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Com Bolsonaro ou militares, o pessimismo será a tônica para a cultura

Combate Rock

07/04/2020 06h30

Marcelo Moreira

O cartaz deveria ilustrar a passagem da banda Dead Kennedys pelo Brasil em 2019. Diante da repercussão do cartaz, de autoria de Cristiano Suarez, a banda punk norte-americana, de forma nojenta, desistiu do show, reclamando que não queriam politizar a situação – logo ela, uma das bandas mais politicas, contundentes e incisivas da história

As especulações dominaram a tarde de segunda-feira (6) a respeito da eventual demissão do ministro da Saúde, Luiz Mandetta, em plena guerra contra o coronavírus. Havia forte vento soprando na direção da saída, mas que teria sido revertida à noitinha: militares que têm cargos e trabalham no Palácio do Planalto convenceram o incompetente presidente da República a não tirá-lo do cargo, ao menos por enquanto.

Sem apoio no próprio Planalto – e menos ainda no Congresso -, Jair Bolsonaro tornou-se refém de auxiliares próximos, mas de uniforme e com ascendência, da opinião pública, que aprova o trabalho de Mandetta, e de um Congresso hostil, que não tolera mais seus ataques às instituições, sua falta de capacidade, de inteligência e de educação.

Estabanado e abandonado, espezinhado por boatos fortes de que teria sido forçado a aceitar o ministro da Casa Civil, general Braga Neto, como o presidente de fato, ou "operacional", Bolsonaro parece decidido a forçar a barra e subverter toda a lógica da bem sucedida campanha contra a pandemia. Operacional ou não, o fato é que Bolsonaro é cada vez menos presidente, ou seja, manda cada vez menos, se é que ainda manda.

Na hipótese de ter perdido as condições de governo e ter de aceitar um general como "presidente em exercício", ou até mesmo de perder rapidamente o cargo para o vice-presidente, general Hamilton Mourão, o que muda para a política cultural do país?

No curto prazo, nada – ainda é cedo para dizer se é bom ou ruim. A melhor notícia que poderia ocorrer na Secretaria de Cultura do Ministério do Turismo é o silêncio sepulcral que domina a repartição.

O mutismo de Regina Duarte, a secretária, e de qualquer funcionário da pasta é um bom sinal. Significa que há uma tentativa, ao menos, de ela tomar as rédeas e impor algum tipo de austeridade e de racionalidade após uma sucessão de patetas que paralisaram as políticas culturais do país.

Mas há um lado ruim também neste curto prazo: com a "oportuna" luta contra o coronavírus, tudo parou no setor, o que enseja uma revisão completa da orientação do governo para área de cultura.

Além disso, o setor está completamente no escuro porque a nova secretária mantém em segredo o que pretende e quais as orientações que recebeu de um presidente da República abilolado e nulo, cada vez mais fraco e destituído de autoridade.

Em um cenário mais extremo, com a predominância de militares suplantando o presidente nulo – ou mesmo sob as ordens de um vice militar que assuma plenamente o comando -, o que se espera é, em um primeiro momento, uma gestão mais técnica, até porque não será prioridade de um governo envolto em grave crise institucional.

Aqui também há dois cenários diante de incertezas. No primeiro, predominará um certo alívio pelo segmento não estar sob os olhares da prioridade. Será possível preservar certa liberdade de ação e gestão para retomar projetos culturais tradicionais e desde sempre sem o ranço ideológico lesivo e burro que vinha predominando.

No segundo, vem a preocupação: no escruto e no silêncio, uma presidência militarizada pode, sem alarde, ampliar a ideologização e o aparelhamento conservador da área cultural, travando projetos importantes e asfixiando financeiramente áreas que dependem decisivamente de dinheiro público.

Há também o perigo de mudanças drásticas e lesivas na publicação de editais federais e de autarquias, o que pode contaminar também os necessários e fundamentais editais culturais de cidades e governos estaduais.

Muita gente está afirmando por aí que pior do que esteve e do que está não dá para ficar. É um pensamento perigoso. Sempre é possível piorar, ainda mais se estivermos sob um governo militar para valer sob inspiração do Exército, uma arma historicamente hostil às liberdades civis e de expressão.

A cultura sempre esteve na mira dos militares, muitos deles inconformados com iniciativas de "revisionismo", digamos assim, na questão de investigações históricas e jornalísticas a respeito dos abjetos crimes cometidos durante a ditadura militar nojenta que empesteou este país.

Democracia sempre esteve a milhões de anos-luz de distância de qualquer cartilha de atuação das Forças Armadas dentro do escopo civil.

Democracia, pluralidade e liberdade são conceitos abstratos demais para as estreitas mentes uniformizadas e desacostumadas ao debate e à troca de ideias.

Portanto, o simples fato não temos mais situações estapafúrdias e ridículas na Secretaria de Cultura não é salvaguarda para uma suposta normalidade, seja sob as ordens do lunático presidente, seja sob a tutela de militares ultraconservadores e antidemocráticos. As perspectivas são as piores possíveis, infelizmente.

Sobre os Autores

Marcelo Moreira, jornalista, com mais de 25 anos de profissão, acredita que a salvação do Rock está no Metal Melódico e no Rock Progressivo. Maurício Gaia, jornalista e especialista em mídias digitais, crê que o rock morreu na década de 60 e hoje é um cadáver insepulto e fétido. Gosta de baião-de-dois.

Sobre o Blog

O Combate Rock é um espaço destinado a pancadarias diversas, com muita informação, opinião e prestação de serviços na área musical, sempre privilegiando um bom confronto, como o nome sugere. Comandado por Marcelo Moreira e Mauricio Gaia, os assuntos preferencialmente vão girar em torno do lema “vamos falar das bandas que nós gostamos e detonar as bandas que vocês gostam..” Sejam bem-vindos ao nosso ringue musical.
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