 30 anos

Combate Rock

09/01/2014 06h56

Marcelo Moreira

Uma exposição de obras de arte e de fotografia salvou a carreira do U2 em 1983. Por conta disso, no ano seguinte, o quarteto virou um grupo de rock de verdade, entrando para o primeiro time dos artistas da década de 80 e mostrando qualidade que muita gente dizia não existir nos então moleques irlandeses que adoravam punk rock e que se achavam politizados, com inspiração nitidamente religiosa.

"The Unforgettable Fire", o quinto álbum da banda – o quarto de estúdio – foi o passo mais arriscado e perigoso que o U2. Refinando a sonoridade com os produtores Brian Eno e Daniel Lanois, o som do grupo ficou mais encorpado, mais bem definido, com a guitarra de The Edge finalmente assumindo o comando de forma inequívoca, definindo o timbre de guitarra característico do músico – coisa dificílima na música, é possível identificar The Edge nos primeiros acordes.

Lançado em 1984, "The Unforgettable Fire" fez com que o U2 fosse a levado a sério em um momento de transição da música pop, onde a Inglaterra voltava a dominar, seja no som mais comercial, seja no heavy metal. Sabiamente, a banda se manteve afastada da chamada new wave, que abusava do comercialismo e das lantejoulas, ao mesmo tempo que afirmava ter herdado o legado do punk. O synth pop estourava nas rádios, com Depeche Mode, Duran Duran, Eurythmics, enquanto que os verdadeiros pós-punks tentavam se sobressair no som de The Cure, Siouxsie and the Banshees e até mesmo The Cult. A chamada new bossa também avançava, com Matt Bianco, Style Council e um hesitante Cocteau Twins, que logo partiria para outra praia.

Diante de concorrência tão pesada, só mesmo a criatividade e a a ousadia para escapar do inconformismo juvenil de inspiração religiosa, onde se sobressaíam os conceitos políticos pueris recheados de raiva quase punk. Os três primeiros álbuns do grupo moldaram o perfil e a linha temática a ser perseguida, mas "The Unforgettable Fire" deixou para trás o rock básico e pouco versátil – ainda que "War" contenha clássicos de todos os tempos, como "Sunday Bloody Sunday", "New Year's Day", "Second" e "Two Hearts Beat As One". As letras melhoraram bastante, adquirindo certa maturidade e valorizando as palavras mais fortes. A guitarra climática dá o tom nas principais músicas, como "Pride", "Bad", "A Sort of Homecoming", "Elvis Presley and America", "MLK" e na melhor de todas, a faixa-título.

A maioria dos críticos musicais define que a grande virada da carreira da banda, a mais ousada e mais impactante foi a guinada para o pop dançante de "Achtung Baby", de 1991, após a hibernação imediatamente após "The Rattle and Hum". Por causa da mudança radical de som, é tentador admitir tal ponto de vista, apesar do evidente comodismo. Depois de "The Joshua Tree" (1987), o U2 se tornou gigante, provavelmente a principal banda de rock daquela época, rivalizando em quantidade de ingressos vendidos com Rolling Stones, Paul McCartney, Madonna, Kiss, Van Halen, Iron Maiden e outros gigantes. Qualquer mudança de direção, por mais radical que fosse, tinha o lastro de uma carreira de mais de dez anos, sendo pelo menos cinco de vendas espetaculares. Era bem mais fácil.

Quando o quarteto decidiu por "The Unforgettable Fire", em 1983/1984, o passo foi ousado demais – e muitíssimo arriscado. O sucesso moderado obtido até então não serviu de âncora conservadora para travar a evolução sonora tão necessária para uma banda energética, mas básica e sem grandes virtuosismos. "Pride – In The Name of  Love" foi a magistral apresentação do novo U2, ainda politizado e feroz, mas adquirindo uma originalidade com qualidade que o levou ao topo das paradas.

Bono Vox mudou inegavelmente de patamar, fato evidente na apresentação empolgante do Live Aid, em Londres, em 1985. Uma banda melhor, mais coesa e mais versátil emergiu de "The Unforgettable Fire", para o bem e para o mal. O U2 se tornou gigante e uma das grandes forças do pop rock de todos os tempos, mas ao mesmo tempo esse gigantismo acentuou características até hoje criticadas, como o messianismo e a auto-indulgência, assim como os excessos do ativismo político do vocalista. Seja como for, o álbum de 1984 fez o U2 sobreviver e mudar de patamar. É um dos álbuns mais emblemáticos dos anos 1980.

 

 

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Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

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